SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse nesta segunda-feira (4) que não era função do governo federal checar se as contas feitas pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) sobre os impactos de uma operação com bancos estavam corretas.
Na semana passada, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) afirmou que o ministério usou cálculos errados para aprovar a operação de R$ 7,8 bilhões anunciada pelo governo com a função de baixar a conta de luz. O valor do benefício aos consumidores, inicialmente, era estimado em R$ 510 milhões, mas caiu para R$ 46,4 milhões (menos 90%) após a operação ter sido homologada.
“A medida provisória [assinada em abril] deu competência à CCEE para fazer os cálculos, portanto essa pergunta deve ser feita ao presidente da CCEE. Eu entendo que a MP buscou e teve o propósito único e exclusivo de quitar uma dívida que foi feita em nome do povo brasileiro pelo governo anterior de forma irresponsável trazendo o ônus, que foi a conta Covid, à conta escassez hídrica”, disse o ministro a jornalistas em evento em São Paulo.
“[Checar as contas] cabe ao Tribunal de Contas da União. O ministério é formulador de política pública, a Aneel é reguladora e a CCEE, como uma entidade privada, é operadora da determinação das políticas públicas. Eu tenho manifestado sempre, por escrito inclusive, ao TCU, pedindo o acompanhamento de todas essas ações das vinculadas, em especial da Aneel”, acrescentou.
A operação com os bancos havia sido liberada em abril por uma MP (medida provisória) assinada pelo presidente Lula (PT) e por Silveira, que autorizaram a CCEE a negociar no mercado financeiro um mecanismo de antecipação de recursos oriundos da Eletrobras -que, anteriormente, só seriam recebidos ao longo dos anos. Ou seja, os bancos antecipariam um dinheiro que só seria depositado posteriormente.
A intenção anunciada pelo governo em abril era baixar a conta de luz por meio da quitação das chamadas contas Covid e Escassez Hídrica (criadas em crises do setor nos anos anteriores). A MP falava que a operação de antecipação estaria autorizada “desde que caracterizado o benefício para o consumidor”, em meio a apontamentos no setor sobre um efeito contrário da medida no longo prazo.
Em julho, portaria dos ministérios da Fazenda e de Minas e Energia determinou que a CCEE avaliasse o benefício e deu ao MME a responsabilidade de homologar que haveria a vantagem aos consumidores.
Como as contas da CCEE apontaram um benefício de R$ 510 milhões, a operação foi fechada com um consórcio integrado por Banco do Brasil, Itaú BBA, Bradesco, BTG e Santander. Mas, conforme mostrou a Folha de S. Paulo em setembro, a operação em questão quase deu prejuízo e teve que passar por ajustes.
A partir de questionamentos da Aneel sobre as contas feitas, a CCEE ajustou os números e publicou o valor final de R$ 46,4 milhões de benefício ao consumidor. A agência havia identificado que as contas da CCEE não continham os pagamentos das distribuidoras para as contas Covid e Escassez previstos para setembro, sendo que a operação de quitação antecipada só ocorreria em outubro. Além disso, foi encontrada uma divergência nas datas de referência de cada fluxo.
Com as alterações, o benefício médio final ao consumidor, segundo a área técnica da Aneel, ficará em 0,02%. Muito menos do que indicava em abril o governo, que estimou oficialmente uma redução de até 3,5% na exposição de motivos da MP (documento que traz a justificativa do governo para a medida).
A Aneel, aliás, é protagonista no conflito entre as agências reguladoras e o governo federal. Após o segundo apagão em São Paulo, Silveira acusou a Aneel de inação, e a CGU (Controladoria-Geral da União) abriu no mês passado uma investigação preliminar para apurar possíveis irregularidades envolvendo dirigentes da Aneel.
O diretor-geral da agência, Sandoval Feitosa, por sua vez, reclamou de contingenciamentos no orçamento. Segundo ele, o órgão só tem nove servidores para fiscalizar o segmento de distribuição em todo o país.
Questionado por jornalistas nesta segunda, Silveira disse não ser contraditório o governo cobrar eficiência das agências ao mesmo tempo em que contingencia suas verbas. “Não tem nenhuma contradição nisso; é coerente o governo ter uma limitação feita por lei, que é o arcabouço fiscal, e cumprir a lei”, disse. “Essa é uma discussão que é feita pela junta do conselho fiscal, que toma as decisões e promove o orçamento, que nós sabemos que a palavra final inclusive é do Congresso Nacional”, acrescentou.
PEDRO LOVISI / Folhapress