Sexta passada o mundo da publicidade acordou com um choque: o Cannes Lions, maior festival de criatividade do planeta, revogou 12 prêmios da DM9, incluindo o cobiçado Grand Prix de Creative Data, pela campanha “Efficient Way to Pay”, feita para a Consul.
Motivo? Manipulação com inteligência artificial nos vídeos de apresentação. Depoimentos falsos, resultados simulados, até um TED Talk que nunca aconteceu. Tudo maquiado por IA. Tudo premiado… e depois desmascarado.
Esse episódio vai muito além de um tropeço criativo. Ele marca o início oficial de uma nova era no marketing: a era da pós-verdade criativa.
Num mundo onde a IA pode criar qualquer coisa — desde testemunhos até “cases perfeitos” — a pergunta não é mais o que foi feito, mas o que de fato aconteceu. E isso muda tudo.
A campanha da DM9 foi celebrada como um primor de eficiência criativa. Mas a base era frágil. Os jurados não premiaram uma ideia, premiaram uma narrativa construída artificialmente.
O festival, pressionado por denúncias e pela repercussão negativa, reagiu rápido. Revogou os prêmios, reforçou o código de ética e anunciou novas regras sobre o uso de IA em materiais de submissão.
Resultado: um tombo histórico. Mas o aprendizado vai muito além da DM9.
Quando uma agência mente, o estrago respinga em todo mundo.
Na marca (Consul, no caso), que fica associada à fraude mesmo sem saber de nada; nos outros profissionais da agência, que pagam o pato coletivo; nos festivais, cuja credibilidade entra em xeque; no mercado inteiro, que passa a ser visto com desconfiança; e no público, que já desconfia de tudo — agora, com razão.
Esse fenômeno tem nome: brand bleed. O erro de um vaza pro ecossistema inteiro. E mancha geral. Estudos mostram que crises de reputação seguem uma curva em “U”: queda abrupta, retração e reconstrução lenta, que pode levar de 2 a 4 anos — isso se o público deixar. Ou seja: hoje, credibilidade vale mais do que qualquer estatueta. Você pode até ganhar ouro. Mas se perdeu a confiança, perdeu tudo.
O mundo mudou. E isso abre uma avenida inteira para quem quiser jogar limpo com inteligência artificial. Criar cases transparentes. Ter diretrizes claras. Posicionar-se como referência ética.
A IA é uma ferramenta poderosa. Mas também é uma tentação perigosa. Se usada sem consciência, ela não potencializa — ela derruba.
O caso DM9 foi o primeiro. Não será o último. E se você ainda acha que reputação é intangível demais… te conto uma verdade simples: na era da IA, reputação é a única coisa que ainda é 100% humana.



