Destaque tardio a Marta marca papel da vice na campanha de Boulos

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um destaque maior para a candidata a vice, Marta Suplicy (PT), na campanha de Guilherme Boulos (PSOL) à Prefeitura de São Paulo foi fruto da cobrança de dirigentes petistas, numa situação que, às vésperas do segundo turno, ainda causa ruídos na coalizão entre os partidos.

Ex-prefeita da capital paulista (2001-2004) prestigiada sobretudo em bairros periféricos por legados como os CEUs, o Bilhete Único e a construção de corredores de ônibus, Marta, 79, teve sua imagem pouco explorada no primeiro turno, na avaliação de lideranças do PT que participam da campanha.

Depois da pressão dessa ala da coligação, o espaço para a candidata a vice cresceu no segundo turno, sobretudo na propaganda eleitoral na TV e nas redes sociais. Segundo a ala psolista, a opção por uma participação mais discreta de Marta no primeiro turno foi uma decisão da própria ex-prefeita, para não ofuscar o protagonismo de Boulos.

Marta de fato considerava que, num primeiro momento, era necessário a Boulos se consolidar como candidato capaz de andar com as próprias pernas, e que ela seria uma auxiliar para emprestar experiência à dupla. O recolhimento ao papel de coadjuvante discreta, dizia, era um esforço para não ofuscar o cabeça de chapa.

Foi essa escolha, segundo seus partidários, que levou Marta a passar a campanha toda sem conceder entrevista à imprensa. A petista se ausentou de sabatinas com candidatos a vice e recusou dezenas de pedidos para conversar com jornalistas.

Mas, na avaliação de petistas, isso não significava reduzir a participação dela na propaganda e nas redes, o que foi considerado um erro estratégico. Ao fim do primeiro turno, em conversas com dirigentes do partido e com o marido e articulador político, o empresário Márcio Toledo, Marta se convenceu de que era mesmo necessária uma guinada que deixasse mais evidente sua função de fiadora de Boulos.

À alegação de que Marta estaria apagada na campanha, tanto petistas quanto psolistas ressaltam a relevância da ex-prefeita nos bastidores, desde a escolha do nome da coligação (Amor por São Paulo, que se estende à logomarca e a jingles), passando pela aproximação de Boulos com empresários e representantes do setor financeiro —promovida por ela e pelo marido por meio de jantares e encontros—, até o peso que a questão ambiental tem no programa da chapa.

A propósito, no caso de uma virada, com vitória da chapa hoje atrás nas pesquisas, a ex-prefeita poderia ocupar no governo uma função executiva relacionada ao meio ambiente e à questão climática.

Uma derrota, por outro lado, seria a quarta de Marta em uma eleição municipal paulistana —a ex-prefeita disputou e perdeu os pleitos de 2004, 2008 e 2016.

Nesse cenário, seus aliados apostam que, apesar dos 79 anos, ela vai querer seguir na vida pública —e deverá cobrar de Lula a fatura por ter topado entrar numa campanha arriscada. Por esse raciocínio, poderia pleitear um cargo no governo federal ou o compromisso de concorrer a algo relevante em 2026.

Não importa o desfecho, será uma nova etapa numa carreira política intensa —e algo atribulada nos últimos anos. Em 2018, Marta disse que não queria “mais ser candidata a nada”.

Ela fez a declaração em entrevista à Folha meses após anunciar que não tentaria a reeleição como senadora e se desfiliaria do MDB, partido para o qual migrou após encerrar um ciclo de 33 anos no PT, em 2015. A decisão era a de se aposentar de eleições e partidos, mas não da política —passaria a militar na sociedade civil.

Em 2023, afirmou que “nunca mais” concorreria a cargo eletivo. “Isso está fora [de cogitação]. Total. Não tem hipótese.” Era então secretária de Relações Internacionais da gestão Ricardo Nunes (MDB), onde foi parar após ter apoiado Bruno Covas (PSDB) em 2020.

(Numa declaração recente, ela disse que “fez bem de sair” da gestão Nunes por causa da aproximação com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Essa foi a justificativa oficial para o pedido de demissão da secretaria, em janeiro, quando já era pública a operação montada por Lula —e antecipada pela Folha de S.Paulo em novembro de 2023.)

Na última quarta (22), a candidata Marta passou o dia cumprindo agenda típica de campanha. Participou de carreata pela zona sul de São Paulo que fez como vice na chapa de Boulos, o candidato que perdeu para Covas há quatro anos e hoje enfrenta Nunes no segundo turno da eleição paulistana mais acirrada desde a redemocratização.

À noite, subiu em um palanque no Teatro Gazeta, na avenida Paulista, ovacionada sob um coro de “olê, olê, olá, Marta, Marta” pela mesma militância que até pouco tempo atrás a xingava de golpista por ter votado pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT).

Mesmo para uma política experimentada como ela, que abriu caminhos para outras mulheres na vida pública a partir do início dos anos 1990 e jamais passou despercebida por postos no Executivo e no Legislativo, as reviravoltas dos últimos tempos não são pouca coisa.

Considerada, segundo pesquisa Datafolha, a melhor governante da capital paulista nos últimos 40 anos, ela foi convidada por Lula a voltar ao PT, de onde saiu vociferando contra a corrupção, e trocar Nunes por Boulos para ser a vice do deputado federal. Disse sim ao presidente —e adeus à aposentadoria.

Seu legado, ainda lembrado por eleitores sobretudo das zonas leste e sul da capital, não se traduziu em votos para Boulos. Em 2004, mesmo derrotada por Serra, Marta teve 73,9% dos votos em Grajaú e Parelheiros (zona sul) e 64% em São Mateus (zona leste). Neste ano, Boulos foi derrotado por Nunes nos três bairros.

As aparições de Marta ao lado de Boulos tiveram um ritmo que se pode descrever como irregular. Ela encarou momentos de maior brilho, como no ato de sua refiliação ao PT, em fevereiro; na convenção partidária que formalizou a candidatura, em julho; e na estreia da campanha de rua, em agosto.

Mas a ausência foi notada em ocasiões como o lançamento do programa de governo, em agosto, e em uma caminhada do candidato com mulheres, no último dia 17. Havia outras apoiadoras, mas a vice, mulher, não apareceu.

O entorno de Marta sempre frisou que a petista mantém vitalidade e disposição para encarar as agendas de rua. Ela própria sinaliza animação a maior parte do tempo, sorrindo, acenando e dançando ao ritmo dos jingles. Na campanha, no entanto, vigora uma preocupação em poupá-la de maiores esforços por causa da idade.

Às vésperas do segundo turno, Marta enfrenta uma prova de fogo para seu capital político. Se derrotada, não será a primeira vez. Isso aconteceu em 2004, na busca pela reeleição, pelo PT, e numa tentativa de voltar à prefeitura em 2016, pelo MDB. Se vitoriosa, terá conseguido transferir votos e confirmar a tese de Lula de que Boulos precisava dela para ganhar.

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RAIO-X

Marta Teresa Smith de Vasconcellos Suplicy, 79

Psicóloga e sexóloga, ficou conhecida pelo programa TV Mulher, da Rede Globo, nos anos 1980.

Foi filiada ao PT (1981-2015), MDB (2015-2018) e Solidariedade (2020), retornando ao PT em 2024. Passou pelos cargos de deputada federal (1995-1999), prefeita de São Paulo (2001-2004), ministra do Turismo (2007-2008, governo Lula), senadora (2011-2012 e 2014-2019), ministra da Cultura (2012-2014, governo Dilma) e secretária municipal de Relações Internacionais de São Paulo (2021-2024, gestões Covas e Nunes). Em sua oitava eleição, é candidata a vice na chapa de Guilherme Boulos (PSOL) à Prefeitura de São Paulo

Patrimônio declarado à Justiça Eleitoral (2024): R$ 14,1 milhões

JOELMIR TAVARES E FABIO VICTOR / Folhapress

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