RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Winnnie Byanyima, diretora-executiva da Unaids, o programa conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS, afirma que os países pobres devem ter a possibilidade de fabricar e distribuir medicamentos regionalmente, sob o risco de o planeta viver um novo “apartheid de vacinas” com “milhões de pessoas morrendo” em uma possível próxima pandemia.
Byanyima, que também é subsecretária-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), está no Brasil para um encontro paralelo do G20 com representantes internacionais de organizações e instituições sobre Saúde.
Byanyima também foi diretora executiva da Oxfam Internacional e parlamentar de três mandatos em Uganda.
“Sem se preparar para a próxima pandemia, que está chegando, vamos novamente passar por uma situação de apartheid de vacinas, com milhões de pessoas morrendo cujas vidas deveriam ser salvas, e economias entrando em colapso. Devemos desenvolver essa capacidade em cada região para fazer seus próprios medicamentos”, afirma Byanyima, em entrevista à Folha.
Na Covid, a alta transmissão e a desigualdade vacinal levaram às variantes. Dentro do Brasil, a falta de coordenação nacional no plano de operacionalização da vacina contra a Covid intensificou a desigualdade entre as regiões mais ricas e pobres do país. Estados com índice de desenvolvimento humano baixo também ficaram abaixo do índice de cobertura vacinal previsto pela OMS.
“Descobrimos que, sim, os governos se comportarão de forma egoísta e vão querer se proteger sozinhos, que não haverá incentivo para compartilhar a tecnologia. Então precisamos disso. Também vimos que as cadeias de suprimentos são interrompidas globalmente. Então, torna-se até impossível mover vacinas de uma região para outra. Por isso precisamos dessa capacidade regional.”
Byanyima lembra que, durante a pandemia, países como Estados Unidos e Alemanha investiram e conseguiram desenvolver a vacina em um ano, enquanto outras nações ficaram para trás na busca pelo imunizante.
Em reunião preparatória do G20, em Salvador, em junho, o governo brasileiro já havia feito a proposta de uma aliança que permita a produção de medicamentos ao redor do mundo.
A diretora-executiva da Unaids diz que o mundo falha ao não distribuir de forma igualitária tecnologias de prevenção e tratamento do HIV.
Dados da Unaids apontam que cerca de 630 mil pessoas morreram no último ano de doenças relacionadas ao HIV. A organização defende que a desigualdade social entre países tem relação direta com os impactos que epidemias e pandemias causam nas populações.
Byanyima também faz parte de um conselho global sobre desigualdade, AIDS e pandemia, do qual também faz parte a ministra da Saúde do Brasil, Nísia Trindade, e o economista Joseph Stiglitz, ganhador do Nobel de economia.
“A desigualdade impulsiona pandemias e pandemias aumentam a desigualdade. É um ciclo. Seja HIV, seja mpox, seja Covid. Se há mais igualdade na sociedade, há mais acesso à saúde, mais proteção social aos incapazes de trabalhar. Se há medicamentos criados e precificados corretamente em cada país, não haverá países excluídos e pessoas morrendo.”
O Brasil integra um estudo mundial para testar a eficácia de uma injeção de lenacapavir que, aplicada a cada seis meses, fornece melhor proteção contra a infecção por HIV, em comparação com os medicamentos preventivos orais de uso padrão para a Prep (profilaxia pré-exposição).
A Argentina, o México, o Peru, a África do Sul, a Tailândia e os Estados Unidos também participam dos testes.
“Sabemos onde estavam e como viviam as 630 mil pessoas que morreram no último ano. São pessoas da África, mas também pessoas pobres de países da Ásia e América Latina. Muitos não conseguiram tratamento mesmo quando o tratamento estava disponível. Isso é consequência da desigualdade social.”
O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promoção da saúde
YURI EIRAS / Folhapress