A gente cresce ouvindo que um dia será nossa vez de retribuir. Mas ninguém conta o quanto isso pode ser difícil viver.
Cuidar dos nossos pais é uma das formas mais puras de retribuir o amor. Mas também pode ser uma das experiências mais solitárias, cansativas e emocionalmente confusas da vida adulta.
Ninguém tem coragem de falar sobre o cansaço que não dá para dividir, sobre a culpa que aparece quando a paciência some ou sobre a sensação de estar perdendo o tempo da sua vida enquanto tenta dar conta de tudo.
Entre o amor e o cuidado mora o cansaço e é sobre isso que precisamos conversar. Nossa mãe, que sempre esteve ali firme, decidida e cuidadora começa a esquecer o que contamos a ela, repete histórias, já não tem mais tanta energia. O andar fica mais lento, o corpo mais frágil, a saúde não é mais a mesma.
O pai, que parecia o nosso super-herói, passa a precisar de ajuda para coisas simples, e nos olha com aquele olhar que antes nos orientava, mas agora pede a nossa direção.
De repente, somos os cuidadores e com esse novo papel vem o cansaço, a sobrecarga, a privação de si. A nossa rotina vira do avesso. O pouco tempo livre desaparece. Os nossos planos são adiados, engavetados. Nem sempre temos o apoio de quem precisa ajudar e aparece ela: a culpa.
Esse foi um dos sentimentos mais fortes que me visitaram quando minha história se virou do avesso. Além da solidão, tive muita culpa. Culpa por me irritar, por cansar. Por sentir raiva. Por pensar “eu não queria passar por isso, eu não mereço”.
Mas com o tempo, entendi que sentir tudo isso não me fazia uma filha ruim. Me fazia uma filha real. Humana.
E se você está nesse lugar, acolha seu esforço, sua exaustão, sua tentativa diária de dar conta. E, por favor, não se esqueça de continuar cuidando de si.
Quem cuida, também precisa ser cuidado. E não espere que o mundo se lembre disso. Lembre-se você de você!
Busque apoio. Divida responsabilidades com quem puder. Planeje pequenos respiros, nem que seja um café em silêncio ou uma conversa com alguém que te escute sem julgamento. Não gere muitas expectativas, a família vai te julgar.
Cuidar dos pais é, sim, um ato de amor profundo. Mas se cuidar é permitir que esse amor continue de pé. No fundo, é isso: cuidar de quem a gente ama sem se perder de si.
E se sentir que está difícil, que está pesado demais, saiba: você não precisa carregar tudo sozinho.
Muitas pessoas têm vindo buscar apoio psicológico justamente nesse momento da vida e não é porque falharam, mas porque entenderam que também merecem amparo.
A nossa escuta profissional pode ser um respiro no meio do caos, um espaço seguro para você se lembrar de quem é, além do papel de cuidador.



