Acesso à internet é o de menos na sobrevivência de lan house

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Na entrada apertada da Espaçonet, no mezanino de um prédio comercial do centro de São Paulo, Paulo César Biffe começa a enumerar os serviços oferecidos pelo seu comércio. Até o momento em que decide parar com aquilo.

“Olha, é mais fácil você me perguntar o que a gente não faz”, conclui.

Deveria ser fácil. A Espaçonet é uma lan house. Oferece acesso à internet nos computadores dispostos em bancadas separadas por pequenas baias. Era a especialidade da casa quando foi aberta, em 2007.

Hoje ela sobrevive com os donos (Paulo e o irmão, Emerson Biffe) se perguntando o que podem fazer a mais. E estão em atividade no fim de 2024 por causa dessa percepção.

“Nosso faturamento com o acesso à internet é menos de 50%. Quando inauguramos, era 100%.”

É o mesmo cenário apontado por outros dois comerciantes do setor que falaram com a reportagem, mas não quiseram ter o nome do seus estabelecimentos divulgados. A lan house, que nasceu para ser um centro comercial tecnológico, foi atropelada pela tecnologia.

O processo é semelhante ao que aconteceu com as bancas de jornal, que diversificaram as vendas em busca de faturamento.

Há lan houses que obtêm recursos com plastificação de documentos, recargas de telefone celular e bilhete único, por exemplo.

São serviços que os irmãos Biffe não fazem. Não porque não querem, mas por não compensar. A margem de lucro é muito pequena, afirmam.

A conta para eles fechou mais um ano porque se abriram para novos mercados. Como o centro é região frequentada por imigrantes africanos, passaram a preencher pedidos de naturalização. São R$ 150 cada um.

Os desempregados não necessitam de currículos? Eles os elaboram por R$ 20. Há preocupação com o escore do Serasa e é preciso consultar? R$ 20.

Contrato de locação de imóvel? Há lan houses que têm um modelo pronto para ser preenchido.

“Eu fiz curso de contabilidade só para poder oferecer o serviço de declaração do Imposto de Renda”, diz Paulo César, ressaltando não ser faculdade.

Os casos mais complicados eles repassam para parentes ou conhecidos em troca de uma comissão para engordar o caixa.

“Temos parceiros para o que for mais complexo. Apareceu um empresário querendo fazer uma declaração de IR em que tinha movimentado R$ 4 milhões. Passei para o meu cunhado, que é contador.”

E a internet?

“Vimos que precisávamos nos reinventar porque não poderíamos nos manter apenas com internet. Agora estamos abrindo MEI [Microempreendedor Individual] também. Não se tiver de abrir CNPJ, essas coisas. Mas MEI dá para fazer”, explica.

Há momentos em que existe bom movimento nos computadores. Segundo os comerciantes ouvidos, é preferencialmente nos horários próximos ao almoço. Já foi muito melhor, confessam.

Em 2008, por exemplo, quase a metade dos brasileiros (47,5%) acessava a internet por meio de uma lan house. Era o segundo meio mais comum de entrar na rede, atrás apenas dos computadores domésticos. Em 2010, a estimativa do setor é que havia 100 mil casas do tipo em operação no Brasil.

Não há um número confiável de quantas estão abertas hoje em dia.

Dados da pesquisa TIC Domicílios de 2024, realizada pelo Cetic.br (Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade de Informação) e pelo Nic.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR), dizem que, atualmente, 98% das pessoas acessam a rede de casa e apenas 7% declararam frequentar lan houses.

Em 2008, 18% das residências no país tinham internet. O número agora é de 83%. São 88% os que se conectam pelo telefone celular e 60% declararam usar apenas esse meio para navegar.

Mesmo assim, o primeiro cartaz que quem entra na Espaçonet vê tem o aviso: uma hora de internet custa R$ 5. Meia hora, R$ 2,50.

Isso é mais barato do que fazer uma recarga por pacote de dados em um celular pré-pago, geralmente usado por pessoas de menor renda.

Outros comerciantes afirmam que, se o cliente disser não ter todo o dinheiro para usar os 60 minutos do computador, liberam o uso mesmo assim se o movimento estiver ruim. Melhor receber alguma coisa do que ficar de mãos abanando.

Durante a pandemia da Covid-19, Paulo César Biffe viu muitos concorrentes falir. Foi mais um fator que dificultou muito o mercado, opina. Ainda mais lan houses como a dele, que ficam no térreo ou no mezanino de prédios. Quando foi decretado o lockdown, esses espaços foram considerados shopping centers e tiveram de fechar totalmente por oito meses.

Quase foi o fim. Quando reabriram, viram que havia uma demanda represada de clientes.

“Recebemos pedidos via WhatsApp. Temos clientes de Minas Gerais e Rio de Janeiro. Nisso, o Pix ajudou muito”, afirma. “Por isso sobrevivemos a mais um ano. Buscamos atualização com o que está acontecendo para não ficar para trás.”

ALEX SABINO / Folhapress

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