Nunes planeja adotar gestão privada nas escolas municipais de São Paulo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), ensaia replicar o modelo de convênio para gestão privada feito em janeiro de 2023 com o Liceu Coração de Jesus para Emeis (Escolas Municipais de Educação Infantil), Emefs (Escolas Municipais de Ensino Fundamental) e Emefms (Escolas Municipais de Ensino Fundamental e Médio).

Atualmente, o município mantém convênios com a iniciativa privada apenas em creches —das 2.579 unidades, 2.220 têm gestões contratadas. A exceção nas demais etapas é o convênio com o Liceu.

Segundo o emedebista, a ideia ganhou força com a comparação entre as médias de notas da rede municipal e as do Liceu na Prova SP deste ano, avaliação realizada pela prefeitura com estudantes dos ensinos fundamental e médio e de educação de jovens e adultos.

De acordo com Nunes, a nota média de língua portuguesa para alunos do 2º ano da rede é 142,3, contra 152 dos estudantes da escola católica.

Em agosto de 2022, a direção do Liceu anunciou o fechamento do colégio, e o prefeito propôs abrir uma escola municipal no local para ser gerida pelos padres da instituição. O convênio, segundo ele, seria em caráter excepcional para garantir a continuidade do colégio que fica na região da cracolândia, no centro de São Paulo.

De acordo com a Secretaria Municipal da Educação, atualmente o Liceu atende 574 crianças, sendo 300 na educação infantil (pré-escola) e 274 no ensino fundamental 1, com repasse mensal de R$ 450.862,15 —na época da assinatura, o convênio chegou a ser questionado pela Procuradoria do Município de São Paulo.

“O resultado é excepcional do ponto de vista do aluno. A média do desenvolvimento escolar está muito acima da média de todas as outras escolas [da rede municipal]”, afirma Nunes.

O prefeito recebeu a reportagem da Folha em seu gabinete nesta quinta-feira (14) para uma entrevista sobre transporte público e trânsito, mas falou também dos planos de gestão privada na educação que sinaliza implantar no seu segundo mandato —a posse será em 1º de janeiro.

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PERGUNTA – O senhor tem planos de privatizar a educação municipal?

RICARDO NUNES – O que eu vou fazer é olhar os alunos. A educação tem que ser olhada para os alunos. Tenho um exemplo que fiz pela primeira vez, de um convênio, no caso do Liceu. O resultado é excepcional do ponto de vista do aluno. A média do desenvolvimento escolar está muito acima da média de todas as outras escolas [da rede municipal]. Então, é um sinal para a gente.

Em termos práticos é só olhar. A média [da nota na Prova SP] de língua portuguesa na rede municipal é 142 [2º ano]. No Liceu, é 152. Você prefere ter o seu filho nessa escola ou naquela escola? Essa é a pergunta.

É simples. O que eu vou fazer? Não vou ficar refém de corporativismo. Vou fazer aquilo que é bom dentro da legalidade.

P – O modelo vai ser o do Liceu?

RN – Fiquei muito impactado positivamente quando vi esse resultado. Uma vez que temos esse resultado, precisamos repensar e discutir com a rede, inclusive, o que é melhor para o aluno.

Temos escolas que estão trabalhando com um conceito ideológico enorme e o Ideb [Índice de Desenvolvimento de Educação Básica] é lá embaixo.

Do ponto de vista de base escolar, está tudo certo, temos uma rede ótima. Demos quase meio bilhão [de reais] de PTRF [Programa de Transferência de Recursos Financeiros] para as escolas. Um aumento de 44% na carreira inicial dos professores por inflação de índice. Temos vagas em creche para todas as crianças.

P – O convênio será com todas as escolas da rede?

RN – Não, porque não temos condições de fazer isso. Mas é algo que você e seus leitores precisam ponderar, são dados.

As pessoas mudam, é muito direito, pouco dever. Se a gente puder, com menor recurso, ter uma metodologia que vai ser melhor para os nossos alunos, por que não fazer? Por que pelo menos não tentar? Acho que a gente precisa fazer essas ações.

P – Começaria em escolas com pior desempenho?

RN – Não é uma opção a ser descartada, se a gente trabalhar com a visão de que precisa olhar o aluno.

P – Em termos práticos, como vai ser?

RN – Os professores e funcionários serão deles [conveniados]. Mas trabalharão com a nossa grade curricular, com nosso conteúdo, nossa diretriz pedagógica.

O uniforme e o material pedagógico continuam com a Prefeitura de São Paulo, que tem supervisão contínua [no caso do Liceu que deve ser replicado].

P – Os professores serão contratados pelos convênios?

RN – A entidade que a gente eventualmente conveniar, contrata.

P – Sobre transportes, o que levou o senhor a pedir um estudo para extinguir a SPTrans e transferir suas funções para a agência reguladora SP Regula?

RN – É um conceito de governar. Se pegar o exemplo do lixo [contratos da coleta foram passados para a agência reguladora], é concessão igual à do transporte. A Amlurb [Autoridade Municipal de Limpeza Urbana] tinha um monte de gente e de prédios para cuidar de contrato de concessão. Foi para a SP Regula e levamos algumas pessoas para lá. Quem não precisava, a gente demitiu. Os prédios estamos utilizando [em outros setores].

A SPTrans tem uma estrutura enorme, prédios em todos os lados. Vamos manter os funcionários que são fundamentais, mas com uma estrutura mais enxuta dentro da SP Regula.

Precisamos usar mais tecnologia e um número menor de pessoas. É preciso ter GPS nos ônibus e câmeras inteligentes nos terminais para controlar o fluxo, a quilometragem. Não adianta ter um monte de gente lá anotando. O estudo vai dizer se deve ou não extinguir.

P – Quando o senhor pediu o estudo para saber se é viável a extinção da SPTrans?

RN – Estamos concluindo o processo de análise da intervenção das duas empresas de ônibus [Transwolff e UPBus, suspeitas de envolvimento com o crime organizado], o que vai acontecer até dezembro. Terminando a notificação das duas, começamos a análise.

Paralelo a isso, foi baixada uma portaria para manter esse modelo de auditoria [feito a partir de ações do Ministério Público e da polícia nas duas empresas] com representantes da SPTrans, da Secretaria da Fazenda, da Procuradoria-Geral do Município e da Controladoria-Geral do Município nos 32 contratos de concessão. Serão auditorias de forma contínua.

P – Mas essa fiscalização não existia nas empresas?

RN – Tinha o controle da documentação contábil, uma coisa muito burocrática, mas não uma ação in loco, com essa característica de alguém da Fazenda com visão de auditor fiscal, da Controladoria com visão de transparência, de combate à corrupção, de procedimento. Não tinha ninguém da Procuradoria com a visão mais ampla do ponto de vista de legalidade. E da SPTrans com visão do dia a dia, do cotidiano do transporte.

P – Sobre corrupção, um relatório da SPTrans com dados do ano passado apontou que as principais queixas que chegaram ao comitê de conduta da empresa eram abuso de poder e assédio moral (9 reclamações cada), seguido por corrupção (6). Com a extinção da companhia o senhor acha que pode reduzir esses casos?

RN – Por isso fizemos concurso de controlador. Temos ampliado as ações preventivas para evitar casos de corrupção, de assédio moral e sexual.

P – Com a mudança na SPTrans será possível melhorar o sistema de ônibus, evitar sobreposições de linhas, por exemplo?

RN – A análise de sobreposição sempre é feita. O que é preciso fazer agora é uma readequação de linhas por causa do metrô.

Estamos desenvolvendo um software [previsto para ficar pronto até o ano que vem] que vai informar a quantidade de passageiros e o tempo de uma linha para outra. Por meio de inteligência artificial dará um estudo muito mais rápido e prático, sem possibilidade de erro. O sistema será mais aprimorado.

P – A tarifa de ônibus está congelada há quatro anos. O senhor já decidiu se vai reajustar?

RN – Gostaria de manter a tarifa congelada, mas não vou tirar dinheiro da saúde e da educação para colocar no transporte. A decisão será tomada em dezembro, quando recebemos as planilhas do custo.

P – Especialistas costumam dizer que São Paulo é uma cidade que privilegia mais o transporte individual que o coletivo. Se investe mais em obras, para abrir avenidas. Como o senhor avalia isso?

RN – O ônibus passa em rua, não vai pelo ar, não é um submarino. Lógico que tem que ter rua para ele poder andar.

O que eu tenho percebido nestes três anos e meio como prefeito é que tem muita gente falando sem embasamento nenhum.

Se um juiz tivesse ido lá na Pedreira [zona sul], um promotor, ia ficar parado na estrada do Alvarenga, porque é o único acesso. Porque o lado direito inteiro é represa, e do esquerdo são bairros altamente populosos, com muita densidade, com ruas estreitas. E aí quando eu vou alargar, o cara fala não, que vai prejudicar o meio ambiente. É quem nunca pôs o pé lá.

São 12 milhões de habitantes, 7 milhões de carros por dia. Como é que alguém pode falar que não tem que fazer obra viária? Não tem cabimento.

É preciso melhorar a nossa mobilidade na cidade, 64% da emissão de dióxido de carbono é proveniente dos carros que circulam em São Paulo. É preciso melhorar o sistema viário, diminuir o trânsito.

Estrutura da educação municipal de SP

– Creches – 2.579 (2.220 parceiras)

– Emefems – 573 (1 parceira – Liceu)

– Emeis – 564 (1 parceira – Liceu)

– Emefms – 8 diretas

– Mova – 286 parceiros

– 58 Ceus (12 parceiros)

FÁBIO PESCARINI / Folhapress

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