Para Pierre Weil, Jean-Yves Leloup e Roberto Crema, normose é a patologia da normalidade. No livro Normose os autores acima discorrem sobre o tema. Pierre Weil definiu normose como um hábito de pensar, sentir e agir como normal por consenso social, mas que possui natureza patogênica: uma normalidade doentia.
Dou como exemplos de normose, uma crença que leve pessoas a um suicídio coletivo, como o caso do “massacre de Jonestown” , ou uma ideologia que gere uma política de Estado genocida, como o nazismo. Parece-me que normose possui estreita relação com a loucura. O Professor Christian Dunker, Psicanalista do Instituto de Psicologia da USP, afirma que “doenças da mente não existem; existem transtornos disfuncionais”.
Ele explica de forma crítica sobre a criação da nomenclatura de centenas de transtornos da mente, classificados e analisados em cada país de forma diferente. O Psicólogo Elliot Aronson, no livro O animal social, ensina que “pessoas que fazem loucuras não são necessariamente loucas”.
Machado de Assis, em o Alienista, brindou-nos com o tema loucura, em que o personagem protagonista, Doutor Simão Bacamarte (considerado na narrativa o maior dos médicos do Brasil, de Portugal e das Espanhas) julga, segundo “a sua ciência” , quem é louco ou são.
Michel Foucault, filósofo, ensina muito sobre o tema em História da Loucura. Nessa obra, advinda de sua tese de doutorado (1961), o pensador francês explica que a loucura nem sempre esteve relacionada a uma patologia e foi tratada de modo diferente da Renascença para a Idade Moderna, e desta para o período Contemporâneo.
No Renascimento, entre os séculos XIV e XVI, a loucura era vista como um saber esotérico sobre a natureza da vida: o louco, portanto, era considerado um pensador. Foucault, através do método que denominou arqueologia, rompeu com o conceito de história cumulativa e continuísta das ciências, contrapondo-se à existência de uma verdade essencial. A doença mental, explica Foucault, é uma invenção humana recente que começa a aparecer no início do século XIX.
Na sua obra destaca-se três momentos da loucura: Indiferenciação (séculos XV e XVI), onde loucura e saber não eram antagônicos; a Segregação (séculos XVII e XVIII), quando a loucura é separada da razão e o louco segregado; e a Medicalização (séculos XIX e XX), quando a loucura é diagnosticada como “doença mental” , tornando-se assunto médico e sujeitando o seu portador a tratamento.
A loucura, assim, passou a ser analisada dentro de um contexto histórico, político e social, e não necessariamente biológico. Como em cada época há a sua cultura, quem não está adequado a ela pode ser considerado louco ou “fora dos padrões sociais” : um louco diagnosticado no passado, poderia ser considerado normal hoje. A explicação disso para Foucault não está na evolução científica, mas na mudança cultural da sociedade, em aceitar socialmente o que antes não admitia.
André Constantino Yazbek, na obra “10 Lições sobre FOUCAULT” , explica sobre o pensamento deste sobre a loucura, discorrendo: “ … em sua História da loucura, tratava-se de mostrar que não é na esfera de uma teoria da loucura (seja ela médica, jurídica ou mesmo psiquiátrica) que podemos encontrar o elemento fundamental das relações históricas entre a razão e a loucura, mas sim em critérios sociais e discursivos que possibilitam uma forma de relação com a loucura mediada pela exclusão institucional”.
É fato histórico que aos 22 anos Foucault foi internado pelo pai num hospício, porque tentou suicídio. Essa, talvez, tenha sido a motivação do filósofo em criar a arqueologia de um saber sobre a loucura, a psicologia e a psicanálise. Tudo demonstra que a diminuição da tolerância sobre a loucura levou Foucault a constituir um saber sobre ela. Com a exclusão da loucura do espaço social e a segregação do indivíduo, esse filósofo criou um importante saber.