Conheça Cavala, a dona de bordel lésbica que se tornou a vereadora mais votada de Dourados (MS)

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Conhecida como Cavala, Isa Marcondes tem 46 anos e é dona do bordel mais famoso de Dourados, no Mato Grosso do Sul. Com o slogan: “A cidade está uma zona e de zona eu entendo”, foi eleita vereadora com 2.992 votos, maior número dentre todos os candidatos.

Isa é do partido Republicanos e foi também a única mulher entre os dez mais votados da cidade, que tem 240 mil habitantes e 21 cadeiras na Câmara Municipal.

Mãe, avó, empresária, conservadora e “sapatão raiz” -é assim que ela se define. Em entrevista à reportagem, Isa diz que vem sofrendo até ameaças de morte, mas que não tem medo de “peitar os homens”. “Minha zona é mais organizada do que essa cidade”, diz.

PERGUNTA – Qual a sua profissão?

ISA MARCONDES – Sou dona de zona, dona de boate. Sou conhecida aqui na cidade como Cavala.

P – Mas é uma casa de prostituição?

IM – É uma casa de meninas. Só trabalho com mulher bonita. Elas fazem o corre delas. Eu tenho uma boate, vendo bebidas, mas o esquema é delas, o dinheiro é delas, elas fazem [os programas] por fora. Não é crime, sempre trabalhei com tudo certinho, nunca tive problema com justiça. Sou honesta, nunca mexi com coisa errada dentro da minha boate. Se tivesse coisa errada, eu já tava presa, o que eles mais querem é ter algo contra mim.

P – Quem quer ter algo contra você? Você tem inimigos na cidade?

IM – Eles estão doidos porque a dona da zona ganhou. Mas quero provar para a sociedade que dentro da noite existem pessoas honestas. Tem gente aqui que é da igreja, que sobe no púlpito, mas é vagabundo e ladrão. Engana os fiéis, mente para a mulher, rouba dinheiro do povo, mas dentro da zona eles bebem e contam as maracutaias deles. Minha vida está em risco porque eu enfrentei esse sistema.

P – Está sofrendo ameaça de morte?

IM – Estou. Mas eu não tenho medo desses homens. Sou da noite, sou sapatão raiz. Ando sem colete à prova de balas. Se chegar minha hora, vai ser Deus. Sou dona de boate, tenho a faculdade da vida, a faculdade da noite. Entrei para a política porque cansei de ver tanta canalhice nessa cidade. Eu peito esses homens.

P – Já sofreu homofobia?

IM – Eu não sofro com essas coisas porque eu atendo esses caras. Conheço bem o que eles fazem na noite. Mas sofri muito quando era nova. Minha mãe era muito rígida, ela via que eu era lésbica, mas queria que eu casasse. Então eu namorei, noivei, casei e engravidei. Eu não era feliz, mas hoje não me arrependo, porque tenho minha família.

P – Você gosta de ser avó? Como é a relação com seu neto?

IM – Meu neto é tudo para mim, ele mudou minha vida. Eu era muito ‘vidaloka’. Parei de beber, parei de farrear. Hoje o pai do meu filho é meu melhor amigo, ainda somos casados no papel. A gente viaja junto, com neto, com filho, se ele tiver namorada, ela vai, se eu tiver minha gata, eu levo. Sou mulher, gosto de mulher, mas em nenhum momento usei a pauta GLS [sic] para pedir voto. Minhas conquistas de voto foram pela garra, amor e carinho que tenho pelo povo.

P – Quais são suas bandeiras ideológicas? Você é de direita?

IM – Entrei no Republicanos porque me identifiquei com o partido e me aceitaram muito bem. Mas hoje larguei mão desse negócio de direita e esquerda. Eu sou do povo. Já fui de direita radical, mas quando fui para São Paulo, caiu minha ficha. Vi os bastidores da política e peguei nojo.

P – O que você viu?

IM – Vi as pessoas da direita falarem da esquerda e fazerem igual. Só falam bonito, mas a corrupção é a mesma.

P – Você viu corrupção? Denunciou?

IM – No meu ver, cargo comissionado é corrupção, por exemplo. Sou contra cargo comissionado. É isso que estraga nosso país. Tinha que ter processo seletivo. Ganhei essa eleição com sete pessoas e dez cabos eleitorais que a coligação cedeu para mim. Só recebi R$ 5 mil do fundo eleitoral. Teve gente que investiu R$ 1 milhão e não teve nem 500 votos. Por isso estão doidos comigo. Fui a mais votada porque fiz um trabalho de fiscalização. Entrei em UPA, liguei para empreiteira, desmascarei maracutaia. Nenhum voto meu foi comprado, não dei gasolina, não dei cesta básica. Foi na raça.

P – Tem alguma religião?

IM – Eu sou católica, mas não frequento igreja. Tenho Deus no meu coração. Respeito todas as crenças, respeito todo mundo. Pode ser macumbeiro, pode ser o que quiser. Não tenho preconceito com ninguém. Pode casar mulher com mulher, homem com homem. Cada um que siga seu caminho. Defendo todas as famílias.

P – Mas os seus clientes são casados e traem as mulheres?

IM – Ir na zona não é traição. Pagou, tchau e benção. Ninguém quer saber de homem chorando aqui, não. Traição é ter amante na rua.

P – O que pretende fazer no seu mandato?

IM – Eu vou por o pau pra torar. Vou pedir uma CPI para investigar a obra superfaturada da Câmara daqui, gastaram quase R$ 20 milhões numa reforma. Você já viu uma Câmara Municipal dentro de shopping? Pagando R$ 60 mil de aluguel? Estão roubando na nossa cara. Eles humilham o povo. Sei que não tenho poder para acabar com a corrupção da noite para o dia, mas vou pedir auditoria, vou meter CPI nesse povo.

P – É um município com muitas fazendas.

IM – Sim, aqui é do agro. Aqui é rico, tem gado, tem soja. Mas nada disso é investido na cidade. Dourados é a segunda maior cidade do estado [atrás apenas da capital, Campo Grande] e não tem nem aeroporto. É uma vergonha. Não tem creche, as crianças ficaram três anos sem escola na rede municipal. Por isso que eu usei a frase como slogan: ‘Dourados tá uma zona e de zona eu entendo’. Minha zona é mais organizada que essa cidade.

ANAHI MARTINHO / Folhapress

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