BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O diretor da Opas (Organização Pan-Americana da Saúde), Jarbas Barbosa, afirmou que os países das Américas não podem impedir a migração de profissionais de saúde, como tem ocorrido no caso dos enfermeiros para a Europa.
Barbosa afirmou nesta quarta-feira (30) que a Opas tem trabalhado nesse tema e defende que, em vez de proibir a migração, os países deveriam implementar políticas de retenção. A entrevista foi dada à reportagem durante evento do G20, realizado no Rio de Janeiro.
“Você não pode impedir a migração. Então, a melhor maneira de combater a migração é fazendo um bom planejamento do número de profissionais que você precisa formar e implementando uma política de, como chamamos, retenção. Muitas vezes as pessoas migram porque, lá fora, têm mais facilidades, ganham melhor e encontram mais oportunidades de crescimento”, diz.
A fala vem em um contexto em que o Ministério da Saúde debate, durante a reunião do G20, uma proposta de declaração para que os países membros se comprometam com os códigos de conduta estabelecidos pela OMS (Organização Mundial da Saúde).
O objetivo é se contrapor ao que membros do governo Lula (PT) consideram recrutamento predatório de profissionais de saúde por parte de países desenvolvidos.
A demanda por enfermeiros brasileiros na Europa, em especial na Inglaterra e Alemanha, é impulsionada pela escassez de profissionais no sistema de saúde dos países e pela qualidade da formação de enfermeiros no Brasil. No entanto, esse tema tem gerado atritos.
O caso da Alemanha gerou especial apreensão no governo Lula. Auxiliares do presidente chegaram a se queixar do recrutamento realizado por intermédio da Agência Federal de Emprego alemã, vinculada ao Ministério do Trabalho do país, mas com autonomia de atuação.
Jarbas acrescentou que essa é uma questão em toda a América Latina, especialmente no Caribe, onde metade dos enfermeiros formados acaba deixando o país.
A Opas tem incentivado os países a compartilharem dados sobre a entrada e saída de profissionais de saúde, visando criar uma base sólida de informações. Esse esforço já ampliou de 5 para 18 o número de países que compartilham esses dados.
Jarbas afirmou que, segundo estimativas, até 2030 a região das Américas enfrentará um déficit de 600 mil profissionais de saúde. Esse cenário é resultado de diversos fatores agravados pela pandemia de Covid-19, como a desistência de profissionais da área e a mudança de curso ainda durante a faculdade.
O diretor da Opas disse ainda que a organização estuda centralizar a compra de medicamentos de alto custo para algumas doenças, como câncer de pulmão, de próstata, mama para diminuir o preço de mercado.
A Opas pretende priorizar a produção regional e disse que o Brasil tem potencial para ser um dos produtores desses medicamentos. Para dar garantia ao produtor, a intenção é fazer um contrato multianual.
“A gente já tem a lista das doenças, a gente está com a lista dos medicamentos, a gente está finalizando a identificação dos produtores, então a gente acredita que até o final do ano a gente já vai compartilhar com os países para definir e começa a compra já em 2025”, disse.
Durante a entrevista, Jarbas também abordou temas centrais das discussões de saúde no G20, como a relação entre mudanças climáticas e saúde, enfatizando que esse é um assunto crucial por influenciar diretamente na população.
Ele destacou o aumento das mortes causadas por ondas de calor, especialmente entre idosos, que se tornam mais vulneráveis a eventos climáticos extremos, como furacões e enchentes. Citou ainda o crescimento até mesmo de casos de dengue, que também tem relação com as mudanças climáticas.
Para enfrentar esses desafios, a Opas tem trabalhado na capacitação do setor de saúde, permitindo que ele participe das discussões globais sobre o tema. O esforço da organização também é voltado para o fortalecimento dos sistemas de informação e vigilância, buscando uma integração que permita uma resposta mais eficaz aos impactos das mudanças climáticas na saúde.
Jarbas também foi perguntado sobre como a Opas via o caso de pessoas transplantadas com órgãos contaminados pelo HIV no Brasil, disse ser uma situação inadmissível, mas que mesmo após o acontecido o país segue como uma referência forte sobre o tema.
“Isso chama a atenção de como é importante você manter critérios de qualidade, porque é inadmissível você ter uma pessoa recebendo um órgão contaminado com HIV, quando você tem testes capazes de prevenir isso”, disse.
RAQUEL LOPES / Folhapress