A estudante de enfermagem Sara Maria Alves Casimiro, de 19 anos, esteve à beira da morte. Chegou, inclusive, a receber a extrema-unção na UTI da Santa Casa de Misericórdia de Mococa, em São Paulo, onde mora, na região de Campinas. E o problema dela não teve nada a ver com o novo coronavírus.
Aos 19 anos, ela teve infecção urinária e, como resultado do tratamento, Sara desenvolveu uma hepatite medicamentosa que levou a uma falência hepática. Desenganada pelos profissionais da Santa Casa de Mococa, ela foi transferida às pressas para o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HC-FMRP) da USP. E, imediatamente, encabeçou a lista de espera pelo órgão na fila de transplantes.
“A paciente chegou com o estado geral bastante comprometido. Já não estava mais consciente e precisando até mesmo de suporte de máquinas para respirar. A piora foi tão acentuada que acreditamos que ela não teria sobrevivido se não tivesse aparecido um órgão para transplante naquele momento”, garante o professor Ajith Kumar Sankarankutty, coordenador do Programa de Transplantes do HC-FMRP e chefe da equipe que realizou o transplante de Sara.
Além de todos os cuidados que uma cirurgia desse porte requer, era preciso pensar em todos os protocolos e procedimentos para evitar a covid-19. “A princípio, foram os mesmos cuidados adotadas para qualquer cirurgia com reforço dos equipamentos de proteção individual (EPIs) para todos os profissionais envolvidos no cuidado da paciente”, lembra o professor. Mas também foi necessário realizar os testes para covid-19 tanto na paciente quanto no doador falecido. Para alívio de todos, os resultados deram negativo.
A cirurgia foi no dia 21 de maio, durou entre cinco e seis horas e foi considerada tranquila. A estudante ficou dois meses internada no HC-FMRP, sendo 30 dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Quando acordou, outra preocupação assombrava seu dia a dia, o medo de ser contaminada pelo novo coronavírus. Foram quatro suspeitas e, em todas, testou negativo.
Sara recebeu alta no dia 11 de julho e, desde então, faz acompanhamento médico duas vezes por semana, além de fisioterapia. Já teve alta da fisioterapia com fonoaudióloga, em que precisou exercitar os músculos da deglutição depois de tanto tempo na UTI sem se alimentar por via oral. Aos poucos, sua rotina volta ao normal.
O sucesso de seu transplante chama a atenção para procedimentos dessa natureza em plena pandemia. O professor Sankarankutty diz que, durante a pandemia, houve queda no número de doação de órgãos e, consequentemente, de transplantes. Essa queda variou de 30% a 70%, dependendo da região do País. Agora a rotina volta a se normalizar gradativamente. Segundo o professor, no HC-FMRP, a situação dos transplantes também está retornando ao normal e espera realizar este ano de 45 a 50 transplantes de fígado, mesmo patamar do ano passado.