SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar apresenta forte queda nesta segunda-feira (4), com investidores repercutindo a previsão de que o pacote de corte de gastos do Ministério da Fazenda será anunciado ainda nesta semana.
O anúncio foi feito pelo chefe da pasta, Fernando Haddad, em entrevista coletiva a jornalistas em Brasília. O mercado ainda segue de olho na eleição presidencial norte-americana, bem como nas decisões de juros dos bancos centrais do Brasil e dos Estados Unidos.
Às 14h19, a moeda norte-americana perdia 1,66%, cotada a R$ 5,772. Já a Bolsa disparava 1,64%, aos 130.224 pontos.
Em semana de agenda cheia, o mercado se volta a eventos externos e domésticos.
Na ponta brasileira, o destaque é a área fiscal. Haddad afirmou que as medidas de contenção de gastos públicos a serem anunciadas pelo governo estão “muito avançadas” do ponto de vista técnico e disse acreditar que o pacote será anunciado ainda nesta semana.
O ministro teve a viagem à Europa cancelada a pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no domingo.
“Minha ida [à Europa] estava dependendo dessa definição, se esta semana ou semana que vem seriam feitos os anúncios. Como o presidente [Lula] pediu para eu ficar e como as coisas estão muito adiantadas do ponto de vista técnico, acredito que estejamos prontos esta semana para anunciar [o pacote]”, afirmou.
O ministro esteve com Lula na manhã desta segunda, mas afirmou que o encontro teve como pauta as reuniões do G20. Um novo encontro, na parte da tarde, será focado no tema fiscal.
Ele disse que há “várias definições” sobre as medidas de gastos e que o presidente passou o fim de semana trabalhando o assunto em contato com técnicos, mas não apresentou detalhes do pacote.
“Por deferência ao presidente, ele que vai organizar a comunicação, a reunião da tarde tem essa finalidade, vamos aguardar algumas horas, ele que vai definir quem comunica, como comunica. Peço algumas horas para termos um encaminhamento da parte dele”, afirmou.
O ministro passaria a semana em eventos em Paris, Londres, Berlim e Bruxelas, e, segundo um interlocutor ouvido pela Folha de S.Paulo, a ausência do chefe da ala econômica tornaria “praticamente impossível” que o plano fosse definido nos próximos dias a contragosto do mercado, que espera celeridade na resolução das incertezas fiscais.
Em reação à viagem e a pressões externas, o dólar disparou 1,52% na sexta-feira (1º), cotado a R$ 5,869, o maior patamar para a moeda norte-americana desde o início da pandemia, quando, em 15 de maio de 2020, esteve cotada a R$ 5,841.
Para os investidores, o governo precisa ajustar a ponta das despesas, e não só reforçar a arrecadação, para garantir a longevidade do arcabouço fiscal.
A previsão de encaminhar ao Congresso Nacional ainda em 2024 um pacote de revisão de gastos estruturais foi anunciada pela ministra Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) em 15 de outubro. Na ocasião, afirmou que as medidas seriam enviadas após as eleições municipais, que terminaram no domingo passado (27).
O movimento das autoridades “demonstra que o fiscal é uma preocupação que começou a ter maior foco”, diz Alex Agostini, economista-chefe da agência classificadora de risco Austin Ratin.
O especialista, no entanto, pondera que só o aceno à responsabilidade fiscal não será o suficiente para garantir uma queda sustentável do dólar ao longo dos próximos dias. Além de o mercado exigir medidas concretas, a desvalorização do real está atrelada, em grande parte, a incertezas das eleições presidenciais nos Estados Unidos.
Pesquisas de intenção de voto indicam que o candidato republicano Donald Trump e a atual vice-presidente democrata Kamala Harris estão em empate técnico. No mercado de apostas, porém, as chances de um retorno do ex-presidente à Casa Branca são maioria, levando o mercado a precificar o impacto das propostas de Trump na economia.
O republicano promete aumento tarifário sobre as importações, especialmente as chinesas, e um possível corte de impostos medidas que são vistas como inflacionárias e que podem influenciar o Fed (Federal Reserve, o banco central norte-americano) a manter juros elevados por mais tempo, o que fortalece o dólar.
Uma pesquisa publicada no final de semana, porém, apontou um apoio inesperado à Kamala Harris em Iowa, estado anteriormente dominado por Trump. O levantamento, feito pela pesquisadora apartidária J Ann Selzer, é considerada o “padrão ouro” das pesquisas de opinião.
A virada democrata em Iowa desmontou parte das apostas na vitória do ex-presidente. Para efeito de comparação, a probabilidade de um retorno do republicano diminuiu de 64% para 54% na Kalshi, a Bolsa de futuros dos EUA, e de 67% para 58% na Polymarket, a Bolsa de criptomoedas offshore.
Com isso, o dólar tinha perdas ante praticamente todas as moedas globais. No DXY, a desvalorização era de 0,40%.
A semana ainda guarda as decisões de juros do Fed e do Copom (Comitê de Política Monetária) do BC (Banco Central).
Por causa das eleições presidenciais, a reunião da autoridade norte-americana foi adiada em um dia e irá ocorrer entre quarta e quinta-feira, enquanto a decisão do comitê brasileiro será anunciada na quarta-feira, como de praxe.
A expectativa dos agentes financeiros é que o Fed dê continuidade ao ciclo de afrouxamento nos juros. Na reunião de setembro, o colegiado reduziu a taxa em 0,5 ponto percentual, levando-a à banda de 4,75% e 5% o primeiro corte em quatro anos.
Na ferramenta CME Fed Watch, a probabilidade de uma redução de 0,25 ponto marca 96%. A diminuição do ritmo vem na esteira de uma bateria de dados que indicaram que a economia dos Estados Unidos segue forte, com inflação convergindo à meta de 2% e mercado de trabalho resiliente.
O movimento é o oposto do BC brasileiro. Aqui, o Copom decidiu reiniciar o ciclo de apertos na taxa Selic na reunião passada, quando optou por uma alta de 0,25 ponto percentual e levou os juros a 10,75% ao ano.
Com a piora no cenário econômico nos últimos 45 dias, o mercado espera que o comitê acelere o ritmo de altas para 0,5 ponto percentual.
Economistas ouvidos pela Folha de S.Paulo veem necessidade de um choque maior de juros para levar a inflação para a meta devido a uma série de fatores, sobretudo ao risco fiscal.
TAMARA NASSIF / Folhapress