O Congresso Nacional impôs uma derrota ao Planalto ao derrubar, nesta quinta-feira (27), 56 dos 63 vetos feitos pelo presidente Lula (PT) à lei de licenciamento ambiental. A decisão, que ocorre menos de uma semana após o fim da COP30, aprofunda a tensão entre Executivo e Legislativo.
Na Câmara, 295 deputados votaram pela derrubada e 167 pela manutenção dos vetos. No Senado, a maioria repetiu o posicionamento, com placar de 52 a 15. A sessão reúne as duas Casas de forma conjunta. A pedido de partidos da base, ainda serão analisadas alguns vetos separadamente.
A versão original da lei, ou seja, antes dos vetos, altera o sistema de licenciamento ambiental ao simplificar etapas e ampliar autorizações automáticas para empreendimentos e obras no país. Entre os novos instrumentos está a Licença Ambiental Especial (LAE), que permite análise simplificada de projetos considerados estratégicos, mesmo quando apresentam alto potencial de impacto.
O texto original também cria a Licença por Adesão e Compromisso (LAC), voltada a atividades de pequeno e médio porte, sem avaliação individualizada. Além disso, dispensa setores inteiros, como parte do agronegócio e do saneamento, da necessidade de licenciamento, reduz a participação de populações afetadas e limita a proteção a territórios indígenas e quilombolas já homologados ou titulados.
Lula vetou 63 trechos da lei em agosto. Na véspera da votação desta quarta-feira, o governo divulgou nota explicando os motivos dos vetos, afirmando que buscava “proteger o meio ambiente em todos os biomas, bem como a saúde da população brasileira”.
“O Governo do Brasil agiu dessa forma considerando o preocupante cenário de desastres climáticos extremos, que impõem riscos às famílias, à economia e ao meio ambiente. A eventual derrubada dos vetos pode trazer efeitos imediatos e de difícil reversão”, diz o texto.
Sete vetos relacionados à LAE ficaram fora da votação. Governo e oposição acordaram o adiamento porque o tema também está incluso em uma medida provisória em tramitação, editada em agosto pelo Planalto para atender parte das reivindicações do Congresso. Na mesma ocasião, o governo encaminhou um novo projeto de lei para rediscutir pontos considerados mais sensíveis.
A LAE prevê que um conselho político selecione projetos prioritários para trâmites acelerados no licenciamento, o que pode acelerar obras estratégicas, como a exploração na Foz do Amazonas, autorizada em outubro.
A votação desta quinta-feira ocorre em um momento de desgaste entre o Planalto e as lideranças do Congresso. Na quarta (26), Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) não compareceram ao ato de sanção da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, gesto interpretado como sinal de distanciamento político.
Durante a sessão, Alcolumbre discursou para rebater críticas sobre ter pautado os vetos e rejeitou a ideia de que se tratasse de retaliação. Ele afirmou:
“Deliberar sobre vetos presidenciais é parte essencial do processo legislativo. Qualquer tentativa de transformar isso em disputa política desconsidera o papel institucional do Congresso Nacional. A votação desse veto não é um gesto político isolado, é uma necessidade institucional”, disse.
Ainda segundo Alcolumbre, a análise dos vetos era necessária antes da votação das outras propostas que tratam de licenciamento. “Votar esse veto é fundamental para destravarmos o tema do licenciamento ambiental como um todo, estabilizando o marco legal, dando previsibilidade jurídica e permitindo que o Congresso avance nas demais matérias”.
Para o governo, a derrota logo após a COP30 gera desgaste adicional. Governistas entendem que o Planalto tentou construir uma solução intermediária, ao vetar parte do texto e, ao mesmo tempo, enviar uma medida provisória e um novo projeto para negociação com o Congresso.
Com a decisão do Legislativo, a base aposta na pressão da sociedade contra o resultado e não descarta que haja judicialização por parte de entidades. Nas redes sociais, a ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) afirmou que a derrubada dos vetos “contradiz o esforço ambiental e climático do governo que acaba de realizar a COP 30”.
No plenário, Ivan Valente (PSOL-SP) declarou que o resultado deve gerar judicialização e “expor o Brasil à vergonha internacional”. Já o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), comemorou a decisão, chamando o resultado de “lavada”.
Defensores da derrubada dos vetos argumentam que a proposta amplia a autonomia de estados e municípios para definir normas de licenciamento. Especialistas, por outro lado, alertam que o modelo pode gerar insegurança jurídica ao permitir regras concorrentes entre diferentes níveis de governo.
A solução apresentada pelo governo Lula, por meio dos vetos e do novo projeto, mantém autonomia local, mas dentro de diretrizes gerais definidas pela União.



