SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ao menos 1.265 professores temporários que atuavam nas escolas municipais de São Paulo tiveram seus contratos encerrados nas últimas semanas pela gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB), após uma decisão do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) barrar a prorrogação durante o período eleitoral.
Contratados no fim de setembro e no início de outubro de 2023 pelo prazo de um ano pela prefeitura, os professores não puderam ter a contratação renovada em razão do período eleitoral e já estão sendo dispensados do trabalho nas escolas.
Em nota, a gestão municipal disse que a prorrogação dos contratos foi planejada e solicitada à Justiça Eleitoral, que negou o pedido. A prefeitura informou ainda que recorreu da decisão.
A prefeitura solicitou ao TRE autorização para a contratação e prorrogação emergencial dos contratos temporários de professores. O pedido foi feito no início de setembro, cerca de dois meses após o início do período em que a lei eleitoral proíbe contratações, com exceção de serviços públicos essenciais inadiáveis
A gestão municipal argumentou que a contratação era necessária para “evitar o risco de interrupção dos serviços educacionais”.
No entanto, em 7 de setembro, o juiz Rodrigo Marzola Colombini julgou improcedente o pedido da gestão Nunes. O magistrado alegou que seria “incabível” a autorização da contratação às vésperas das eleições municipais, sob o risco de quebra da isonomia entre os candidatos.
A decisão liminar (provisória) foi proferida um mês antes do primeiro turno das eleições, que ocorreu em 6 de outubro.
Após pedir um parecer do MPE (Ministério Público Eleitoral) sobre a questão, o juiz decidiu que “não se verifica a essencialidade, tampouco a excepcionalidade” prevista em lei para justificar a autorização de contratação dentro do período eleitoral.
“É certo que a Administração Pública Municipal deveria ter feito a previsão de contratação temporária e de prorrogação levando em conta o período de proibição imposto pela Lei nº 9.504/97. [A ação inicial] aponta a possibilidade de vacância de 1.265 servidores até o fim do ano, o que já poderia ter sido previsto e planejado pela administração”, diz o parecer da Promotoria.
O órgão também entendeu que a autorização para a renovação dos contratos poderia gerar “risco de quebra de isonomia entre os candidatos”.
“O atual prefeito, candidato à reeleição, poderia, em tese, auferir vantagem, agraciando os contratados e recebendo, em troca, sua ‘simpatia’ pela iniciativa”, diz o documento.
Claudia Heitzmann, 54, teve o contrato temporário encerrado no último dia 7 de outubro. Ela era professora regente de uma turma de pré-escola e trabalhava com crianças de 4 e 5 anos na Emei (escola municipal de educação infantil) Dona Leopoldina, no Alto da Lapa, zona oeste da capital.
“Não avisaram os professores nem as escolas com antecedência. Todos fomos pegos de surpresa e prejudicados. Nós, professores, ficamos sem emprego e salário. As escolas sem professores para dar aula e as crianças que ficam desamparadas”, diz.
A professora conta que, por não haver professor para substituí-la, a escola tem tido que reunir duas turmas em uma única sala para dar conta de atender a todos. “Quem ficou no meu lugar é uma professora assistente, mas ela também precisa trabalhar em outras salas. Então, a saída tem sido juntar turmas para que nenhuma fique sem professor.”
Claudia estava com essa turma desde o fim de julho e conta que as crianças choraram ao saber que não teriam mais aulas com ela. “Eles são muito pequenos, a gente cria um vínculo muito forte com as crianças. É muita irresponsabilidade deixar algo assim acontecer.”
Professora de inglês, Lilian Salustiano, 41, também teve o contrato encerrado em 27 de setembro. Ela perdeu as 24 aulas que dava para 12 turmas em duas escolas municipais em Cidade Tiradentes, na zona leste.
“Vários alunos me mandam mensagem dizendo que se sentem abandonados, pedindo pra eu voltar”, conta.
As professoras também relatam a preocupação financeira, já que dificilmente vão conseguir emprego em outras escolas nesse período do ano. “Mandei currículo para várias escolas particulares, mas quem vai contratar professor faltando dois meses para acabar o ano letivo?”, questiona Claudia.
Em nota, a prefeitura, por meio da SME (Secretaria Municipal de Educação), disse que recorreu da decisão do TRE por entender se tratar de um serviço essencial que precisa “ser mantido em funcionamento em qualquer período para garantir a continuidade da aprendizagem dos estudantes”.
“A contratação de temporários ocorre conforme a confirmação de necessidade e, por essa razão, não foi realizada anteriormente. Caso contrário, haveria o risco de má aplicação dos recursos públicos”, justificou a secretaria.
Deputados do PSOL, partido do candidato Guilherme Boulos que concorre contra Nunes, protocolaram uma denúncia na Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social do Estado pedindo para que a gestão municipal seja investigada.
Eles pedem que seja apurado se houve omissão e negligência da prefeitura e da pasta.
ISABELA PALHARES / Folhapress