Inflação fecha 2024 em 4,83%, estoura teto da meta e reforça pressão para 2025

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), fechou o acumulado de 2024 em 4,83%, apontou nesta sexta-feira (10) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A alta veio após variação de 4,62% em 2023.

O resultado de 2024 confirma o estouro do teto da meta de inflação, definido em 4,5%. Assim, o novo presidente do BC (Banco Central), Gabriel Galípolo, terá de escrever uma carta aberta ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

O documento deve explicar os motivos que levaram ao descumprimento do alvo, que tinha centro de 3% e intervalo de tolerância de 1,5% (piso) a 4,5% (teto).

Galípolo será o autor da oitava carta desde a adoção do sistema de metas, em 1999. O seu antecessor, Roberto Campos Neto, escreveu duas.

Analistas afirmam que a preocupação com o IPCA segue em 2025. Isso porque a inflação passada baliza reajustes de preços no ano posterior, incluindo aluguéis e mensalidades escolares. É a chamada inércia inflacionária.

O alerta para este ano também ganhou força com a escalada do dólar, que pode influenciar diferentes produtos, de alimentos a combustíveis.

“A taxa de juros vai ter de subir com força, não tem jeito, e aí começa uma preocupação maior com a atividade econômica até para 2026. O crescimento [do PIB] tende a ser mais fraco com esse cenário de juros em um ano eleitoral”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB associados.

“É o dilema do governo agora. Ele precisa desacelerar a economia para conter a inflação ao mesmo tempo em que está chegando um ciclo eleitoral e ele [governo] precisa manter o crescimento”, acrescenta.

O IPCA de 2024 (4,83%) veio praticamente em linha com a mediana das projeções do mercado financeiro, que era de 4,84%, segundo a agência Bloomberg. O intervalo das estimativas ia de 4,70% a 4,91%.

Em 2023, o primeiro ano do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a inflação havia fechado abaixo do teto da meta, que era de 4,75%.

O resultado registrado à época (4,62%) veio após dois anos consecutivos de estouro do objetivo, em 2022 (5,79%) e 2021 (10,06%), durante o governo Jair Bolsonaro (PL).

“De maneira geral, houve uma piora na composição do IPCA de 2024 em relação a 2023”, diz o economista Heliezer Jacob, do C6 Bank.

“O cenário seguirá desafiador em 2025: o mercado de trabalho aquecido e a perspectiva de câmbio depreciado pressionarão ainda mais a inflação. Nossa projeção é de que o IPCA feche o ano em 5,7%, novamente acima do limite superior da meta”, completa.

ÍNDICE ACELERA EM DEZEMBRO

No recorte mensal, a inflação acelerou a 0,52% em dezembro de 2024, apontou o IBGE. A taxa havia sido de 0,39% em novembro.

Analistas esperavam IPCA de 0,53% para o último mês do ano passado, conforme a mediana de pesquisa da Bloomberg. O intervalo das estimativas ia de 0,42% a 0,60%.

À exceção de habitação (-0,56%), os outros oito grupos de produtos e serviços tiveram alta de preços em dezembro. A maior variação (1,18%) e o principal impacto (0,25 ponto percentual) vieram de alimentação e bebidas.

Outro destaque foi o índice de difusão. O indicador subiu de 58% em novembro para 69% em dezembro, o maior nível desde maio de 2022 (72%).

Trata-se do percentual de produtos e serviços pesquisados que mostraram aumento de preços. Em outras palavras, o novo resultado indica que a inflação ficou mais espalhada no último mês.

ALIMENTOS PRESSIONAM EM 2024

A carestia dos alimentos também puxou o IPCA no acumulado de 2024. O grupo alimentação e bebidas registrou alta de 7,69% no ano passado, a maior desde 2022 (11,64%). Assim, contribuiu com 1,63 ponto percentual para o resultado de 2024.

As elevações acumuladas por saúde e cuidados pessoais (6,09%) e transportes (3,30%) também tiveram impactos significativos (0,81 ponto percentual e 0,69 ponto percentual). Juntos, os três grupos responderam por cerca de 65% da inflação de 2024.

No caso da comida, os preços ficaram mais altos em meio a problemas climáticos que reduziram a oferta de parte das mercadorias, segundo o IBGE.

O dólar teria gerado impacto adicional. A moeda americana em elevação estimulou exportações de itens como carnes, provocando reflexos na oferta interna.

Analistas também citam a demanda aquecida com a melhora do mercado de trabalho como um dos fatores responsáveis pela pressão nos preços.

Dentro de alimentação e bebidas, a alimentação no domicílio fechou 2024 com inflação de 8,23%, após baixa (deflação) de 0,52% em 2023.

O café moído saltou 39,6% no ano passado. Foi a maior variação para um ano fechado desde 2021 (50,24%).

As carnes, por sua vez, aumentaram 20,84%. Foi a maior alta até dezembro desde 2019 (32,4%).

O pesquisador André Almeida, do IBGE, destacou que a carestia das carnes ficou concentrada no segundo semestre de 2024, após trégua na primeira metade do ano.

“Teve estiagem, ondas de calor, seca. Isso intensificou os efeitos da entressafra [na pecuária]. As pastagens ficaram ainda mais restritas”, disse.

“Por conta até do próprio ciclo da pecuária, a gente teve menor volume de animais para abate, o que reduz a oferta do produto para o consumidor final e acaba pressionando os preços”, completou.

Em termos individuais, a gasolina teve o maior impacto no IPCA de 2024 (0,48 ponto percentual). A alta do combustível foi de 9,71%.

Em seguida, vieram o plano de saúde (7,87% e 0,31 ponto percentual) e a refeição fora do domicílio (5,7% e 0,20 ponto percentual).

MUDANÇA NA META

Para o IPCA de 2025, as projeções do mercado estão em 4,99%, conforme a mediana do boletim Focus mais recente, divulgado pelo BC na segunda (6).

O centro da meta de inflação segue em 3% neste ano, com intervalo de tolerância de tolerância de 1,5% (piso) a 4,5% (teto).

Há, porém, uma mudança: o BC passa a perseguir o objetivo de forma contínua. Isso significa que o chamado ano-calendário, de janeiro a dezembro, será abandonado após 2024.

No modelo contínuo, a partir deste ano, a meta será considerada descumprida quando a variação do IPCA em 12 meses ficar por seis meses seguidos fora do intervalo de tolerância (1,5% a 4,5%). O índice está acima do teto desde outubro.

O sistema de metas funciona como âncora para a condução da política monetária do BC. Com o aumento das expectativas de inflação, a instituição passou a subir a taxa básica de juros, a Selic, que está em 12,25% ao ano.

A medida busca esfriar a demanda por bens e serviços e, assim, reduzir a pressão sobre os preços. Analistas esperam Selic de 15% ao final de 2025, de acordo com o Focus.

O possível efeito colateral do aperto monetário é a desaceleração da atividade econômica. Os juros elevados dificultam o consumo e os investimentos produtivos.

LEONARDO VIECELI / Folhapress

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