SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Líder do consórcio que venceu o leilão da PPP (parceria público-privada) para construir e administrar 17 escolas estaduais paulistas, a construtora Engeform vê na gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) uma oportunidade para expandir e variar o rol de serviços públicos que administra.
A empresa já participa da gestão de sete cemitérios na cidade de São Paulo e de três companhias de saneamento em Goiás e Santa Catarina e está interessada numa licitação de R$ 2,4 bilhões do governo paulista para restauro de prédios e requalificação de espaços públicos no centro da capital. A construtora também não descarta participar de uma eventual concessão de escolas que inclua contratação de professores e gestão pedagógica, embora isso não tenha sido proposto pelo governo.
Realizado na última terça (29), o leilão foi suspenso nesta quarta (30) em decisão liminar (provisória) da Justiça. O juiz Luís Manuel Fonseca Pires, da 3ª Vara da Fazenda Pública, entendeu que a licitação “compromete a efetividade do princípio constitucional da gestão democrática da educação pública” ao privatizar serviços como limpeza, alimentação, jardinagem e manutenção das escolas, afirmando que essas atividades são parte do serviço público essencial que constitui dever do Estado. O governo Tarcísio afirma que vai recorrer da decisão.
O rosto da expansão da Engeform no serviço público é o do advogado e administrador Marcelo Castro dos Santos, que comanda o braço de concessões e investimentos do grupo. Ele começou a carreira como estagiário da Camargo Corrêa Cimentos (hoje, InterCement) –onde ficou por 15 anos e chegou a comandar a representação da empresa no Mercosul– e está há 12 anos na Engeform.
“A Engeform Engenharia hoje é uma empresa que fatura mais de R$ 1 bilhão. Crescemos de forma substancial e isso culminou na constituição aqui da Engeform Concessões e Investimentos”, diz Castro.
Fundada em 1977, a construtora já construiu escolas para os governos estadual e municipal. No portfólio da empresa estão obras como a sede do Centro Paula Souza e uma escola técnica na região da Luz, no centro da capital; uma escola estadual na Vila Maria e o Parque da Juventude, na zona norte; e o CEU (Centro Educacional Unificado) de Heliópolis, no sudeste paulistano.
A diferença agora é a gestão de serviços nas unidades por mais de duas décadas. A PPP prevê a construção de 17 escolas estaduais até o primeiro semestre de 2026. Depois, a concessionária será responsável pela manutenção das unidades por 23 anos e meio. Além da Engeform, a gestora de fundos de investimento Kinea integra o consórcio.
Caso a liminar seja derrubada e a concessão prospere, o governo estadual deve pagar R$ 3,38 bilhões para a construtora ao longo desses anos. O governo calcula que a empresa terá que investir R$ 1,1 bilhão na construção das escolas e gastar R$ 1,25 bilhão com manutenção durante esse prazo.
“A expertise em termos de gestão, manutenção e cuidado de empreendimentos nós temos. Não temos especificamente em escolas, mas a gente tem uma similaridade em outros negócios nossos”, diz Castro. “Não diria que são poucas diferenças, porque há o tratamento com jovens, o funcionamento de uma escola evidentemente tem as suas características específicas, mas nos consideramos bastante seguros e confortáveis para fazer esse trabalho.”
Para receber o valor total previsto em contrato, a empresa deve ter uma boa pontuação em índices de desempenho técnico e pesquisas de satisfação. A metodologia leva em conta a qualidade de fatores como a comida e os serviços de vigilância, limpeza, controle de pragas, jardinagem e manutenção, entre outros. Se for mal avaliada, há descontos no pagamento.
Castro diz que um dos principais entraves ao avanço dos projetos de construção e gestão das escolas pode ser a própria atuação do poder público. Isso porque a construção de algumas escolas dependerá de desapropriações, retirada de árvores, aprovação de licenças ambientais e do próprio projeto arquitetônico da unidade.
“Se nós tivermos um processo de aprovação de projetos e de [liberação de] licenças mais rápido, e evidentemente nisso dependemos do poder público, mais rápido vamos entregar as obras”, afirma o empresário.
Já o próximo projeto que a empresa cobiça prevê a construção de 6.135 unidades habitacionais, principalmente nos bairros da Sé e da República, no centro de São Paulo. Serão 5.046 novas unidades e 1.089 retrofits (prédios antigos modernizados). A área de moradia, de 382 mil metros quadrados, corresponde a 53% da área construída prevista no projeto.
Outros 337,5 mil metros quadrados em construções serão distribuídos entre equipamentos públicos (2%); calçadas, passarelas e ciclovias (8,1%); estacionamentos (8%); serviços e comércio (21,2%); e restauro de imóveis tombados (7,52%). O projeto prevê R$ 1,9 bilhão a ser aplicado pelo setor privado e R$ 500 milhões pelo governo.
EMPRESA É RÉ EM AÇÃO POR IMPROBIDADE
A Engeform é ré numa ação de improbidade administrativa que tramita há 15 anos na Justiça estadual.
Segundo o Ministério Público estadual, a gestão Marta Suplicy (PT) contratou a empresa de forma ilegal em 2002 para a construção de um reservatório para conter inundações no córrego Inhumas.
A contratação foi emergencial e sem licitação. Segundo a Promotoria, houve um sobrepreço de 50% no valor pago pelos cofres municipais. As construtoras OAS e Queiroz Galvão, contratadas na mesma ocasião para obras similares em outros córregos, também foram alvo de ações do MP-SP. Até hoje não houve julgamento do mérito, e neste ano promotores chegaram a sugerir a possibilidade de firmar um acordo de não persecução civil.
Em 2010, a Justiça Eleitoral chegou a considerar ilegais doações da Engeform e de outras empresas à campanha de Gilberto Kassab (ex-DEM, hoje PSD) pela Prefeitura de São Paulo em 2008. O mandato de Kassab foi cassado em primeira instância, mas a decisão acabou revogada. Após contribuir com a campanha, a construtora firmou contratos e recebeu dinheiro da prefeitura no ano seguinte à eleição.
A empresa já respondeu a outras acusações de improbidade em obras públicas, mas foi absolvida.
Sobre os processos na Justiça, a Engeform disse, por meio de nota, que “tem uma história de 48 anos atendendo clientes públicos e privados, nos mais diversos segmentos, e cumpre rigorosamente com todos os preceitos legais, atuando em absoluta consonância com a legislação e com seu Código de Ética e Compliance”.
TULIO KRUSE / Folhapress