Rússia critica proposta de Trump para cessar-fogo na Ucrânia

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Na primeira manifestação oficial acerca do mérito da proposta americana de trégua de 30 dias aceita pela Ucrânia, um negociador do Kremlin disse que ela apenas dará um respiro para as forças de Kiev se reagruparem contra a Rússia.

A definição foi dada à TV estatal russa por Iuri Uchakov, um alto assessor de Vladimir Putin nesta quinta (13). Na véspera, ele conversou com o consultor de Segurança Nacional de Donald Trurmp, Mike Waltz, por telefone. A Rússia já havia dito antes que só aceitaria discutir uma paz permanente.

“O que [a trégua temporária] dá para nós? Não nos dá nada. Só dá aos ucranianos a oportunidade de se reagrupar, ganhar força e continuar a mesma coisa”, disse. “Me parece que ninguém precisa de passos que apenas imitem ações pacíficas nessa situação.”

Com isso, a Rússia deu a senha de sua posição mais dura no início das conversas sobre os termos do cessar-fogo proposto pelos EUA para tentar negociar um fim do conflito iniciado por Putin em 2022. O presidente russo deve falar com o colega americano, mas não nesta quinta (13) como especulado inicialmente.

Já o principal negociador de Trump, o enviado ao Oriente Médio Steven Witkoff, chegou a Moscou nesta quinta e, segundo a mídia russa, deve conversar com Putin. “O presidente pode ter um telefonema internacional mais tarde”, disse o porta-voz do Kremlin, Peskov, sem confirmar o óbvio interlocutor do outro lado da linha, Trump.

Como a Folha relatou, a proposta foi recebida com ceticismo em Moscou, que busca maximizar seu potencial de ganho e não gostou da concessão feita por Trump de reativar a ajuda militar a Kiev por ter aceito a trégua de 30 dias.

Também incomoda os russos o fato de não haver um plano concreto, apenas uma ideia de pausa para discutir tais arranjos. O que foi especulado até aqui é mínimo: trocas de prisioneiros, que já ocorrem regularmente, por exemplo.

Já os pedidos imediatos atribuídos na imprensa ucraniana à equipe de Volodimir Zelenski incluem até a volta das milhares de crianças retiradas de áreas ocupadas na Ucrânia para a Rússia, algo que Moscou diz ter sido humanitário e o Tribunal Penal Internacional, um crime de Putin. Parece improvável um avanço aí.

Waltz e Uchakov já estiveram frente à frente em Riad, na Arábia Saudita, há duas semanas, integrando as delegações que iniciaram as conversas promovidas por Trump para tentar acabar com a guerra.

O vaivém desconcertante do americano, que alienou Zelenski ao chamá-lo de ditador e o expulsou da Casa Branca, preocupa Moscou. Como disse um conhecedor dos meandros das negociações à reportagem, ninguém sabe exatamente o que os EUA prometeram a Kiev na reunião da terça (11) em Jeddah, também na Arábia Saudita.

A lista de itens complexos para uma futura negociação é enorme: concessões territoriais de Kiev, garantias de segurança de lado a lado, o status das regiões anexadas por Putin, reparações econômicas, populações deslocadas.

Comentando eventuais negociações, a porta-voz da chancelaria, Maria Zakharova, reiterou que a Rússia não aceitará forças ou bases estrangeiras em solo ucraniano, como já sugeriram líderes europeus e Trump.

Além disso, Putin quer capitalizar o bom momento em que, além de avançar no leste ucraniano, parece estar perto de limpar uma incômoda mancha no seu currículo: a de ter visto forças estrangeiras tomarem solo russo pela primeira vez em mais de 80 anos.

Foi o que Zelenski fez a partir de agosto na região meridional de Kursk, onde abocanhou um território aproximadamente do tamanho da cidade do Rio. Agora, os russos estão em processo de expulsar os adversários, que já admitiram recuos táticos para salvar tropas na quarta.

Nesta quinta, o Ministério da Defesa em Moscou disse ter retomado de vez Sudja, onde seus soldados já estavam. A cidade é a base das forças de Zelenski em Kiev, a principal e mais estruturada a ter sido ocupada na breve invasão.

A aparente retirada final dos ucranianos é péssima para Zelenski, pois lhe tira uma carta na mesa de negociação. Alguns analistas russos, contudo, estão intrigados pela aparente calma e rapidez no processo, sugerindo que possa ser algo combinado com os EUA.

Putin chegou a ir para perto da linha de frente na quarta, algo que não havia feito. Estava vestido com uniforme militar camuflado, algo bastante raro. “Ele achou que era necessário”, foi o comentário lacônico de Peskov ao ser questionado sobre a intenção do presidente.

O russo quis projetar uma imagem de líder em guerra —nada diferente do emprego de roupas imitando uniformes de Zelenski, que viraram uma marca registrada e até foram objeto de debate entre ele e um repórter trumpista que o questionou na Casa Branca por que ele não usava um terno.

A diferença é que Putin usa uniforme no momento em que Trump diz que “a bola está com a Rússia” na negociação. Para o público interno, é preciso vender um momento vitorioso. Para o externo, poder e controles.

Enquanto isso, segue a troca intensa de fogo aéreo de lado a lado. Os ucranianos disseram ter abatido 74 de 117 drones russos ao longo da noite, enquanto Moscou relatou ter atingido 77 aparelhos do mesmo tipo sobre seu território, sem especificar a quantidade total.

IGOR GIELOW / Folhapress

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