O ministro Luiz Fux, da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), fez nesta quarta-feira (10) um discurso duro durante o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Em seu voto, defendeu a anulação do processo, sob o argumento de que a Corte não tem competência para analisar o caso.
Em sua manifestação, Fux destacou que, como Bolsonaro já não ocupa mais a Presidência da República, o julgamento deveria ocorrer em instâncias inferiores. Segundo ele, a Constituição é “claríssima” nesse ponto, e o STF teria alterado a competência após a data dos crimes investigados. Para o ministro, houve “inúmeras modificações” sobre o tema, o que configuraria uma “banalização da interpretação constitucional”.
O ministro também criticou o fato de o processo estar sendo analisado pela Primeira Turma, defendendo que, caso fosse de competência do STF, deveria ser apreciado pelo Plenário. Ele argumentou que reduzir a análise a uma das turmas significaria silenciar parte dos ministros, contrariando a missão da Corte de julgar os cargos de maior relevância do país.
Outro ponto levantado por Fux foi a alegação da defesa de cerceamento em razão do chamado data dump, que seria a disponibilização tardia de um volume excessivo de informações, o que, segundo ele, poderia comprometer o contraditório. O magistrado citou trechos da defesa de Bolsonaro para reforçar o argumento.
Sobre a delação do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, Fux afirmou que, apesar das dúvidas iniciais sobre as várias idas do militar à Polícia Federal, seu voto foi pela validação do acordo. Ele também defendeu a suspensão da ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), não apenas em relação aos crimes de dano e deterioração do patrimônio, mas em todos os pontos, pelo fato de o parlamentar ter foro privilegiado.
Na sequência, Fux analisou a tipificação dos crimes atribuídos a Bolsonaro e a outros réus. Ele ressaltou que a conduta deve se encaixar com precisão no tipo penal, “como a mão que se encaixa perfeitamente na luva”, alertando para os riscos da interpretação extensiva.
Em seguida, Fux se debruçou sobre o crime de organização criminosa. Ele entendeu que a acusação de organização criminosa e concluiu que ela não se aplica a Bolsonaro e seus aliados. Segundo o ministro, faltam elementos exigidos pela legislação, como estabilidade e permanência, que não teriam sido comprovados pela PGR no processo.
Para ele, o caso se enquadra, na verdade, como concurso de pessoas, ou seja, quando dois ou mais agentes atuam em conjunto para praticar um mesmo delito. Fux acrescentou ainda que não ficou comprovado o uso concreto de armas de fogo pelo grupo.
Em relação ao crime de dano, Fux destacou que é necessária a participação direta e física do réu, algo que não foi comprovado nos autos. Para ele, não há provas de que Bolsonaro ou outros acusados tenham ordenado a destruição ocorrida nos atos de 8 de janeiro, e nenhum réu pode ser responsabilizado por condutas de terceiros sem vínculo direto, determinação ou omissão no dever de impedir os atos.
Luiz Fux é o terceiro ministro a votar durante o julgamento. Seus pontos divergiram dos ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino, que votaram favoráveis a condenação dos oito réus. Ainda faltam os votos da ministra Cármen Lúcia e do presidente da Primeira Turma Cristiano Zanin.
São réus do chamado núcleo crucial o ex-presidente Bolsonaro; o ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem; o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier; o ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal, Anderson Torres; o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno; o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira; o ex-ministro da Defesa e candidato a vice de Bolsonaro na chapa de 2022, Walter Braga Netto; e o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid.
Eles são julgados pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.



