SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – No ano passado, um total de 43,6 milhões de passageiros passaram pelo Aeroporto Internacional de Guarulhos. O número marca um recorde histórico para o terminal, justamente quando ele completa 40 anos de existência, na próxima segunda-feira (20).
Quando foi inaugurado, atendeu a uma demanda da Grande São Paulo por pistas longas, que pudessem receber os grandes jatos, novidades da época. Ao longo desse tempo, o aeroporto cresceu, tornou-se o principal do país, foi concedido à iniciativa privada e se modernizou, mas chega às quatro décadas de operação entre recordes e casos de polícia.
Após anos de atrasos, deve ser inaugurado nos próximos meses o aeromóvel, que vai enfim ligar (ainda que de maneira improvisada) os terminais à rede de transportes da região metropolitana.
As queixas em relação à demora nas obras desse meio de transporte se somam a outras reclamações. No ano passado, foi avaliado pela Agência Nacional de Aviação Civil como o pior do país entre os privatizados. Isso sem contar o fato de ter sido palco de uma execução recente em plena luz do dia.
O episódio não foi o único a ganhar as páginas dos jornais. Foi ali também que as malas de duas brasileiras foram trocadas por outras carregadas de drogas, o que as levou à prisão na Alemanha.
Hoje, o aeroporto se debruça em mais um problema: os golpes dos falsos motoristas de aplicativos, que enganam passageiros.
Enquanto isso, as salas VIPs foram se ampliando. No novo terminal do BTG Pactual, criado no ano passado, quem topa desembolsar pelo menos US$ 600 (cerca de R$ 3,6 mil) pode embarcar sem ter de lidar com o entorno.
A própria criação do aeroporto foi envolvida em controvérsias. Foram anos de discussões para definir a localização do local que o abrigaria. Guarulhos acabou sendo a opção mais viável economicamente, mas foi uma escolha criticada por causa dos nevoeiros constantes na região. Sua inauguração se deu com o pouso de um Boeing 747 da Varig, vindo de Nova York, em 20 de janeiro de 1985.
Nos anos 1990, um segundo terminal e uma segunda pista mais que dobrou a sua capacidade, atraindo boa parte dos voos internacionais do Galeão, no Rio. Em 2012, foi concedido à iniciativa privada pelo período de 20 anos. Dois anos depois, a tempo dos jogos da Copa do Mundo, foi inaugurado o seu terminal 3.
Hoje, 34 companhias oferecem voos para 52 destinos nacionais e outros 54 internacionais. São quase 800 pousos e decolagens por dia -em média, um movimento a cada 90 segundos.
“Há companhias e aviões que, no Brasil, só operam aqui”, afirma a controladora de tráfego aéreo Ingrid Fini, 47. Ela diz que sonhava em trabalhar em Guarulhos desde criança, quando seu pai a levava para ver aviões por ali.
“Qualquer distração pode levar a um acidente”, diz ela, no intervalo do trabalho, enquanto recebe a reportagem para uma visita à torre de controle. Minutos depois, uma pipa perto de uma das pistas paralisou as operações por alguns minutos e, logo em seguida, um avião que acabara de decolar perderia um motor e teria de retornar ao aeroporto em um pouso de emergência.
“Um fechamento de pista para situações como essas, ainda que por poucos minutos, pode impactar as malhas das companhias aéreas por três, quatro dias”, afirma Marilisa Mira, 50, que coordena a equipe de controladores de tráfego do aeroporto. É um time que se reveza em turnos de seis horas, com um limite de duas horas contínuas antes de cada intervalo, que é obrigatório.
Em 2024, ela participou de um grupo de trabalho que, inspirado no aeroporto de San Francisco (famoso por suas pistas paralelas onde os aviões pousam e decolam em sincronia), e desenvolveu um novo procedimento que permite que ambas as pistas de Guarulhos, também paralelas, possam operar de maneira quase independente -ainda que o espaço entre elas seja pequeno.
Usar as duas pistas assim era inimaginável no final dos anos 1980, quando o controlador Alexandre de Simone, 65, começou a trabalhar na torre de Guarulhos. Hoje com 38 anos de casa, ele é o decano da turma e narra até mesmo episódios tensos com a tranquilidade de quem parece já ter visto de tudo -como quando ajudou um avião com problemas no trem de pouso a pousar em segurança.
No terminal de passageiros, Regina da Costa, 62, estava em Guarulhos no dia em que o corpo de Ayrton Senna retornou ao Brasil, em 1994. Gina, como é conhecida, diz que não houve momento mais comovente do que aquele.
“O piloto do avião se recusou a embarcar o caixão no porão. O caixão viajou na cabine, em um assento de primeira classe afastado dos demais passageiros”, lembra ela, destacando que as regras atuais jamais permitiriam tal atitude.
Gina hoje gerencia salas VIP ali. “Uma vez precisei pedir que um famoso apresentador se retirasse, porque nem ele nem os acompanhantes tinham direito”, lembra. “É só mais um dia no aeroporto.”
GABRIEL JUSTO / Folhapress