Por sermos negros, eles nos veem como marginais, diz homem agredido por PMs em Ribeirão Preto

Kauan, que é negro, foi agredido com socos e chutes por policiais militares durante uma abordagem em Ribeirão Preto, na noite de 30 de novembro

Jovem durante abordagem | Foto: Rede social

“Somente faria o pedido para termos um tratamento melhor da parte da lei. Às vezes por sermos de cor, eles nos veem como marginal”, essa seria a frase que o ajudante de serviços gerais Kauan Oliveira, 21, diria para o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) se tivesse a chance de se encontrar com ele.

Kauan, que é negro, foi agredido com socos e chutes por policiais militares durante uma abordagem em Ribeirão Preto, na noite de 30 de novembro.

Um vídeo registrou as agressões feitas por dois agentes. Outros dois policiais assistiram sem reagir.

Kauan disse à reportagem que os PMs chegaram ao local e pediram para um grupo que estava na rua entrar em casa. Segundo ele, os agentes ordenaram que ele sentasse na calçada. Depois, mandaram ele levantar e pegar o celular que estava no chão. Foi nesse momento que começaram as agressões.

“Abaixado recebi um tapa de cima para baixo. Em seguida dois chutes no rosto de um outro agente. Na mesma hora fiquei meio tonto e me levantei. Perguntei ao que me deu o primeiro tapa por que estava me agredindo. Falei que não tinha medo de ninguém. Na mesma hora já recebi outro tapa no rosto, seguido de chutes do mesmo [policial]”, disse a vítima.

Há três anos ele sofreu um acidente ao pular em uma piscina, com diversas fraturas no crânio. Por isso, correu ainda mais riscos devido ás agressões na cabeça “Hoje tem uma cicatriz no local [da queda na piscina] e tenho tido insônia e dores de cabeça fortes depois do ocorrido. Faço acompanhamento devido ao acidente e não podia receber nenhum tipo de pancada na cabeça”.

Evangélico, ele credita à religião ter sobrevivido ao acidente na piscina. “Com a queda meu crânio se quebrou em mais de 60 pedaços, fiquei dois dias desacordado no hospital. Estou vivo por Deus. Minha visão do lado esquerdo enxergo tudo escuro, vejo bem pouco também”.

Kauan disse que após a repercussão das agressões, foi chamado para prestar depoimento e realizar exame de corpo de delito. Ele relatou o ocorrido para a Corregedoria da Polícia Militar.

Em nota, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) disse que os agentes envolvidos no caso foram identificados e afastados do serviço operacional. Um inquérito foi aberto para apurar a ocorrência. “A corporação reitera seu compromisso com a legalidade, transparência e respeito aos direitos humanos fundamentais, punindo os que infringem a lei e desobedecem aos protocolos estabelecidos”.

O presidente da comissão de direitos humanos da OAB de Ribeirão Preto, Douglas Marques, disse ver com preocupação o episódio. “É algo que não nos surpreende. Primeiro porque isso vai ao encontro, isso materializa as inúmeras denúncias de violência institucional praticada tanto pela Polícia Militar quanto pela guarda municipal que recebemos durante o ano. E segundo que isso faz parte do aumento da violência policial em todo o estado e em Ribeirão não seria diferente”.

O caso é mais um de violência policial registrado por câmeras nas últimas semanas no estado. Antes, um estudante de medicina foi morto com um tiro disparado por um PM dentro de um hotel na Vila Mariana, na zona sul de São Paulo. Na mesma região da cidade, um homem foi morto com 11 tiros pelas costas dados por um PM de folga ao furtar produtos de limpeza de um mercado. Imagens gravadas por uma testemunha mostraram um PM jogando um homem em um córrego na capital.

“Embora a PM tenha comunicado o afastamento dos policiais envolvidos eu considero que a medida é insuficiente, que o problema na verdade está na formação dos policiais, pois não adianta afastar dois ou três policiais envolvidos em ocorrência de violência e ao fim do ano formar e colocar nas ruas 2.000 com essa mesma mentalidade, para que tenham essa mesma conduta praticando essas atrocidades que estamos vendo”, acrescentou Marques.

PAULO EDUARDO DIAS / Folhapress

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