Censo quilombola ajudou governo a identificar comunidades durante tragédia no Rio Grande do Sul

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Há pouco mais de um ano foram divulgados os dados do Censo quilombola. Pela primeira vez o país coletou e passou a analisar, oficialmente, as informações demográficas sobre essa parte da população brasileira. Exatos 16 meses depois, o que mudou nas políticas públicas nessa área?

Segundo o governo Lula, os dados do Censo Quilombola 2022 (divulgados somente no final de julho de 2023) estão sendo utilizados para mapear e entender melhor a distribuição e as necessidades das comunidades no Brasil.

As informações, de acordo com o Ministério da Igualdade Racial, ajudaram, por exemplo, na distribuição emergencial de alimentos e água potável para as comunidades quilombolas do Rio Grande do Sul durante a catástrofe climática que atingiu o estado neste ano.

A região sofreu com fortes chuvas e inundações. Diversos quilombos ficaram isolados ao longo da crise por conta de deslizamentos de terra e rodovias bloqueadas.

O Censo também possibilitou a indicação das comunidades localizadas no semiárido para o Programa Cisternas de construção de tecnologias sociais para o armazenamento de água para consumo e produção na região.

Outra iniciativa na qual o governo federal está utilizando os dados do Censo é um plano de ação para uma agenda nacional de titulação. O tema é um dos principais gargalos nas políticas públicas voltadas para essa fatia da população brasileira.

Um estudo feita pela organização Terra de Direitos em maio deste ano aponta que se o Estado brasileiro mantiver o atual ritmo de regularização serão necessários 2.708 anos para titular integralmente os processos abertos no Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). O levantamento levou em conta as mais de 1.850 ações que buscam a titulação de território.

Em 2023 e 2024, período do governo Lula, o Incra entregou títulos de território para 10 comunidades quilombolas. Vale lembrar que o órgão federal não é o único responsável por este processo -institutos de terra estaduais e municipais também podem titular territórios quilombolas.

Considerando os documentos emitidos por todos os órgãos, nas diferentes esferas públicas, 38 comunidades foram beneficiadas.

Entretanto, a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos) afirma que pouca coisa mudou. A entidade exalta a execução da pesquisa demográfica, mas diz que os dados ainda não se converteram em políticas públicas na velocidade que essa parte da população precisa.

“Desses 16 meses para cá, poucas coisas avançaram, na realidade, em programas para as comunidades quilombolas. E os programas que avançaram, em poucos momentos existiram consultas aos próprios quilombolas”, afirma Denildo Rodrigues de Moraes, coordenador-executivo da Conaq.

“Mesmo com todos esses dados nós vemos que o Estado brasileiro ainda está com grande dificuldade de atender nosso povo, de ter recurso financeiro e humano para dar conta dessa demanda.”

A organização afirma ainda que existem decretos aguardando a assinatura do governo do presidente Lula e que essas ações são fundamentais para garantir a segurança jurídica territorial e amenizar os conflitos.

“Estamos chegando ao segundo 20 de novembro deste governo. É certo que estamos vindo de um governo de descaso [gestão Bolsonaro], mas a velocidade em que aumentam os conflitos em nossos territórios não é a velocidade que o Estado responde. O Estado brasileiro ainda não nos deu essa resposta”, diz Denildo.

Apesar da cobrança, o governo federal aponta que os dados já estão ajudando a identificar e qualificar áreas que necessitam de melhorias em infraestrutura como saúde, educação e outros serviços públicos.

O Ministério da Igualdade Racial admite que a efetivação das políticas depende de um maior aporte de recursos e de uma maior articulação entre diferentes esferas de governo e organizações, incluindo a sociedade civil.

Dois programas tem sido as grandes apostas da pasta nessa área. Um é a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental. A ação busca construir planos locais de gestão territorial e ambiental, feitos pelas próprias comunidades. A política já teve a adesão de seis estados: Maranhão, Tocantins, Piauí, Bahia, Ceará e Paraná.

O outro é o Aquilomba Brasil. O programa tem um comitê gestor formado por dez ministérios e representação da sociedade civil. O intuito é monitorar demandas e ações transversais que incidam sobre a população quilombola.

Em setembro deste ano, o governo federal obteve uma vitória nessa área. O presidente Lula assinou um acordo entre as comunidades quilombolas de Alcântara (MA) e o Programa Espacial Brasileiro, em uma tentativa de por fim a um litígio que se arrasta há 44 anos na região.

Com o acordo, as comunidades quilombolas se comprometem a não apresentar questionamentos sobre a área ocupada pelo Centro de Lançamento de Alcântara. Já o Ministério da Defesa encerra a reivindicação de áreas que estão ocupadas pelas comunidades tradicionais e se compromete a não apresentar novos questionamentos sobre o território.

TAYGUARA RIBEIRO / Folhapress

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