BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – Sonho Georgiano, o partido do bilionário Bidzina Ivanishvili e próximo da Rússia, foi declarado vencedor nas eleições legislativas da Geórgia, realizadas no sábado (26), um sério revés nas aspirações do país de aderir à União Europeia.
Com 99% das urnas apuradas, a sigla obteve 54% dos votos, contra uma fatia de 38% conquistada pelas legendas de oposição, que denunciam fraudes em um processo eleitoral marcado por episódios de violência, compra de votos e constrangimentos.
Tina Bokuchava, presidente do Movimento Nacional de União, o principal partido de oposição, afirmou que “as eleições foram roubadas”. “Não vamos aceitar esses resultados fraudados. O oligarca Ivanishvili roubou nosso futuro europeu”, declarou. Ivanishvili, que fez fortuna na Rússia nos anos 1990, é o presidente de honra do Sonho Georgiano e figura central na realinhamento do país com o vizinho que ocupa duas regiões autônomas em seu território.
“Isto é um golpe constitucional”, afirmou Nika Gvaramia, líder da Coalizão por Mudança, legenda de posição mais bem votada, com 11%. Observadores internacionais e ONGs locais registraram diversas irregularidades durante o pleito de sábado. A associação de advogados do país diz que flagrou pelo menos 300 ocorrências.
Uma cena bizarra de violação de urna, no sul do país, viralizou nas redes sociais e gerou uma onda de denúncias: coerção, compra de votos e manipulação do trabalho de funcionários públicos e mesários, quase sempre envolvendo militantes do Sonho Georgiano.
O partido busca uma maioria constitucional (113 em 150 cadeiras do Parlamento, ou mais de 75%) para uma reforma eleitoral de caráter autoritário. No poder desde 2012, o Sonho Georgiano segue uma cartilha conservadora e pouco democrática, semelhante à de Viktor Orban, da Hungria, o único líder europeu a parabenizar a sigla pela vitória até aqui.
Em maio, o partido patrocinou a aprovação de uma polêmica lei que obriga ONGs e veículos de imprensa com mais de 20% de financiamento vindo do exterior a se registrarem como entidades que “servem aos interesses de uma potência estrangeira”. A carta tem evidente inspiração russa, que usa artifício parecido há anos para calar dissidentes.
A presidente do país, Salome Zurabishvili, vetou a legislação, mas seu ato foi derrubado no Parlamento a despeito de uma onda de protestos pelo país. O processo de adesão à União Europeia, que caminhava desde 2023, foi congelado pelo bloco. Pesquisas de opinião mostram que 80% dos georgianos concordam com a aspiração pró-Europa, o que contrasta com o resultado legislativo. O Sonho Georgiano concorda com a adesão, que até promete para 2030, mas defende uma atitude pragmática em relação à Rússia, para que a Geórgia “não vire uma nova Ucrânia”.
Irakli Kobakhidze, o atual primeiro-ministro, afirmou que a presidente tem a obrigação formal de chamar a primeira sessão da nova legislatura e ameaçou ignorá-la se o procedimento não for feito. Zurabishvili,
O impasse institucional deve se agravar na segunda-feira (28), quando a comissão eleitoral anunciar a distribuição de cadeiras. Ao que tudo indica, o Sonho Georgiano terá a maior bancada, mas não conseguirá formar maioria diante do boicote dos blocos de oposição.
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE / Folhapress