Nunes e Boulos ignoram mudança tributária que afetará caixa de SP a partir de 2029

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O mandato iniciado em 1º de janeiro de 2025 antecederá um importante momento para o caixa da Prefeitura de São Paulo e sobre o qual as estimativas não são muito claras.

Em 2029, terá início a mudança na sistemática de cobrança dos impostos estaduais e municipais prevista pela reforma tributária. A alíquota do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) subirá gradualmente até 2033, quando o ICMS e o ISS deixarão de existir. A transição total levará 50 anos, e há quem defenda que São Paulo será uma cidade prejudicada pela mudança.

Os valores envolvidos são relevantes. A importância do ISS (Imposto sobre Serviços) sobre as receitas da capital paulista vem subindo anualmente. Desde 2020, ele responde por mais de 30% da receita corrente líquida e foi de R$ 29,3 bilhões em 2023. O município espera repetir a arrecadação em 2024.

A cota-parte do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) —25% do que os estados arrecadam são partilhados com os municípios— é a terceira receita tributária mais importante para São Paulo, atrás do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). Em 2023, a cidade recebeu R$ 10,5 bilhões.

Somados, ISS e ICMS respondem por quase metade da receita corrente líquida —47% do total no ano passado.

O IPTU, cuja receita vem crescendo, está desde 2020 na faixa dos 18%. Até 2016, essa arrecadação era proporcionalmente menor do que os repasses de ICMS na relação com a receita. No ano passado, o município de São Paulo arrecadou R$ 15,4 bilhões com o imposto dos imóveis.

“Embora a redução do ISS comece a acontecer só a partir de 2029, e os candidatos possam dizer ‘isso não é problema meu'”, diz o secretário Luis Felipe Arellano, da Fazenda municipal, “se a gestão não fizer um trabalho estratégico, vamos colher um período bastante difícil”.

A reforma tributária não aparece nos planos de governo de Ricardo Nunes (MDB), o atual prefeito que busca a reeleição, e de Guilherme Boulos (PSOL), seu concorrente no segundo turno da disputa do dia 27 de outubro.

A campanha de Nunes diz que ele vem trabalhando para se adaptar aos futuros impactos da substituição do ISS pelo IBS. O prefeito e candidato afirma que a lei 18.095, de março deste ano, que criou o programa de parcelamento de débitos, já trata também de reduções da alíquota do imposto municipal considerando a emenda da reforma tributária.

Boulos, que é deputado federal, diz ter participado ativamente da aprovação da reforma. Ele afirma também que eventuais incentivos nos impostos e taxas municipais existentes serão concedidos em alinhamento com o cronograma de implementação da reforma.

O candidato defende que à próxima gestão caberá organizar a transição e manter atuação estratégica para defender os interesses do município, para que São Paulo “seja protagonista” e não tenha qualquer prejuízo no decorrer da mudança.

Esse protagonismo é objeto de tensão política com outros municípios.

A regulamentação aprovada na Câmara (ainda falta o Senado) prevê que o conselho superior do comitê gestor do IBS tenha representantes de cada estado e do Distrito Federal e outros 27 para o conjunto dos municípios.

Esse último grupo será dividido entre 14 indicados por prefeitos de maneira uniforme (os votos de todos terão o mesmo peso) e outros 13 escolhidos em uma votação na qual as populações definirão os pesos das escolhas.

Para o pesquisador Gustavo Fernandes, do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da FGV (Fundação Getulio Vargas), a cidade de São Paulo deveria ter, no futuro comitê, um peso maior, equivalente à sua importância na economia.

Fernandes considera “impressionante que esse tema não tenha aparecido na eleição”, dados os possíveis efeitos sobre a arrecadação.

Paulo Ziulkoski, presidente da CNM (Confederação Nacional de Municípios), diz que a entidade não se insurge contra o protagonismo da cidade de São Paulo, “mas a Constituição trata igualmente os municípios”.

Uma das mudanças com maior potencial de impacto para a arrecadação paulistana é a tributação no destino.

O Ministério da Fazenda definiu na proposta de regulamentação que o domicílio do comprador será considerado para o recolhimento do imposto. Assim, deixará de ser considerada a origem ou onde foi produzido.

Apesar de a São Paulo ser um importante mercado consumidor, com 11,4 milhões de pessoas e um PIB per capita de R$ 68,8 mil, ela é principalmente exportadora de serviços, diz Arellano.

O cálculo da Fazenda municipal considera que a perda de arrecadação no intervalo total da transição, os 50 anos, pode chegar a 50% caso não haja crescimento de receitas no período.

Ziulkosk, da CNM, contesta a projeção e diz que eventuais perdas serão compensadas por um fundo.

O próximo prefeito, diz Arellano, terá de definir, por exemplo, se a cidade adotará a alíquota de referência que será definida pelo Senado. “A gente não sabe se o crescimento econômico prometido vai acontecer, mas o candidato, seja quem for, vai precisar de um plano para todos os cenários.”

Um dos argumentos a favor da reforma é que a mudança no sistema resultará em crescimento econômico e que isso suavizará o impacto da redistribuição na destinação desses impostos.

O efeito redistributivo é outro ponto dos defensores da reforma, de que ela reduzirá as desigualdades regionais e entre os municípios. Segundo dados levados pelo pesquisador Sérgio Wulff Gobetti ao grupo de trabalho da reforma na Câmara, São Paulo detém 25% do ISS de todo o país, 10% do PIB e 6% da população.

Gobetti assina com a economista Priscila Kaiser Monteiro um nota técnica do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) que buscou projetar se os estados e municípios mais ganham ou mais perdem (e quais são eles) com a redistribuição dos impostos.

A cidade de São Paulo não aparece em nenhuma das hipóteses. As simulações apontam que ao menos 82% dos municípios ganham com a reforma.

COMO SERÁ A TRANSIÇÃO DO ICMS E DO ISS PARA O IBS

Alíquota do IBS

– 10% em 2029

– 20% em 2030

– 30% em 2031

– 40% em 2032

– 100% em 2033

> Nos primeiros 20 anos, o valor real da receita será mantido

> As novas regras valerão sobre a receita que crescer acima da inflação

> A partir de 2034, parte da receita seguirá sendo distribuída no modelo atual

> A redução será progressiva, até a substituição total

> Quem perder receita terá compensação bancada por um fundo

FERNANDA BRIGATTI / Folhapress

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