SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A isenção sobre lucros e dividendos faz com que a tributação máxima dos acionistas de empresas brasileiras seja de 14,2%, considerando a soma do imposto pago na pessoa física e na jurídica.
Esse é o percentual para contribuintes com renda bruta em torno de R$ 516 mil anuais. Para pessoas com renda superior a R$ 1 milhão, a carga cai para 13,3%. Esse é o grupo que reúne os 0,2% mais ricos entre os declarantes de Imposto de Renda. A tributação mínima é de 5,8%, paga por apenas 3.841 pessoas no topo da distribuição de renda.
Essa regressividade também faz com que cerca de 15 mil pessoas físicas que estão entre os 0,01% mais ricos entre os declarantes, com uma renda média de R$ 26 milhões por ano, paguem praticamente o mesmo imposto que um assalariado que recebe R$ 6.000 por mês. Nos dois casos, a tributação efetiva é de 13% sobre a renda.
Os dados fazem parte do estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) “Progressividade tributária: diagnóstico para uma proposta de reforma”, do economista Sérgio Gobetti.
“Tais evidências confirmam que a tributação da renda deixa de ser progressiva no ponto mais alto do topo da pirâmide e, na média, não passa de 14%, o que é um patamar muito baixo em perspectiva internacional”, diz o pesquisador do Ipea. “O Imposto de Renda deixa de ser progressivo justamente no topo da pirâmide de renda. Isso é uma deficiência do nosso modelo.”
Sócios de empresas do Simples Nacional têm uma carga ainda menor: um teto de 7,8% para pessoas nas faixas de renda próximas de R$ 200 mil ao ano.
O estudo considera a soma de diversas fontes de renda dos contribuintes, conforme as declarações apresentadas à Receita Federal.
O pesquisador do Ipea buscou responder à seguinte questão. Quando se propõe tributar a distribuição de lucros e dividendos de empresas para pessoas físicas, muitas pessoas argumentam que esse é um dinheiro que já foi taxado na pessoa jurídica com alíquotas que podem chegar a 34% nas empresas (45% no setor financeiro).
Dados da Receita e cálculos do Ipea mostram que esses números estão distantes da realidade. Devido a uma série de benefícios fiscais e regimes especiais, as empresas do Simples Nacional (faturamento até R$ 4,8 milhões/ano) têm uma tributação média efetiva de 6,4% sobre seus lucros; as do Lucro Presumido, de 11%.
Para as grandes empresas do lucro real (faturamento acima de R$ 78 milhões/ano), ela é de 22,4%, percentual que sobe para 30,7% para as instituições financeiras.
Outro problema é que nem todo o tributo pago na pessoa jurídica é suportado de fato pelo acionista da empresa, como mostram diversos estudos internacionais.
“Há inúmeros estudos recentes mostrando que em menor ou maior escala parte da tributação sobre o lucro da empresa acaba sendo transferida para os trabalhadores ou para os preços da economia”, afirma o pesquisador, citando alguns dos trabalhos que apontam uma transferência que varia de 30% a 70%.
Se for considerado que apenas 50% da carga sobre a empresa recai sobre o ganho do acionista, cenário que o estudo considera mais próximo da realidade, a tributação máxima é de 13,2%, para pessoas com renda média de R$ 423 mil. A alíquota cai para 10,3% no último percentil (1% de maior renda).
Segundo Gobetti, as discussões sobre uma reforma do imposto de renda que tenha por objetivo mudar esse quadro têm como desafio não confundir o porte da empresa com a capacidade contributiva dos seus sócios.
Ele dá como exemplo a questão das micro e pequenas empresas. Aqueles no topo da pirâmide de renda, os chamados milionários do Simples, pagam, em média, apenas 7,4% de imposto sobre tudo o que ganham. É uma carga inferior àquela paga por um trabalhador assalariado que ganhe R$ 4.500 mensais e menor também àquela paga por outros empresários com mesmo nível de renda, segundo o pesquisador.
“O fato de uma empresa ser pequena não significa que seus donos tenham baixa capacidade contributiva e sejam merecedores de um tratamento privilegiado na tributação de suas rendas.”
Segundo Gobetti, a baixa ou nula progressividade da tributação da renda, em especial no topo da distribuição (0,2% mais ricos, precisamente), é reflexo de inúmeras distorções e privilégios perpetuados no sistema tributário brasileiro, sendo que a isenção sobre lucros e dividendos distribuídos a pessoas físicas, medida que é uma exceção entre a maioria das economias, é apenas uma delas.
De acordo com o pesquisador, os dividendos distribuídos por empresas do Simples Nacional e do Lucro Presumido respondem por aproximadamente 70% da renda desta natureza recebida pelas famílias brasileiras. Os outros 30% vêm das grandes empresas do lucro real.
EDUARDO CUCOLO / Folhapress