Mercado prevê juros em dois dígitos no 1º ano de Galípolo à frente do BC

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo terá de lidar com juros de dois dígitos em seu primeiro ano no comando da instituição e terá pouco espaço para cortar a taxa básica (Selic) até o fim de 2025. Essa é a expectativa majoritária do mercado financeiro.

Nesta segunda-feira (21), o boletim Focus mostrou que a projeção mediana dos economistas para a taxa básica de juros ao término de 2024 se manteve estável em 11,75% ao ano. Para 2025, a estimativa dos agentes para a Selic subiu para 11,25%.

Nesse cálculo, segundo economistas ouvidos pela reportagem, pesam a desconfiança com a política fiscal do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a incerteza sobre a eleição presidencial dos Estados Unidos e a transição de comando do Banco Central, com a saída de Roberto Campos Neto da chefia e a chegada de três novos diretores.

Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do BC e presidente do conselho da Jive Investments, projeta que os juros voltem a cair a partir de meados do ano que vem e vê espaço para a Selic fechar 2025 em 10% ao ano.

O que pode ajudar a atuação do BC, segundo ele, é a expectativa de um impulso fiscal menor no próximo ano. Apesar de se mostrar mais otimista, aponta que o risco fiscal continua no radar dos economistas.

Para Figueiredo, um possível corte de R$ 50 bilhões em gastos, como estudado pelo governo, vai na direção correta, mas parece “pequeno demais”. “Para a gente alcançar a sustentabilidade [das contas públicas], nós precisamos fazer um ajuste na ordem de R$ 200 bilhões a R$ 250 bilhões ao longo do tempo. Não precisa ser em um ano só”, afirma.

O ex-diretor do BC ressalta ainda que a narrativa do presidente Lula, que cobra juros mais baixos em um momento de alta da Selic, é contraproducente e atrapalha a atuação da autoridade monetária na coordenação das expectativas. Segundo ele, o excesso de ruídos contribui para que a taxa básica seja tão elevada no Brasil.

“A gente precisa de um conjunto de políticas muito diferente do atual para conseguir chegar [com a Selic] a um dígito, não acho provável que isso venha a acontecer”, diz.

Para Roberto Padovani, economista-chefe do banco BV, três fatores devem contribuir para um processo lento de desinflação e, portanto, limitar o espaço disponível para cortes de juros em 2025.

São eles: o cenário global instável, associado a eventuais tensões internacionais a depender do resultado da eleição norte-americana; a trajetória ascendente da dívida pública brasileira; e o tempo natural para a construção de credibilidade do novo comando do BC.

Padovani avalia que, por enquanto, Galípolo apresentou um discurso coerente, mas que ainda não há certeza sobre como reagiria a uma eventual continuidade da política fiscal expansionista, com pressão sobre atividade econômica e câmbio, e, por consequência, com impacto na inflação.

“Se for mantida uma agenda de expansão fiscal, que foi a marca de 2023 e 2024, isso vai dificultar muito a vida do Banco Central. A questão é saber como o BC vai reagir”, diz o economista. “É como se o BC fosse testado e todos vão avaliar a resposta.”

No cenário do BV, depois de alcançar 12% em janeiro, a Selic permanece estável até julho, quando começa uma queda gradual, encerrando 2025 em 10,5% ao ano.

Para Silvio Campos Neto, economista-sênior da Tendências Consultoria, o grau de aperto nos juros estará atrelado ao esforço fiscal do governo até pelo menos 2026. “Quanto menor o esforço naturalmente maior terá que ser a conta paga do lado da política monetária”, diz.

Ele projeta que a Selic alcance 12% no início de 2025 e considera a possibilidade de a taxa chegar até 12,5%, devido aos riscos associados ao nível aquecido da atividade econômica.

O analista espera o início de um ciclo de cortes no segundo semestre, mas pontua que a expectativa não é de uma guinada da política monetária. Ele projeta Selic em 10,5% no fim de 2025, mas não descarta uma taxa maior.

Sobre a mudança de comando do BC, o economista afirma que a postura adotada por Galípolo desde que virou diretor e, principalmente, nos últimos meses, ajudou a minimizar boa parte das preocupações do mercado. No entanto, diz que ainda sobra uma ponta de incerteza relacionada a seu histórico mais heterodoxo e à relação próxima com Lula.

O Santander também projeta Selic em 10,5% no fim de 2025, depois de um pico de 12% no atual ciclo de elevação. O nível ainda aquecido da atividade econômica deve limitar a possibilidade de cortes mais agressivos, de acordo com o economista Tomás Urani.

Sobre as expectativas para a nova gestão do BC, Urani afirma que Galípolo tem sinalizado preocupação com a inflação corrente e a piora das expectativas. O economista acrescenta que o futuro presidente do BC também tem indicado estar comprometido com o centro da meta de inflação.

Já Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC e consultor da A.C. Pastore, considera que o BC sob Galípolo não será “particularmente duro” na busca da convergência da inflação para a meta e trabalhará com o intervalo de 4% a 4,5% (teto do alvo).

O objetivo a ser perseguido é de 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos.

Schwartsman prevê um aumento final de 0,25 ponto percentual na primeira reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) sob o comando do Galípolo, em janeiro, e projeta que o BC passará a cortar juros na segunda metade do ano, fechando 2025 com a Selic em 10,75% ao ano.

Para o ex-BC, Galípolo hoje se mostra “mais ortodoxo do que 90% dos economistas” que passaram pela autarquia, mas não deve sustentar esse perfil conservador após assumir a chefia.

Apesar de considerar o cenário desfavorável, o economista vê possibilidade de maior recuo da Selic em 2026, ano eleitoral. “[A Selic] vai voltar para um dígito porque a gente está trazendo a inflação de volta [para meta], sob controle, ou para tentar dar um gás para a economia para reeleger o presidente da República? Não sei responder, embora desconfie que seja a segunda [opção]”, diz.

MARIANNA GUALTER E NATHALIA GARCIA / Folhapress

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