Tribunal argentino mantém pena de 6 anos e inabilitação de Cristina Kirchner

BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Já era esperado, mas não deixou de ser um revés. A Justiça da Argentina manteve nesta quarta-feira (13) a sentença de seis anos de prisão e inabilitação perpétua para concorrer a cargos públicos contra Cristina Kirchner, ex-presidente e um dos personagens políticos de maior peso no país, em um caso de corrupção em obras públicas.

A decisão foi validada por um tribunal de revisão de foro penal, e agora praticamente se esgotam as alternativas para Cristina. Sua última chance é recorrer ao Supremo argentino —e ela indica que assim o fará. A pena só se faria cumprir quando se esgotarem todos os recursos.

O caso em questão é apelidado de Vialidad, no qual se investigou um esquema de desvio de dinheiro público e favorecimento do empresário Lázaro Báez na província de Santa Cruz, ao sul do país.

O promotor do caso havia antes pedido que Cristina fosse considerada culpada de associação ilícita e administração fraudulenta em prejuízo do Estado, com pena de 12 de anos de prisão. Em dezembro de 2022, meses após Cristina ser alvo de uma tentativa de assassinato, a Justiça a absolveu da primeira acusação, mas a considerou culpada por fraude contra o Estado e decretou pena de seis anos de prisão.

Cristina então era vice-presidente, e com isso se tornou a primeira ocupante desse cargo a ser condenada por corrupção enquanto o exercia. Desde antes disso, a peronista acusa o sistema de Justiça do país de praticar lawfare (uso da lei para fins políticos).

Do lado de fora do tribunal onde foi anunciada a decisão desta quarta-feira, o conhecido “Comodoro Py”, diversos militantes kirchneristas participavam de uma espécie de aula pública sobre esse tema.

O advogado Juan Grabois, figurinha carimbada em protestos, liderou o ato. A ex-deputada federal Manuela d’Ávila viajou do Brasil a Buenos Aires e também participou.

A decisão volta a chamar a atenção para Cristina por alguns fatores. Há poucos dias anunciou-se que ela presidirá o Partido Justicialista (PJ), componente de peso do emaranhado do peronismo. E disso veio um novo indicador: que ela não pretende largar a vida pública.

A Argentina terá eleições de meio de mandato em 2025 para renovar algumas cadeiras do Congresso. Os partidos, entre eles o do presidente Javier Milei, o Liberdade Avança, já se organizam em prol disso para tentar aumentar seu poder no Legislativo. E agora cogita-se que Cristina Kirchner poderia concorrer.

Cerca de uma hora após o anúncio judicial desta quarta-feira, Milei se pronunciou com mensagem nas redes sociais em que dizia “Todo llega”, algo como “tudo vem”, ou “tudo chega em seu momento”.

Cristina não irá presa, apenas quando se esgotarem todos os seus recursos (no caso, a Corte Suprema de Justiça). Por ter mais de 70 anos (está com 71), poderia pedir para cumprir a pena em casa.

Mas o peso simbólico da condenação ainda reside sob a figura da política que presidiu o país por dois mandatos (2007-2015) e depois foi vice de Alberto Fernández, com quem tinha uma relação muito desgastada, para dizer o mínimo, de 2019 a 2023.

Ela divulgou uma extensa carta nesta terça-feira (12) na qual dizia que não haveria surpresa na decisão, já que não há parcialidade dos juízes e que é alvo de uma perseguição da mídia e da Justiça.

Cristina não compareceu ao tribunal. Minutos antes da audiência, publicou vídeo no X como quem diz que não está prestando atenção no que está acontecendo ali. “A caminho de Moreno [cidade na província de Buenos Aires], onde vou ter uma atividade com 400 mulheres; nos vemos”, escreveu, ao lado de um emoji de coração, e saiu rapidamente.

Para chegar à decisão a Justiça analisou trocas de mensagens e a relação dos Kirchner com o empresário Lázaro Báez —também ele condenado à prisão, mas a uma pena de 12 anos de reclusão.

Mas um dos elementos mais fortes da investigação foi um decreto assinado em 2009, quando Cristina chefiava a Casa Rosada, e que foi visto como um facilitador para corrupção em obras rodoviárias ao desburocratizar a fiscalização do processo de concessões.

A defesa de Cristina afirmou que não havia parcialidade dos juízes mas também que o caso já teria sido julgado por tribunais de Santa Cruz e negado, de modo que não deveria novamente ser avaliado, desta vez em Buenos Aires pela Justiça nacional.

Cristina se compara a figuras como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso por 580 dias mas que depois teve suas condenações anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ela diz que ambos são (ou foram) perseguidos políticos.

“São casos que revelam uma trama de setores e interesses econômicos, geopolíticos e midiáticos que acusam e perseguem judicialmente a quem os desafia com um modelo político, econômico e social distinto ao do status quo”, escreveu em sua carta.

MAYARA PAIXÃO / Folhapress

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