Com passado fabril e de ocupações, ‘Ermelindo’ agora verticaliza furiosamente

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – No samba “Vide, verso, meu endereço”, o narrador criado por Adoniran Barbosa escreve uma carta a um credor, o doutor José, para dizer que comprou uma casinha no “Ermelindo” -palavra que rima, no mesmo verso, com “três filhos lindos”; “dois meus, um de criação”.

Muita gente tem comprado imóveis no Ermelindo, ou melhor, em Ermelino Matarazzo, distrito da zona leste de São Paulo, limitado pelo rio Tietê e pela rodovia Ayrton Senna e que leva o nome do primogênito de vida breve do industrial paulista Francisco Matarazzo.

Segundo dados do Secovi, o distrito foi responsável por 53% dos lançamentos nos últimos 12 meses naquela subseção da zona leste, seguido de longe pela Penha e pela Vila Matilde. Para a startup imobiliária Loft, o crescimento de vendas de imóveis no distrito entre 2024 e 2023 (comparação entre janeiro a julho) foi de 38,1%.

Marcas como a Vivaz, do grupo Cyrela, edificam por ali projetos como o Vivaz Ermelino, cujas unidades têm de 24 m² a 35 m², com um e dois dormitórios, respectivamente. Na área comum, inclui amenidades como pet place, pequena academia e redário.

João Quinta, gerente sênior da Vivaz, vê na região uma mistura única de moradia e trabalho. “Diferente de bairros vizinhos, o histórico de autoconstrução e diversidade social trouxe uma identidade particular a Ermelino, que hoje combina infraestrutura local e opções de lazer com fácil acesso.”

O distrito experimentou uma valorização reputacional com a chegada do campus Leste da USP, em 2005. Outro vetor de valorização são, como em muitos lugares da cidade, os eixos de transporte. No caso, a linha Safira da CPTM, que em Ermelino tem duas estações, conectando o bairro ao Brás.

A estação Ermelino Matarazzo tem esse nome porque quando começou a operar, na década de 1930, passava por terras dos Matarazzo, que instalariam no começo dos anos 1940 uma indústria de papel celofane ali. Uma vila operária também foi erguida para acomodar parte dos trabalhadores. A história do bairro também está entrelaçada com a de outra fábrica, de vidros, da Cisper. Seu entorno ficou conhecido como Vila Cisper.

Posteriormente, ocupações de terrenos ociosos marcaram Ermelino, e a igreja católica foi protagonista na organização dos movimentos de moradia.

Talvez não fosse assim se para ali não rumasse Antônio Marchioni, o padre Ticão, pároco da igreja São Francisco de Assis e liderança pastoral desde os anos 1980 até pelo menos janeiro de 2021, quando morreu.

Padre Ticão foi determinante para trazer a USP para o bairro, era incansável lutador por mais áreas verdes e equipamentos públicos para a periferia e, nos últimos anos, foi importante difusor das propriedades terapêuticas da cannabis. Para o hoje ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira (PT), o padre era o “maior ativista da cannabis medicinal do Brasil”.

Na ferramenta publicada por esta Folha na edição do último aniversário de São Paulo, Ermelino aparece com 38% de residências e grande área de vegetação (29%), por conta do Parque Ecológico do Tietê, às margens do rio. As indústrias foram migrando, mas ainda respondem por 11% da área do distrito. Os dados da ferramenta são do Cadastro de Contribuintes Mobiliários da prefeitura.

No levantamento do índice de desenvolvimento humano (IDH) dos distritos paulistanos feito já há 14 anos, Ermelino crava 0,77, uma marca apreciável para o fundão da ZL, mas inferior a regiões próximas, como Penha, Aricanduva e Vila Formosa.

PAULO VIEIRA / Folhapress

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