A pergunta sobre quanto tempo dura a imunidade do novo coronavírus (SARS-CoV-2) segue intrigando cientistas de todo o mundo. Em junho, um estudo chinês apontava que os anticorpos para a COVID-19 poderiam durar por apenas dois ou três meses após a infecção, especialmente entre os assintomáticos. Agora, um outro estudo, desenvolvido em Singapura, revela que a imunidade ao vírus pode ser maior que a prevista inicialmente.
Publicado na revista científica Nature, o estudo foi desenvolvido a partir de uma parceira entre cinco institutos de Singapura e sugere que a infecção e a exposição aos coronavírus induzem a produção de células T — tipo de célula específica do sistema imunológico — mais duradouras, o que pode impactar tanto os rumos da pandemia e até mesmo o desenvolvimento de vacinas contra a COVID-19.
Como funciona o sistema imunológico
Para proteger o organismo humano contra invasores, o sistema imunológico conta com uma eficiente rede de diferentes células tanto para rastrear quanto para atacar os patógenos. Por exemplo, as primeiras células a serem ativadas são os macrófagos, que capturam “substâncias estranhas” no interior do organismo e alertam o sistema sobre a possível invasão.
Após esse primeiro contato, dois tipos de glóbulos brancos, as células T e B, começam a operar contra os invasores do corpo humano. Nesse cenário, as células T identificam o que os macrófagos capturaram e ativam um alerta que é direcionado para as células B. Por sua vez, os anticorpos aparecem para a proteção do organismo, produzidos pelas células B.
Os anticorpos são substâncias específicas produzidas para atacar um único tipo de invasor. Em seu ataque, elas cobrem o coronavírus, por exemplo, e os macrófagos atacam, em massa, essa formação. Depois dessa invasão, o sistema imunológico arquiva esse tipo de anticorpo para eventuais ataques, no futuro. Esses arquivos são chamados de células de memória.
Entre as diferente células de defesa do organismo, a primeira pesquisa mediu por quanto tempo os anticorpos permanecem ativos do organismo de pessoas que se recuperaram da COVID-19. Diferente dessa pesquisa anterior, os cientistas de Singapura parecem ter definido uma estimativa temporal para a presença das células T. Esse tempo de atividade é bem maior do que o dos anticorpos, aparentemente.
Entenda a pesquisa
Para chegar a essa conclusão, a equipe de Singapura testou indivíduos que se recuperaram da COVID-19 e encontraram em todas as amostras a presença de células T, específicas para o novo coronavírus. É isso que sugere que essas células desempenham um importante papel na resposta imunológica contra o coronavírus — e entender por quanto tempo elas se manterão é fundamental.
Em paralelo, os mesmos pesquisadores também concluíram que os pacientes que se recuperaram da SARS (Síndrome respiratória aguda grave), há 17 anos, após o surto de 2003, ainda possuem células T específicas para o vírus. Foi o que descobriram entre os 23 pacientes analisados.
“Esses achados demonstram que as células T específicas para vírus induzidas por infecção por betacoronanvírus [responsável tanto pela MERS quanto pela COVID-19] são duradouras, apoiando a noção de que pacientes com COVID19 desenvolverão imunidade em longo prazo através de células T”, especulam pesquisadores no estudo.
Quanto a essas descobertas, via Twitter, o microbiologista e doutor pela USP, Atila Iamarino, comenta como os cientistas chegaram a esses resultados, observando a resposta imunológica dos participantes da pesquisa.
“Os resultados são animadores individualmente, porque mostram que a resposta contra coronavírus pode ser duradoura, o que quer dizer que mesmo se a pessoa se infectar de novo, pode ser mais leve porque o corpo já está preparado. E que pode ser fácil de despertar com uma vacina”, completa ainda Iamarino.
Por outro lado, o microbiologista brasileiro levanta uma outra questão referente a importância das células T na defesa do organismo contra a COVID-19: segundo ele, se a resposta por células T é mais importante e mais comum do que anticorpos, pode ser que o sistema respiratório das pessoas recuperadas da COVID ainda se mantenha vulnerável, o que abriria portas para recidivas e novos contágios.