‘Saturday Night Live’ e o caos da sua noite de estreia estão em filme na Mostra de SP

LOS ANGELES, EUA (FOLHAPRESS) – Imagine um filme com alguns dos maiores comediantes dos EUA dos anos 1970 e 1980, mas quando ainda não eram famosos. Ou, para ser mais exata, a 90 minutos de encontrarem a fama, ao vivo e a cores, num programa de TV que revolucionaria os shows de comédia no país.

O tempo é exatamente a duração do filme “Saturday Night”, sobre os bastidores caóticos do primeiro episódio do programa de mesmo nome, hoje chamado “Saturday Night Live”, ou SNL, que completou 50 anos em 11 de outubro. O longa está sendo exibido na 48ª Mostra de Cinema Internacional de São Paulo.

“Era um grupo de jovens que estavam reagindo à televisão antiga da mesma forma que Woodstock parecia reagir à música antiga, ou como o cinema do início dos anos 1970 reagia ao cinema antigo”, disse à Folha o diretor Jason Reitman. “Até então, os programas que estavam no ar traziam um tipo de humor que vinha dos anos 1920 ou 1930, era uma evolução do vaudeville e do rádio.”

Não espere reconhecer os comediantes de cara, hoje gente famosa como Dan Aykroyd, Chevy Chase, Billy Crystal, John Belushi (1949-1982), George Carlin (1937-2008) e Andy Kaufman (1949-1984). Eles são interpretados por jovens atores, a maioria desconhecidos, e às vezes demora para cair a ficha.

Reitman conta que eles não participaram da escolha do elenco, mas que sempre perguntavam a mesma coisa: “Vai ser um cara bonitão?”

“O que eu precisava, na verdade, era de um ator que pudesse entender a essência de uma parte muito importante da personalidade de alguém. Não queria imitações”, diz o diretor, indicado ao Oscar por “Juno” (2008) e “Amor Sem Escalas” (2010). “No caso de Chevy Chase, ele era essa mente cômica brilhante com um ego enorme que precisava ser colocado em seu devido lugar. Esse era o papel.”

“Garrett Morris era alguém em busca de sua identidade, que não entendia seu lugar no ‘Saturday Night'”, segue Reitman, falando sobre o primeiro comediante negro do programa.

Já Gilda Radner (1946-1989) era uma artista com um “volume avassalador de empatia, que se cortaria em pedaços para agradar alguém”. Radner, que foi casada com Gene Wilder (1933-2016), ganhou o Emmy em 1978 por suas paródias de estereótipos televisivos no SNL.

O tipo de humor do SNL é difícil de descrever e vive evoluindo. Para Reitman, a comédia do início eram muitas coisas. “Era abstrata, absurda e perigosa, mas também havia uma ternura”, diz. “É quase indescritível, embora fosse autoconsciente.”

No centro do filme está Lorne Michaels, criador do SNL e até hoje produtor do programa aos 79 anos de idade. Jovem, ambicioso e cheio de paciência, ele percorre os corredores do estúdio da NBC no Rockefeller Center, em Nova York, tentando organizar a bagunça de artistas malucos e agradar executivos ferozes, um deles interpretado por Willem Dafoe.

Outros atores famosos que aparecem no filme são J. K. Simmons, que vive Milton Berle (1908-2002), representante da velha guarda da comédia americana, e Nicholas Braun, que interpreta Kaufman e também Jim Henson (1936-1990), o criador dos Muppets.

“O conceito do filme era evocar a experiência de como foi estar lá naquele momento e mostrar o nascimento de todas essas carreiras, de um tipo de humor”, diz Reitman, sem responder se tudo o que se vê no filme aconteceu mesmo naquela fatídica noite de sábado de 11 de outubro de 1975.

“E a única maneira de capturar o que cada um desses personagens estava passando era entrelaçar as memórias de todos daquela época.”

Mas ele reitera que tudo aconteceu, embora não na mesma ordem, como as brigas de Belushi, a exposição de genitália, o despencar do sistema de luz, o diretor roubado de outro programa, e até mesmo o triângulo amoroso entre Lorne Michaels, sua mulher e roteirista Rosie Shuster, e o então galã Dan Aykroyd.

“Sempre me interessei por histórias de amor complicadas. E Lorne e Rosi estavam desafiando o que o casamento deveria ser, assim como desafiavam o que a comédia deveria ser”, diz o diretor. “No final do casamento, eles ainda se amavam. Tinham algo complexo e lindo. A relação criativa era mais importante que a relação sexual.”

Reitman, que trabalhou com Aykroyd em “Ghostbusters: Apocalipse de Gelo” (2024), cresceu rodeado de comediantes graças ao seu pai, Ivan Reitman (1946-2022), conhecido pelos filmes de comédia, como os dois originais “Caça-Fantasmas” dos anos 1980. Reitman contou que “Saturday Night” foi o último roteiro dele que o pai leu.

Com tanta proximidade do tema e amigos na indústria, Reitman afirma que não se sentiu pressionado na direção ou mesmo escrevendo o roteiro com seu colega Gil Kenan. “Eu sou fã do ‘Saturday Night Live’, mas não sou um superfã. Conheço muita gente que sabe muito mais do que eu”, diz.

“Eu assisto regularmente, mas não obsessivamente. Vejo no YouTube mais do que ao vivo como a maioria das pessoas”, conta. “O programa segue relevante de maneira extraordinária. É o mais relevante na TV americana quando o assunto é a eleição presidencial. Lorne não fica olhando para trás.”

O filme passa longe de politicagens e centra no caos de colocar um show ao vivo na TV. É uma verdadeira “coreografia de balé” realizada pelas equipes na frente e atrás das câmeras, dois times nem sempre operando na mesma página.

Reitman capta a fluidez do trabalho, coberta por uma vibração frenética, em longos ‘takes’ pelos corredores do estúdio, como na cena de cinco minutos na abertura do filme. “Sem dúvida foi o filme mais complicado que já fiz”, afirma.

“O SNL foi uma mágica fora e dentro das telas que não deveria ter acontecido”, acrescenta. “A NBC não gostava do programa, o pessoal antigo atrás das câmeras também não era fã. Era tanta gente indo contra, e de alguma forma deu certo.”

Para escrever o roteiro, ele e Kenan entrevistaram centenas de pessoas que estavam no Rockefeller Center naquela noite, incluindo estagiários da NBC e membros da banda de Billy Preston (1946-2006), o primeiro convidado musical do programa, vivido pelo multi-instrumentista Jon Batiste.

“Honestamente, ser jornalista foi muito mais intimidador do que eu imaginava. O processo de entrevistar e manter um sujeito no caminho certo… Às vezes eles passavam dez minutos numa história que eu já sabia, ou desviavam para outro assunto, e eu precisava pensar rápido na próxima pergunta. Foi uma lição de contação de histórias.”

E, claro, a memória de cada pessoa, 50 anos depois, era pouco confiável. Havia muitas histórias contraditórias. “Lidamos com uma combinação de verdades, mitos e lendas”, diz Reitman. “E costurar isso tudo foi o que resultou no filme: uma sensação do que foi estar lá naquela noite.”

Saturday Nigh: A Noite que Mudou a Comédia

Quando: Mostra de SP: Sáb. (26), às 17h, no Cinesystem Frei Caneca; seg. (28), às 22h10, na Cinemateca; qua. (30), às 17h45, no Cinesesc

Preço: R$ 24 a entrada inteira

Classificação: 14 anos

Elenco Gabriel LaBelle, Rachel Sennott e Cory Michael Smith

Direção: Jason Reitman

FERNANDA EZABELLA / Folhapress

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTÍCIAS RELACIONADAS