A Voepass decidiu demitir o diretor jurídico da empresa, Eduardo Busch, ex-CEO da companhia e braço direito do presidente José Luiz Felício Filho.
É a quarta demissão da cúpula da Voepass em menos de um mês –todas após a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) intensificar a fiscalização sobre a empresa após a queda de um de seus aviões em Vinhedo (SP), o que causou a morte de 62 pessoas.
O afastamento de Busch é o mais impactante na Voepass, segundo pessoas ligadas à companhia afirmaram à Folha. Advogado, ele atuou como CEO da empresa pelos últimos sete anos até ser rebaixado para chefe da área jurídica em setembro.
“A Voepass confirma a saída de Eduardo Busch, que atuava como CLO (Chief Legal Officer) na companhia”, disse a empresa em nota à Folha.
A companhia aérea passa por uma reformulação desde que suas operações viraram alvo de escrutínio da Anac por causa do acidente do avião no interior de São Paulo.
Filho do fundador da Voepass e atual presidente, José Luiz Felício Filho decidiu reassumir a liderança executiva da empresa e reajustar procedimentos operacionais e de manutenção em meio à crise pós-acidente.
A reformulação fez três diretores caírem dos cargos em 25 de setembro. Foram afastados Eric Cônsoli (diretor de manutenção), Marcel Moura (operações) e David Faria (segurança operacional).
Desde 16 de agosto, uma semana após o acidente, a Anac faz uma operação assistida com a companhia aérea para “manter a prestação do serviço da Voepass em condições adequadas”.
Na prática, a empresa tem sido obrigada a enviar, em tempo real, todos os dados de operação das suas duas dezenas de aeronaves para a agência reguladora. A Anac ainda tem feito inspeções no setor de manutenção da Voepass.
Segundo relatos feitos à reportagem, a vigilância da agência tem obrigado a empresa a rever procedimentos para melhorar a operação.
Em documentos internos obtidos pela Folha, a Gerência Técnica de Vigilância de Aeronavegabilidade da Anac destaca que as inspeções dos últimos meses identificaram “dificuldades nos processos de manutenção da empresa”.
De acordo com a gerência, a demora na manutenção pode ser a razão para um aumento nos atrasos e cancelamentos de voos da companhia aérea depois do acidente de 9 de agosto.
Após o acidente, a Voepass deixou de operar em Fortaleza (CE), Confins (MG), Porto Seguro (BA), Salvador (BA), Natal (RN), Mossoró (RN), São José do Rio Preto (SP), Cascavel (PR) e Rio Verde (GO).
Em outro parecer interno, a Superintendência de Acompanhamento de Serviços Aéreos destacou que monitorava a prestação dos serviços da Voepass. “[A empresa] tem apresentado dificuldades com sua malha, apresentando, em diversas oportunidades, índices de atrasos e cancelamentos superiores à normalidade”, disse.
A Voepass não comentou as razões da demissão de Busch. O ex-CEO também foi procurado, mas não se manifestou.
O relatório preliminar de investigação do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), da Força Aérea Brasileira, mostrou que os sistemas da aeronave da Voepass emitiram alertas de possível formação de gelo nas asas diversas vezes durante o voo.
A caixa-preta que registra a voz da cabine registrou o piloto da aeronave dizendo que o sistema de degelo não funcionava da forma correta. A fala foi gravada logo no início do voo, no primeiro sinal de alerta de gelo.
O Cenipa tenta confirmar a informação com o cruzamento de outros dados da aeronave. As investigações da Aeronáutica demoram, em média, 16 meses.
O chefe do Centro de Investigação, brigadeiro Marcelo Moreno, afirmou que os dados analisados nos primeiros 30 dias de investigação revelam que a aeronave tinha registros de manutenção atualizados.
“Todos os registros de manutenção estavam atualizados, mas a qualidade nós ainda não sabemos”, disse.
Em nota após a divulgação do relatório preliminar, a Voepass afirmou que a investigação da FAB confirmou que a aeronave estava “com todos os sistemas requeridos em funcionamento”.
O parecer prévio, porém, não conclui que os sistemas estavam em funcionamento, e uma das suspeitas é possível defeito nos mecanismos de degelo.
“Cabe lembrar que a investigação de um acidente aéreo é um processo complexo, que envolve múltiplos fatores e requer tempo para ser conduzida de forma adequada. Somente o relatório final do Cenipa poderá apontar, de forma conclusiva, as causas do ocorrido”, diz a nota da empresa.
CÉZAR FEITOZA / Folhapress