Sérgio Roxo da Fonseca – Procurador de Justiça, professor (aposentado), advogado
Tais Costa da Fonseca – Advogada
Os especialistas afirmam que entre os quadros clássicos há cinco deles que se projetam como os mais perfeitos, quando não, como os melhores de todos: 1) “Las Meninas” de Velásquez, que se encontra no Museu do Prado em Madrid; 2) a “Assembleia de Atenas” de Rafael, que se encontra no Vaticano; 3) “Mona Lisa” ou “La Gioconda” de Leonardo da Vinci que se encontra no Museu do Louvre em Paris; 4) “O Enterro do Conde de Orgaz” de El Greco, que se encontra na Igreja de São Tomé, na cidade de Toledo, Espanha; 5) a “Ronda Noturna” de Rembrandt que se encontra no Rijsmuseum em Amsterdam.
Fazemos uma muito pequena reflexão sobre a obra prima de Velasquez, considerado o mais importante quadro da época clássica. O quadro já chama a atenção pelo nome, pois, como se diz, é conhecido como “Las Meninas” que possivelmente deveria ser conhecida como “Las Niñas”. Não se sabe a razão pela qual a obra foi batizada em “português” quando se trata de quadro nascido e exposto na Espanha.
O quadro estampa o próprio pintor Velasquez, olhando para nós de dentro do quadro por ele pintado. Ao seu lado percebe-se as costas de outro quadro que possivelmente estava sendo pintado pelo autor. O pintor, portanto, pintou um quadro no qual ele mesmo está estampado trabalhando em outra tela que não é enxergada por quem examina a obra.
Ao seu lado estão as meninas, com sua cuidadora, o bobo da corte, um cachorro. Na parede do fundo um homem está abrindo uma porta iluminada, entrando ou saindo daquele salão.
Nas proximidades dele há um quadro iluminado, onde se percebe a figura de um casal. Os documentos da época registram que se trata do rei e da rainha da Espanha. Quem distraidamente analisa este último quadro não percebe que não se trata de um quadro dentro de outro quadro, mas um espelho. Portanto, Velasquez, no momento em que pintava o famoso quadro estaria olhando para o objeto de sua atenção, ou seja, o rei e a rainha da Espanha.
Qual seria então o objeto do quadro que hipoteticamente está sendo pintado que está de costas quando examinamos o pintor pintado pelo próprio pintor? O artista misteriosamente pintou as costas de um quadro ocultando o objeto do seu trabalho. A resposta encontrada pela história afirma que o quadro do fundo da sala não é um quadro mas, sim, um espelho. Portanto, o objeto do quadro posto de costas para o apreciador é exatamente aquele refletido no espelho, ou seja, a imagem do rei e da rainha da Espanha.
Assim sendo, Velásquez estaria afirmando filosoficamente, com sua obra prima, que muitas vezes nós “não vemos o que estamos enxergando” ou, ao contrário, que nós “não enxergamos o que estamos vendo”.
O Chico Buarque de Holanda, numa das mais extraordinárias de suas obras, insiste em afirmar que aquele que “inventou o pecado tem de inventar o perdão”. Será possível “enxergar o que estamos vendo” ou perceber que o “pecado oculta o perdão”? Ou que o perdão oculta o pecado? Apesar de você amanhã será sempre um novo dia e uma obra de arte consegue levar o apreciador a ver o que não enxerga, tal como aquele que inventou o pecado e não se lembrou de inventar o perdão.
O filósofo francês Michel Foucault iniciou a passos largos sua carreira publicando um livro denominado “As Palavras e as Coisas”. Quase a metade da obra Foucault expõe sua percepção ao examinar “Las Meninas”, destacando a incompossibilidade de o apreciador dedicar muito de sua vida “enxergando seus passos” sem conseguir “ver por onde caminha”.
É vem verdade que outro pensador francês, ou seja, “Descartes”, construiu um método para revelar a verdade do que pressentimos: fazer com que a “intuição” da realidade nos leve à “dedução” da “realidade”.