Empresa de Sam Altman paga R$ 300 para escanear íris e criar identidade digital

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Olhar no fundo de duas câmaras localizadas no topo de uma esfera prateada, ter a íris fotografada, convertida em um código binário, e, depois, ter a temperatura medida por um sensor infravermelho para confirmar se está vivo. Todos esses dados são coletados em cinco segundos.

É esse o primeiro passo do processo para gerar a identidade digital, vendida por Sam Altman e seus sócios como a solução para separar os humanos das máquinas no futuro próximo. O código já serviria hoje para identificar deepfakes, como são chamados os clones criados com IA usados em paródias e em crimes virtuais, e para garantir que apenas pessoas sejam beneficiadas por programas sociais em uma futura economia dominada pela automação.

Dentro do orb, como é chamado o globo de cor prata, roda uma inteligência artificial que pergunta: “É uma pessoa? Ela está viva?” Caso a resposta às duas perguntas seja sim, o robô começa o processo de criptografia para gerar o Face ID, como é chamado o código de “comprovação de humanidade”.

Quem se submete ao procedimento, feito no Brasil a partir desta quarta-feira (13), ganha 25 criptomoedas chamadas Worldcoin. A cotação atual do ativo, bastante volátil, é de US$ 2,32 (R$ 13,46). No total, o bônus pode ultrapassar os R$ 300.

Parece uma cena da ficção científica “Minority Report”, de Philip K. Dick, mas é um dos passos para a visão de futuro de Altman, o homem por trás do ChatGPT, descrita no ensaio “Moore’s Law for Everything”. Para o presidente-executivo da OpenAI, a IA vai substituir grande parte da força de trabalho, mas vai causar uma grande deflação pelo aumento da produtividade —a solução política seria criar uma renda básica universal, entre outras reformas econômicas.

Hoje, já são mais de 7,5 milhões de humanos verificados e outros 16 milhões que baixaram o aplicativo. Para a empresa, é necessário obter um grande número de de usuários para poder fornecer o serviço de autenticação a governos e bancos.

A empresa retornou ao Brasil, depois de uma passagem relâmpago entre o fim de julho e o início de agosto do ano passado, numa fase de testes. A tecnologia foi alvo de críticas pelo sucesso que teve no mundo subdesenvolvido. A Argentina, que enfrenta há anos desconfiança na moeda local e corrida por dólares, é o líder em adesão, com mais de 2 milhões de usuários únicos e 4 milhões de usuários.

Antes do lançamento oficial em 14 países, a empresa testou a plataforma em 2 milhões de pessoas em 24 países —14 eram nações em desenvolvimento pelos critérios do Banco Mundial, das quais 8 estavam na África.

Depois de uma recepção menos entusiasmada às três orbs inicialmente instaladas em São Paulo e de alertas sobre o risco de ter os dados biométricos vazados, a iniciativa saiu do país em menos de 10 dias.

O chefe de privacidade da recém-renomeada rede World, Damien Kieran, diz que as críticas foram injustas. De acordo com o executivo irlandês, a tecnologia pensada pelo fundador da empresa, o físico alemão Alex Blania, é o padrão ouro de segurança. “Ele pensou em uma forma de mostrar que alguém é humano, sem revelar a identidade, a cor, a etnia, a religião ou qualquer dado sensível”, afirma.

Os planos da World são, agora, de voltar para ficar. A rede começa a operar, nesta quarta, com oito pontos de coleta de dados biométricos, todos na capital paulista. A operação fica sob responsabilidade de parceiros registrados.

A TfH recomenda que os usuários baixem o app da empresa, em Play Store (para usuários Android) ou App Store (Apple), e agendem um horário antes de visitar o orb, para evitar filas.

A escolha pela íris seria pela alta confiabilidade do dado biométrico —a chance de falso positivo é de 1 em 2 bilhões de tentativas. A mesma taxa fica em 1 a cada 16 milhões para o rosto, e, para impressão digital, 1 em 80 milhões. A biometria é usada para criar um código binário, como se fosse um código de barras.

A empresa diz que não armazena esse dado, que seria mantido de maneira criptografada, dividido em três servidores de universidades espalhadas pelo mundo. A companhia Tools For Humanity (TfH), que criou a rede World, usa o mesmo protocolo de blockchain da criptomoeda Ethereum. A novidade seria o uso do poder computacional das instituições de ensino para operar em escala, introduzido por Blania.

Envolve computação quântica e é difícil de quebrar, diz Kieran. Além disso, o protocolo é aberto e pode ser estudado, usado e adaptado por qualquer um que tenha interesse, afirma.

A tecnologia ainda seria capaz de indicar idade do usuário, sem expor a identidade. Seria uma forma, por exemplo, de evitar que menores de 13 anos se cadastrem em redes sociais, em contrariedade com os termos de uso das plataformas.

A empresa “está completamente adequada” à LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e à GDPR (lei de proteção de dados europeia), segundo o executivo, em uma tentativa de aplacar a preocupação com os padrões americanos de privacidade, já que nos EUA não há uma lei vigente de proteção de dados. “Como irlandês, eu fico no meio do caminho entre a cultura europeia e a americana”, afirmou.

Eles começarão a operar nos Estados Unidos apenas em 2025, por causa de decisões judiciais que restringem transações com criptomoedas.

PEDRO S. TEIXEIRA / Folhapress

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