CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) – Representante da direita tradicional em Curitiba, Eduardo Pimentel (PSD), prefeito eleito da cidade no domingo (27), teve a ajuda do eleitorado da esquerda para vencer no segundo turno contra uma candidata ligada à chamada direita radical, Cristina Graeml (PMB).
Assim como ocorreu em outras capitais brasileiras, o eleitorado curitibano mais identificado com a esquerda acabou sem representantes no segundo turno, e parte deste grupo optou pelo candidato que considerava “menos pior”.
Na capital do Paraná, embora o PSD tenha feito uma aliança com o PL na tentativa de assegurar o bolsonarismo na chapa, Pimentel foi para o segundo turno com uma candidata que segue à risca a cartilha dos apoiadores do ex-presidente e até contou com um aceno informal do próprio Jair Bolsonaro na véspera do primeiro turno.
Em um vídeo divulgado por Cristina, o ex-mandatário apareceu dizendo que ele não podia “abrir o voto”, mas que torcia pela candidata. Pimentel tem se esquivado sobre o assunto. “Foi uma atitude pessoal dele”, resumiu o eleito, em entrevista à Folha na segunda-feira (28).
Questionado se o vídeo teve impacto na campanha, Pimentel disse que “a forma que ela utilizou deu um peso no primeiro turno”. “Mas, no segundo turno, a cidade realmente se interessou no debate sobre Curitiba. Sobre quem tinha conhecimento técnico para administrar a cidade. Foi aí que eu ganhei a eleição”, avalia.
Ao longo da campanha do segundo turno, Bolsonaro não fez novas declarações públicas sobre as eleições em Curitiba nem apareceu pela cidade. Mas aliados do ex-presidente publicaram depoimentos a favor de Cristina, como os deputados federais Alexandre Ramagem (RJ) e Gustavo Gayer (GO), ambos do PL.
Sem diálogo com o eleitorado da esquerda, Cristina manteve no segundo turno a postura de “candidata contra o sistema”, que não pertence à política tradicional e sem dinheiro de fundo eleitoral, em contraposição à ampla aliança partidária de Pimentel e às máquinas municipal e estadual, hoje nas mãos do prefeito Rafael Greca (PSD) e do governador Ratinho Junior (PSD), cabos eleitorais do candidato a prefeito.
O tamanho do eleitorado da esquerda, contudo, não foi desprezado pela campanha de Pimentel, ainda que o aceno a esse segmento tenha sido discreto. No segundo turno, ele repetiu que não queria “mudar a ideologia de ninguém” e que estava aberto ao diálogo, ao contrário da “candidata extremista”.
Juntos, os principais candidatos do campo da esquerda obtiveram mais de 20% dos votos no primeiro turno, quando Pimentel saiu com 33,5% e Cristina com 31,2%. O candidato do PSB, Luciano Ducci, apoiado pelo PDT e pelo PT, ficou em terceiro lugar na disputa.
Nas urnas do segundo turno, a diferença entre Pimentel e Cristina se ampliou em mais de 15 pontos. Ele fez 57,6% dos votos contra 42,4% da rival. Já a quantidade de votos nulos e abstenções não se alterou de forma significativa entre um turno e outro.
“Eu agradeço todo voto que eu recebi e sempre falei no segundo turno que eu queria o voto de todos. Porque eu não sou da extrema, eu sou moderado, eu sou curitibano raiz”, diz ele, em referência a um dos motes de Cristina, “a candidata da direita raiz”.
A campanha de Pimentel também conquistou votos ao focar na desconstrução da imagem da rival, com quem trocou intensos ataques ao longo da campanha. Repetindo a ideia de que “pauta ideológica não coloca comida na mesa nem remédio na prateleira da unidade de saúde”, Pimentel transferiu o debate para temas do cotidiano do eleitorado, como tarifa de ônibus, e explorou fragilidades do plano de governo apresentado pela adversária.
Em um dos trechos, o documento falava superficialmente sobre uma proposta de tarifa proporcional ao trajeto do usuário do transporte, o que abriu brecha para que a campanha de Pimentel apontasse que ela pretendia aumentar a passagem para o morador de bairros mais distantes do centro.
Em entrevistas que concedeu no primeiro turno, a própria candidata também sugeriu que quem se deslocava mais deveria pagar mais, como num Uber ou táxi, mas não chegou a dar detalhes sobre valores.
No segundo turno, com a repercussão negativa, ela passou a usar boa parte do seu programa eleitoral na televisão para esclarecer que a tarifa não iria aumentar e que ela apenas seria menor para quem se deslocasse menos.
Outro ponto de desgaste para a campanha de Cristina foi a escolha do seu candidato a vice-prefeito. A campanha de Pimentel revelou que Jairo Filho (PMB) é alvo de processos judiciais que indicam prática de pirâmide financeira entre seus negócios, o que ele nega.
O discurso da mudança proposto na campanha de Cristina somado à falta de experiência da candidata na administração pública ela é formada em jornalismo e fez carreira como repórter de TV também foi explorado por Pimentel.
A campanha do PSD apontou ao eleitor “os riscos de uma aventura” na cidade que é “exemplo para o Brasil”, flertando com a antiga ideia da “cidade modelo”, como propagandeada nas gestões entre os anos 1980 e 1990.
Na primeira entrevista à imprensa após a derrota nas urnas, Cristina afirmou que foi vítima do poder econômico e político representado pelo adversário. “Um sistema apodrecido que mostrou toda sua força contra uma mulher”, disse ela.
“A máquina é acachapante, mas não é intransponível. A gente tem muita força, enquanto cidadão, quando a gente se une. Neste sentido, a caminhada continua”, afirmou ela.
CATARINA SCORTECCI / Folhapress