Filme lembra barão judeu, um dos grandes filantropos da história

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Alguns anos atrás, em uma conversa com o médico Isaac Matone, o produtor cultural e ator Léo Steinbruch se deu conta de que sabia muito pouco sobre o passado da sua família. “Fiquei impressionado com a minha ignorância.”

Membro da comunidade judaica de São Paulo, Steinbruch é amigo de infância de um dos filhos de Matone. Mas um outro elo os aproximava. Depois de enfrentar situações degradantes no império russo, os antepassados de ambos conseguiram vir para o Brasil no início do século 20 devido ao apoio financeiro e logístico do barão de Hirsch.

Matone morreu em 2021, mas se manteve como inspiração para o projeto que Steinbruch levou adiante. Mais do que conhecer a história da família, era preciso difundir a saga desses imigrantes que, graças a Hirsch, desembarcaram no Rio Grande do Sul. “Se eu sabia tão pouco sobre tudo isso, imagine meus quatro filhos”, diz o produtor.

Começava a nascer o documentário “Terras Prometidas – A Herança da Baronesa e do Barão de Hirsch”. Recém-concluído, o filme idealizado por Steinbruch e dirigido por Olindo Estevam tem a primeira exibição pública nesta segunda (18) em São Paulo.

Em seguida, o documentário ganha sessões especiais em cidades gaúchas como Porto Alegre, Santa Maria e Erechim, além de outras projeções na capital paulista.

É o próprio Steinbruch quem, na frente da câmera, conduz essa produção ao estilo road movie. Viaja pelo Brasil e pela Europa para encontrar pessoas e localidades que possam lembrar momentos da trajetória dos seus bisavós e de tantos outros judeus naquele mesmo contexto.

Põe o pé na estrada também para saber mais sobre o homem que viabilizou esse expressivo movimento migratório.

Judeu nascido em 1831 em Munique, na Alemanha, Maurice de Hirsch era banqueiro, como o pai. Expandiu, no entanto, os negócios da família, construindo e explorando estradas de ferro.

A ferrovia que liga Viena a Istambul foi um dos seus grandes empreendimentos. Para tirar esse projeto do papel, precisou se aproximar das autoridades otomanas, uma iniciativa que levou seus detratores antissemitas a chamá-lo de Turkenhirsch, como escreveu o jornalista Jaime Spitzcovsky.

Na segunda metade do século 19, o barão tinha uma das maiores fortunas da Europa. Era dinheiro a perder de vista, mas o que, de fato, eternizou a figura de Hirsch foi a filantropia, atividade em que sempre recebeu apoio de Clara Bischoffsheim, a baronesa.

A morte do único filho do casal, Lucien, aos 31 anos, impulsionou a dedicação deles às causas humanitárias.

Em Londres, em 1891, o barão fundou a Jewish Colonization Association (JCA), uma entidade dedicada especialmente a viabilizar a emigração de judeus do leste da Europa para territórios onde pudessem viver e trabalhar com alguma tranquilidade.

Na segunda metade do século 19 e nos primeiros anos do 20 na Bessarábia (onde hoje é a Moldova e partes da Ucrânia e da Romênia), “os judeus viviam em situação de extrema pobreza. E ainda assim eram perseguidos e massacrados”, lembra o rabino Ruben Sternschein em passagem do documentário. A violência antissemita era estimulada pelo czar Alexandre 3º e por seu sucessor, Nicolau 2º.

Eram obrigados a viver em áreas delimitadas, afastadas dos centros urbanos. “Para as mulheres judias, a única maneira de entrar nas cidades era com um cartão amarelo, que as identificava como prostitutas”, conta Ieda Gutfreind, doutora em história social, em outra cena do filme.

Boa parte desses judeus deixou a Bessarábia graças à JCA. Nas suas primeiras décadas de existência, a entidade de Hirsch era um modelo de planejamento global: enviava emissários para diversas partes do mundo a fim de identificar terras férteis e, feito esse mapeamento, comprava áreas em países como Estados Unidos, Canadá, Argentina e África do Sul para receber os judeus.

No Brasil, a primeira colônia agrícola adquirida pela JCA foi Philippson, na região de Santa Maria (RS), e depois Quatro Irmãos, perto de Erechim (também RS). Cerca de 1.700 famílias se instalaram inicialmente nessas duas localidades, onde foram construídas escolas, oficinas profissionalizantes e sinagogas. Em meio a tanta gente, estavam Abraão e Beille Steinbruch, os bisavós de Léo.

O idealizador do filme conta que se emocionou especialmente ao visitar o pequeno e bem conservado Cemitério Israelita de Philippson, onde Beille foi enterrada.

Ao lado de Steinbruch nesta e em outras viagens, estava Olindo Estevam, que já dirigiu filmes como “Anita”, de 2016. Em Paris, por exemplo, eles entrevistaram a historiadora Dominique Frischer, autora da biografia “Moisés das Américas – Vida e Obra do Barão Hirsch”.

Para Estevam, a etapa mais difícil no longo trabalho de realização de “Terras Prometidas” foi a reta final, quando ele concluía a montagem do filme. “Me senti afetado pela violência no Oriente Médio”, diz ele, referindo-se à guerra entre Israel e o Hamas. A saída encontrada pelo diretor foi acentuar o tom afetivo do documentário.

“Venho de uma formação católica, sabia pouco sobre a história dos judeus. A direção desse filme ampliou meus conhecimentos sobre o judaísmo, inclusive os seus fundamentos filosóficos”, afirma Estevam.

“Me considero mais um contador de histórias do que um cineasta. Gosto da ideia do documentário como uma forma de provocar as pessoas para que elas propaguem as histórias vistas no filme e outras histórias.”

E assim, de conversa em conversa, outros tantos saberão quem foi o barão Maurice de Hirsch, tido como um dos maiores filantropos da história.

TERRAS PROMETIDAS – A HERANÇA DA BARONESA E DO BARÃO DE HIRSCH

– Quando Dia 18 (segunda), às 20h, no Belas Artes, em São Paulo; no dia 26, às 20h, na Cinemateca Capitólio, em Porto Alegre; no dia 27, em Santa Maria (local a confirmar); mais datas em https://terrasprometidas.com.br/

– Classificação 12 anos

– Direção Olindo Estevam

– Idealização Léo Steinbruch

NAIEF HADDAD / Folhapress

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