A Prefeitura de Ribeirão Preto repassou ao Instituto de Previdência dos Municipiários (IPM) quase metade de todos os recursos recebidos do governo federal para combate à pandemia durante o ano de 2020. No total, foram R$ 57 milhões recebidos, dos quais R$ 28,3 milhões foram para o IPM. O montante representa 49,65% do total. Procurada, a prefeitura informou que o tema já foi analisado pelos órgãos de controle e que a matéria é “requentada e sem propósito”.
A situação já havia sido revelada, com exclusividade, pelo Grupo Thathi de Comunicação no ano passado, mas os dados consolidados do ano foram obtidos pelo vereador Lincoln Fernandes (PDT), em requerimento à Secretaria de Saúde.
Segundo levantamento realizado pelo Instituto Ribeirão 2030, a novela do IPM é resultado de uma série de gestões temerárias, que levaram o instituto de registrar um rombo que se aproxima de R$ 400 milhões.
Ainda segundo o Ribeirão 2030, o montante descontado na folha de pagamento dos funcionários e arrecadado pela prefeitura não é suficiente para pagar quem já se aposentou e, no longo prazo, o rombo pode atingir a astronômica cifra de R$ 20 bilhões.
Sem irregularidade
A utilização dos recursos federais para custeio da máquina pública não é ilegal, como já apontou o Tribunal de Contas do Estado (TCE) durante procedimento que investigou o uso dos recursos. Apesar disso, especialistas contestam a moralidade da utilização dos recursos.
O jurista Dirceu Chrysostomo, que já foi procurador do Estado de São Paulo, considera que, ainda que discutível, a medida não pode ser considerada ilegal. “Não é ilegal, pressupondo que o percentual de gasto com saúde e assistência social tenha sido efetuado. O restante era de livre gasto. Inclusive, muitos entes federados usaram para pagar pessoal, que é o caso de Ribeirão”, analisa.
Já para o cientista político José Elias Domingos, a questão abre o debate. “Nem tudo que é legal, é moral. Acho que o dinheiro era fundamental para combater a pandemia, e gasto com custeio da folha não está nesse escopo”, conta.
Câmara
Fernandes afirmou que irá utilizar os dados para convocar o secretário da Saúde da cidade, Sandro Scarpelini, para prestar depoimento na Comissão da Saúde do Legislativo.
A ideia do parlamentar é entender se a utilização desses recursos em áreas como saúde ou mesmo a criação de um auxílio emergencial local não traria melhores resultados para o combate à pandemia. “Chama a atenção o fato de que várias ações preventivas poderiam ter sido tomadas. Mas, ao invés disso, parece que deixaram a bomba estourar”, disse o parlamentar.
Outro lado
Procurada, a prefeitura informou que “se trata de repasse de recurso Federal ao IPM para o pagamento de custeio, devido à queda, a época, na arrecadação do município em virtude da pandemia” e ressaltou que, em seu entender, a matéria é “requentada e sem propósito”, posto que o assunto foi tema de verificação dos órgãos de controle.
“A destinação está em conformidade a Lei Complementar 173/2020 que instituiu o Programa Federativo de Enfrentamento à Covid-19, porém com destinação específica, conforme prevê a lei, para compensação de perdas pela queda de arrecadação dos estados e municípios com a pandemia do Covid-19, e não vinculado a Saúde”.
Para a administração, todas as verbas recebidas do governo federal “foram utilizadas de forma correta e para o fim especificado”. A prefeitura citou, entre esses fins, o convenio com o Hospital Municipal Francisco de Assis, que incluiu o suporte de 31 leitos não-Covid; a aquisição de materiais de consumo; o pagamento da folha de vencimentos dos plantonistas que atuam na linha de frente ao combate à Covid e investimentos para o funcionamento do Polo Covid.
“Além disso, foram feitos investimentos, com esta verba federal, aliado às doações da Justiça Federal e Justiça Estadual, a instalação do laboratório para realização de exames RT-PCR no Supera Parque”.