Os ditados populares brasileiros estão tão presentes na nossa cultura que muitos acabaram virando música. Não é de hoje que compositores incorporam essas frases de sabedoria popular nas letras, desde os sambas dos anos 1930 até o rock do século 21, provérbios e expressões do cotidiano aparecem para dar um toque de humor e identidade às canções.
Afinal, essas pérolas da linguagem comum carregam lições e astúcias do povo, e deixam as músicas mais próximas do nosso dia a dia.
Veja também:
- Os 15 ditados populares mais engraçados do Brasil
- 12 ditados populares que você falou errado a vida inteira
Ditados populares em músicas
- “Aguenta a Mão, João” (1965) – Adoniran Barbosa: Neste samba bem-humorado sobre um desafortunado após uma enchente, Adoniran termina a história com um ditado bem conhecido: “ficar com uma mão atrás e outra na frente”.
A letra aconselha o amigo João a ter calma, pois embora tenha perdido tudo, amanhã ele “levanta um barracão melhor”, ou seja, paciência que dias melhores virão. A expressão usada, “com uma mão atrás e outra na frente”, é um jeito popular de dizer que alguém ficou de mãos vazias, sem nada mesmo.
- “Laranja Madura” (1967) – Ataulfo Alves: O refrão deste samba de Ataulfo vem direto do repertório dos ditados populares mineiros. Ele canta: “Laranja madura na beira da estrada tá bichada, ou tem marimbondo no pé”, alertando de forma poética que algo aparentemente muito bom pode esconder problemas.
Em outras palavras, é aquele conselho esperto: desconfie do que está fácil demais, porque pode haver armadilhas. A sabedoria do interior virou sucesso nacional na voz de Ataulfo e suas Pastoras.
- “Homem com H” (1981) – Ney Matogrosso: Este xote composto por Antônio Barros e imortalizado por Ney Matogrosso traz um ditado popular logo nos versos iniciais: “Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”.
A expressão pinta um cenário sem saída, fazendo humor com situações em que não adianta nem tentar escapar. Cantada com a ironia característica de Ney, a frase grudou na memória do público e mostrou como até um dilema do dia a dia vira um refrão divertido.
- “Camarão que Dorme a Onda Leva” (1983) – Zeca Pagodinho & Beth Carvalho: O próprio título já entrega o ditado popular que este samba consagrou. “Camarão que dorme, a onda leva” é aquela máxima que avisa: quem vacila, perde a vez.
Lançada por Beth Carvalho apresentando o então novato Zeca Pagodinho, a música ainda desfilou outros provérbios pelo meio da letra, como “hoje é dia da caça, amanhã do caçador” e “não faça de mim gato e sapato”. Resultado: a sabedoria do povo caiu no gosto popular em forma de samba e revelou um novo ídolo.
- “Como Vovó Já Dizia” (1974) – Raul Seixas: O rock irreverente de Raul também bebeu na fonte dos ditados. Nessa canção, apresentada como ensinamentos de avó, ele encadeia várias frases de efeito no estilo proverbial, algumas tradicionais, outras subvertidas com sarcasmo.
Entre elas estão pérolas como “quem não tem colírio usa óculos escuros” e “a formiga só trabalha porque não sabe cantar”, numa crítica bem-humorada à vida demasiado séria.
- “Bicho de Sete Cabeças” (1979) – Geraldo Azevedo & Zé Ramalho: Aqui, o ditado não está apenas na letra, mas dá nome à canção. A expressão “bicho de sete cabeças” é usada para algo muito complicado ou assustador, e inspirou essa música famosa de Geraldo Azevedo (parceria com Zé Ramalho).
A letra dialoga com o ditado ao falar de confusão e desespero, e a canção fez tanto sucesso que virou até título de filme.
- “Pau Que Nasce Torto” (Melô do Tchan) (1995) – É o Tchan: Nem os hits do axé escaparam dos ditados populares! O grupo É o Tchan estourou nos anos 90 com uma letra pra lá de pegajosa que começa dizendo: “pau que nasce torto nunca se endireita…”.
Esse ditado, bastante conhecido, brinca com a ideia de que quem nasce com certo jeito dificilmente muda. A música levou a expressão das rodas de conversa para as pistas de dança do Brasil inteiro, e quem viveu aquela época certamente sabe completar o verso de cabeça!
- “Ditados” (2020) – CPM 22: Prova de que os provérbios continuam vivos na música atual, a banda de rock CPM 22 lançou recentemente uma faixa chamada “Ditados”. Na letra, eles emendam vários ditados populares em ritmo de hardcore melódico.
Tem “Quem com ferro fere, com ferro será ferido”, “Pra bom entendedor, meia palavra basta”, “Um dia da caça, outro do caçador”, entre outros. A mistura inusitada mostrou que até no som pesado há espaço para a velha sabedoria popular, surpreendendo e divertindo os fãs mais jovens.
A voz do povo alimenta a arte
Dos sambas-canção às baladas de rock, cada ditado cantado carrega uma bagagem cultural que nos faz sorrir e refletir, conectando pessoas por meio de um linguajar comum. Os ditados incorporados nas músicas mantêm viva a tradição oral brasileira, carrega sabedoria ancestral e revela a maneira única com que o nosso povo enxerga o mundo, com leveza, criatividade e bom humor.



