SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um entusiasmo recente com a fotografia retrô, feita com câmeras analógicas e digitais antigas, ou inspiradas em modelos do passado, vem ajudando a aquecer negócios que já existiam e até motivando a abertura de novos estabelecimentos, como lojas de equipamentos e laboratórios de revelação de filmes.
A fotografia analógica perdeu a popularidade em meados dos anos 2000, quando a fotografia digital passou a ser acessível. Na década seguinte, os smartphones com câmeras embutidas, de qualidade crescente, dominaram a prática da fotografia para a população geral. Nesse período, a fotografia analógica quase desapareceu, ficando restrita a grupos muito pequenos que praticavam a técnica profissionalmente ou como hobby.
Até que veio a pandemia de Covid-19, apontada por empresários da área como o início da nova onda de fotografia analógica e retrô. Influenciadores de fotografia, que passaram a exibir câmeras analógicas ou digitais de estilo antigo nas redes sociais, colaboraram para o retorno a esse tipo de fazer fotos em um período no qual muitas pessoas estavam em casa procurando com o que se ocupar.
“Desde a pandemia há uma procura muito maior por câmeras analógicas, filmes e serviços de laboratórios para a revelação”, diz Erick Ferrufino, 42, fotógrafo e proprietário da Foto Retrô, loja de venda e revelação de filmes fotográficos.
Ferrufino conta que a loja surgiu há cerca de três anos na Galeria Sete de Abril, conjunto comercial no centro de São Paulo que reúne diversas lojas de materiais para fotografia, por uma demanda de outros empresários do local. Uma casa mais especializada em filmes e revelação poderia ajudar a impulsionar os demais negócios.
Desde a abertura, a Foto Retrô vem crescendo -no início, Ferrufino tinha a ajuda do pai, que vinha da Bolívia, seu país de origem, para auxiliar nos primeiros passos do negócio; agora, já conta com outros três funcionários, que contribuíram para aprimorar a eficiência e a qualidade dos processos de revelação dos filmes.
Na loja, os filmes custam, em média, R$ 100 (36 poses); a revelação custa a partir de R$ 45. Em 2022, a loja conseguia fazer cerca de 200 revelações por mês. Agora, segundo Ferrufino, são mais de 500 mensalmente.
“Começamos com muita pesquisa, tanto para fabricar os próprios químicos necessários no processo, quanto para melhorar os tempos gastos em cada etapa”, diz o empresário.
O público que procura os equipamentos e os serviços de revelação é variado, mas puxado pelos mais jovens, diz o professor Edison Angeloni, 53, atualmente responsável por dois cursos de fotografia analógica no Sesc Pompeia.
A idade desse grupo novato na fotografia retrô varia de 16 a 25 anos, em média, segundo Ferrufino.
“Temos o grupo de fotógrafos mais tradicionais, que sempre trabalharam com esse tipo de foto, mas há agora os mais jovens, que se interessam pela fotografia analógica como forma de arte”, diz Angeloni. “Há alguns que usam até comercialmente, oferecendo o registro analógico como um diferencial para fotografar um evento, por exemplo, em paralelo com o digital.”
Para o professor, outro fator que pode atrair mais pessoas à fotografia analógica é a limitação da quantidade de cliques disponíveis, o que pode ter efeito sobre a qualidade do registro. “Quando usamos o filme fotográfico, sabendo que temos uma restrição, escolhemos melhor as imagens que vamos fotografar, ficamos mais seletivos e com o olhar mais apurado”, diz.
Angeloni também é um dos sócios da Rebobina.Lab, loja online criada na pandemia que vende materiais para fotografia analógica, como os químicos usados para revelação de filmes preto e branco, e filmes rebobinados -películas novas inseridas em cartuchos reutilizados, prontos para serem usados novamente nas câmeras.
Estabelecimentos que estão no mercado há mais tempo também se beneficiam do novo interesse por fotografia com cara de antiga. É o caso da Focus Filme, loja que existe há 42 anos em uma galeria na avenida Brigadeiro Faria Lima, na zona oeste de São Paulo.
Ali, os filmes fotográficos chegaram a sair das prateleiras por um período e voltaram há cerca de dois anos, conta Ari Pedrosa, 49, dono da loja desde 1996. “Desde os anos 2000 diminuímos muito a compra de filme devido à demanda. Hoje, voltamos a ter em quantidades limitadas porque os clientes pediam”, diz.
O local tem diversos modelos de câmeras à venda, que vão desde câmeras digitais modernas, como as Fujifilm X-T30 e X-T50, com design retrô inspirado nas câmeras analógicas da marca de décadas atrás e preços acima de R$ 7.000, até câmeras digitais compactas mais simples, populares nos anos 2000, além de modelos analógicos, novos e usados.
De acordo com Pedrosa, algumas marcas como a Fujifilm e a Nikon, voltaram no tempo e buscaram o estilo retrô para permanecerem atraentes para o novo público. “As pessoas vêm para comprar a câmera que remete ao antigo e às câmeras de filme. Elas buscam reviver a relação que os pais ou os avós tinham com a fotografia”, diz Pedrosa.
O encarecimento dos filmes fotográficos nos últimos anos, causado por fatores como drástica diminuição no número de fábricas, aumento dos custos de produção e recente crescimento da demanda, é um dos desafios citados pelos empreendedores. Quase a totalidade do que é vendido no ramo, com exceção de poucos químicos, é importada, o que eleva ainda mais os preços dos produtos.
Mas o diagnóstico é uníssono: a descoberta da fotografia retrô pelas novas gerações está dando ao ramo um novo fôlego, que deve perdurar pelos próximos anos. “A fotografia é eterna e uma ferramenta única para reviver momentos. Mesmo com outros meios, como o vídeo, ela vai permanecer”, conclui Pedrosa.
EVERTON LOPES BATISTA / Folhapress