Parceria ajuda a desafogar fila de cirurgia bariátrica

A interrupção das cirurgias eletivas, medida necessária nos piores meses da pandemia, afetou duplamente as pessoas que sofrem de obesidade grave. Além de não conseguir passar por uma redução de estômago planejada há tempos, muitas viram o ponteiro da balança subir ainda mais durante o isolamento social – situação que favoreceu a inatividade física, a alimentação hipercalórica, estresse e ansiedade.

O aumento da demanda por cirurgias bariátricas no Brasil era previsível. Para tentar desafogar a fila de espera e evitar o agravamento da condição de saúde dos doentes, o Hospital Municipal Vila Santa Catarina, na zona sul de São Paulo, criou um programa de obesidade há um ano. A iniciativa nasceu da preocupação do secretário municipal de saúde de São Paulo, Edson Aparecido, e do médico Sidney Klajner, presidente do Hospital Israelita Albert Einstein, que gerencia a instituição pública por meio de convênio com a Prefeitura.

A centésima cirurgia, acompanhada pelo Estadão, foi realizada pelo próprio Klajner na última quinta-feira de outubro. A auxiliar de limpeza Viviane Matos, 37 anos, internou-se na véspera. Saiu com dificuldade do Uber, pelo vão entre a porta e o banco do passageiro. Viviane caminhou em direção à recepção com passos lentos e dolorosos, mas visivelmente feliz. Depois de sucessivos e frustrados tratamentos para emagrecer, finalmente conseguiu vaga para realizar o procedimento pelo SUS. “Meu sonho é ser saudável; dormir e levantar sem dor”, disse ela ao explicar sua expectativa.

O encontro entre o médico do Morumbi e a faxineira do Capão Redondo aconteceu só na sala de cirurgia. “O elemento estranho aqui hoje sou eu; minha equipe cirúrgica trabalha nos dois hospitais”, disse Klajner. “É um orgulho operar a centésima paciente de um programa que funciona em tempo recorde, sem nenhum caso de complicação”, afirmou. “Em São Paulo, os doentes esperam cerca de três anos no SUS antes de conseguir chegar até aqui”.

A CIRURGIA

A técnica escolhida foi a gastrectomia vertical, feita por laparoscopia. Com os olhos fixos no monitor de vídeo, Klajner manejava pinças cirúrgicas introduzidas em pequenos orifícios abertos no abdome. No início, fez a dissecção de uma porção de gordura na transição entre o esôfago e o estômago. O objetivo era enxergar melhor a área em que seria feito um grampeamento para delimitar a parte do estômago a ser extraída.

Depois que um molde desceu pelo esôfago de Viviane e chegou ao estômago, Klajner acionou o gatilho de uma lâmina. Estava feito o corte. A parte extraída do órgão foi retirada por uma mínima abertura no umbigo. Para quem nunca viu, parece mágica.

O procedimento completo durou cerca de 50 minutos. O novo estômago ficou com volume de 110 ml, forma que inibe a ingestão excessiva de alimentos e exige readaptação alimentar. O objetivo não é apenas reduzir o tamanho do órgão. Quem é submetido a ela deixa de ter 90% da produção de alguns hormônios que induzem o aumento do apetite. Nos próximos dois anos, Viviane seguirá em acompanhamento no hospital.

PANORAMA

A cirurgia de obesidade é um recurso para evitar complicações que podem ser fatais, como insuficiência cardíaca, hipertensão, diabetes, câncer etc. A preparação dos candidatos deve ser rigorosa. No caso da capital paulista, a central de regulação de vagas encaminha ao Vila Santa Catarina os pacientes acompanhados nas unidades básicas de saúde (UBS). No hospital, seguem nova fase de consultas e tratamento com nutricionista, psicólogo, endocrinologista, fisioterapeuta etc. A cada mês, trinta novos doentes são admitidos no programa. Hoje, há cerca de 360 em acompanhamento – 100 já operados.

A dificuldade de acesso a bariátricas é um problema nacional. Em 2019, foram 12.568 procedimentos desse tipo no SUS. Em 2020, houve apenas 3.772 – queda de quase 70% em um ano. Até julho de 2021, foram registradas apenas 990 operações no sistema público, diz a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica.

“Menos de mil cirurgias realizadas no SUS no 1º semestre é muito pouco. A quantidade de procedimentos que fazíamos em 2019 já era insuficiente para atender à demanda”, diz o médico Fabio Viegas, presidente da entidade.

Procurada pelo Estadão, a Secretaria Estadual de Saúde disse que a demanda é descentralizada na rede primária e não informou quantas pessoas estão inscritas na central de regulação de vagas, à espera de cirurgia de obesidade. Em nota, a secretaria da capital afirma que acompanha atualmente 25 pessoas por meio de consultas e exames pré-operatórios.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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