Procurador do TPI pede mandado de prisão contra líder militar de Mianmar

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O procurador do TPI (Tribunal Penal Internacional), Karim Khan, pediu, nesta quarta-feira (27), um mandado de prisão para o líder militar de Mianmar, Min Aung Hlaing, por supostos crimes contra a humanidade cometidos contra os rohingyas, minoria predominantemente muçulmana do sudeste asiático.

Agora, cabe à Câmara de Pré-Julgamento 1 da corte sediada em Haia, formada por três juízes, decidir se há “motivos razoáveis” para acreditar que o general tenha responsabilidade pelos crimes de deportação e perseguição dos rohingyas -acusação de Khan.

Não há um prazo definido para a decisão, mas os juízes geralmente demoram cerca de três meses para emitir um parecer sobre eventual mandado de prisão. À agência de notícias Reuters, a junta militar afirmou que não reconhece as declarações do TPI por não ser um membro da corte.

O tribunal apura, há cinco anos, supostos crimes de uma ofensiva militar de agosto de 2017 que teria provocado a fuga de um milhão de pessoas do país, a maioria em direção a Bangladesh. A ação é descrita pela ONU como um exemplo clássico de limpeza étnica.

Soldados, policiais e aldeões budistas são acusados por investigadores das Nações Unidas de destruir centenas de aldeias no remoto estado de Rakhine, torturando residentes enquanto fugiam e realizando assassinatos em massa e estupros coletivos.

Mianmar nega as acusações, dizendo que as forças de segurança estavam realizando operações legítimas contra combatentes que atacaram postos policiais. Khan, no entanto, afirma que os supostos crimes foram cometidos pelo Tatmadaw, as forças armadas da nação, com o apoio das polícias nacional e da fronteira, assim como por “cidadãos não rohingyas”.

A ação do promotor marcou um raro dia de celebração para os rohingyas, disse Tun Khin, presidente da Organização Rohingya Birmanesa no Reino Unido. “Finalmente demos mais um passo em direção à justiça e à responsabilização”, disse ele.

Zin Mar Aung, que ocupa o cargo simbólico de ministra das Relações Exteriores do governo exilado após o golpe de 2021, também celebrou a ação. “Ele deve ser totalmente responsabilizado por cada vida inocente que destruiu e pelas famílias que desfez”, afirmou em suas redes sociais.

O pedido por um mandado de prisão acontece em um momento em que o tribunal enfrenta reações de Washington por uma medida relacionada à guerra no Oriente Médio, na qual os Estados Unidos estão indiretamente envolvidos.

Há quase uma semana, o TPI emitiu um mandado de prisão contra o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, seu ex-ministro da Defesa, Yoav Gallant, e o comandante do Hamas Mohammed Deif, supostamente morto em um ataque aéreo de Tel Aviv de julho. Eles são acusados de crimes de guerra no contexto dos atentados do grupo terrorista contra Israel, em 7 de outubro, e a resposta militar do Estado judeu na Faixa de Gaza.

Em relação à mais recente ação, o gabinete do promotor disse em um comunicado que estava buscando o mandado após investigações extensas, independentes e imparciais. “Esta é a primeira solicitação de um mandado de prisão contra um alto funcionário do governo de Mianmar que meu escritório está apresentando. Mais seguirão”, afirmou o promotor em um comunicado.

Mianmar não é membro do TPI, mas, em decisões de 2018 e 2019, os juízes decidiram que o tribunal tinha jurisdição sobre supostos crimes que teriam ocorrido em Bangladesh -este sim um país membro da corte.

A apuração enfrenta diversos desafios. Além da falta de acesso à nação, Mianmar está em turbulência desde que os militares derrubaram um governo eleito liderado pela prêmio Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, em 2021.

O golpe desencadeou um movimento de resistência iniciado com protestos pacíficos que, posteriormente, evoluíram para uma rebelião armada em múltiplas frentes.

Os investigadores dizem ter se baseado em uma ampla variedade de evidências, incluindo documentos e materiais científicos, fotográficos e de vídeo autenticados.

“A decisão do promotor do TPI de buscar um mandado contra Min Aung Hlaing ocorre em meio a novas atrocidades contra civis rohingya que ecoam aquelas sofridas há sete anos”, disse Maria Elena Vignoli, conselheira de justiça internacional da Human Rights Watch. “A ação é um passo importante para quebrar o ciclo de abusos e impunidade que há muito tempo é um fator chave no fomento das violações em massa pelos militares.”

Desde 2002, quando foi criado, o TPI emitiu vários mandados de prisão para líderes nacionais em exercício. Na lista há, além de Netanyahu, os presidentes da Rússia, Vladimir Putin, e do Sudão, Omar al-Bashir. A consequência mais comum para os acusados, no entanto, costuma ser a restrição de viagens.

Sem força policial para efetuar prisões, o TPI depende da cooperação de seus países-membros -124 nações que assinaram e ratificaram o Estatuto de Roma, que criou a corte responsável por processar indivíduos por crimes de guerra, crimes contra a humanidade, genocídio e agressão.

Potências globais como EUA, Rússia, China e Índia não fazem parte do tribunal, que é, por outro lado, apoiado por toda a União Europeia e por países como Austrália, Canadá, Reino Unido, Japão e dezenas de países africanos e latino-americanos, incluindo o Brasil.

Até agora, apenas um chefe de Estado em exercício, Uhuru Kenyatta, do Quênia, compareceu ao tribunal para enfrentar as acusações. Ele foi acusado antes de ser eleito presidente, em 2013, mas seu caso foi posteriormente arquivado.

Redação / Folhapress

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