BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) afirmou que vai intimar a Enel, distribuidora de energia que atua na cidade de São Paulo, em um processo que pode resultar na caducidade do contrato de concessão da empresa na capital paulista.
A intimação ainda depende de um relatório de falhas e transgressões que está sendo finalizado pela área de fiscalização da agência. Mesmo assim, a Aneel já concluiu pela necessidade da medida.
A iniciativa vem após um apagão deixar 3,1 milhões de clientes da Enel sem energia na Grande São Paulo após temporal no último dia 11. Residências chegaram a ficar seis dias sem luz.
De acordo com a Aneel, a intimação inicia “um processo de avaliação de uma eventual recomendação de caducidade a ser apreciado pela diretoria da Aneel e, em última instância, pelo Ministério de Minas e Energia”.
A Enel foi procurada no início da tarde desta sexta (18) e não se manifestou até a publicação deste texto.
A decisão é anunciada após dias de declarações do Ministério de Minas e Energia colocando a culpa na Aneel por suposta omissão em relação ao tema.
O ministro Alexandre Silveira (Minas e Energia) afirmou nesta semana que pediu em abril à agência a abertura do processo administrativo que poderia, no limite, resultar na caducidade. “A Aneel precisa abrir o processo. Infelizmente”, afirmou Silveira. “A Aneel se omitiu com relação à abertura desse processo”.
Segundo interlocutores, Sandoval de Araujo Feitosa Neto, diretor-geral da Aneel, teria dito ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) e ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) que é o caminho natural a intervenção acontecer e que poderia ser na próxima semana. A conversa teria acontecido de forma privada no Palácio dos Bandeirantes, na quinta-feira (17).
Oficialmente, a Aneel negou veementemente ter feito qualquer promessa de intervenção. “A Agência esclarece que em nenhum momento houve essa afirmação pelo diretor-geral da autarquia. Foi explicado as possíveis penalidades administrativas, multa, obrigação de fazer, intervenção administrativa e intimação com fins de recomendação de caducidade ao MME.”
A intervenção vem sendo defendida pelo governador de São Paulo e por prefeitos da Grande São Paulo. Mas, segundo o ministro, mesmo essa ação demandaria a abertura do processo da agência.
A lei sobre concessão e permissão em serviços públicos diz que o poder público poderá intervir na execução para assegurar o cumprimento das normas. Declarada a intervenção, será instaurado um procedimento administrativo com duração de até seis meses para apurar as responsabilidades, com direito de ampla defesa, e em até seis meses a administração do serviço será devolvida à concessionária caso não seja extinta a concessão.
A caducidade mencionada no caso da Enel, que seria uma medida mais extrema, é uma forma de extinção do contrato que pode ser declarada quando o serviço estiver sendo prestado de forma inadequada. Mas o ato deve ser precedido de um processo administrativo para verificar a inadimplência da empresa, assegurado o direito de ampla defesa.
Felipe Fonte, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) Direito Rio, diz que o poder público tem duas opções caso conclua pela caducidade do contrato: assumir a execução do serviço diretamente ou contratar uma empresa de maneira emergencial. Nos dois casos, em geral se licita a concessão novamente.
Ele diz, no entanto, que esse tipo de procedimento é arriscado. “Esses processos tendem a ser traumáticos. O poder público tenta evitar porque aquele prestador já tem o conhecimento sobre o serviço. Mudar gera dificuldades para quem vai assumir”, afirma.
Por isso, ele vê por trás de declarações do tipo uma tentativa de elevar a pressão do poder público sobre a empresa. “É uma ameaça, porque ameaçar com a caducidade é ameaçar as garantias dos investidores daquele projeto ou daquela empresa. Então agora eles vão receber pressão também de bancos, debenturistas, agências de fomento. É uma forma muito eficaz de gerar uma resposta”, diz.
A Aneel, acusada de demora nas ações, tem dito que “vem sistematicamente realizando fiscalização na prestação do serviço”. Já foram aplicadas pela agência multas de R$ 320 milhões à empresa, mas ao menos 80% do valor está suspenso pela Justiça.
Além disso, a Aneel afirmou que fez reunião nos últimos dias com autoridades de São Paulo para estabelecer um processo de prontidão diante do novo aviso climático adverso para este fim de semana.
FÁBIO PUPO / Folhapress