O músico MC Marcinho, criador do hit “Glamurosa”, morreu neste sábado (26) aos 45 anos. A informação foi confirmada em nota pelo Hospital Copa D’Or, no Rio de Janeiro, que declara que o artista morreu em decorrência da falência múltipla de órgãos. Ele estava internado desde o fim de junho por conta de um quadro de insuficiência cardíaca e renal.
Depois de internado, MC Marcinho sofreu uma parada cardíaca, que o levou a receber um coração artificial no mês passado. Uma infecção generalizada o levou a sair da fila do transplante de coração, e desde então ele vinha dependendo de ventilação mecânica e hemodiálise.
Quando estourou para o Brasil com o hit “Glamurosa”, em 2001, MC Marcinho já vinha de quase dez anos de funk. Sua voz médio-anasalada, seu jeito comedido e suas letras de doce romance lhe davam as credenciais que o sucesso nacional apenas sacramentou no início dos anos 2000. Uma aura marcada para sempre no seu epíteto: MC Marcinho, o Príncipe do Funk.
Sua estreia na música data de 1993, aos 16 anos. Foi ao encontrar sua amada com outro rapaz que, cabisbaixo, Marcinho resolveu escrever uma canção. Os amigos lhe sugeriram que cantasse aquela letra sobre a base de Volt Mix –a pedra angular do funk do meio da década de 1990. Nascia seu primeiro sucesso, o “Rap do Solitário”.
Natural de Duque de Caxias, Marcinho se enfiou no circuito de bailes da Baixada Fluminense com sua única música. Não tardou para que caísse nas graças do DJ Marlboro e do empresário Rômulo Costa. Ambos ocupavam posição de destaque nas engrenagens do funk carioca, no comando de festas, programas e discos. Coube a Marcinho abrir o compilado “Rap Brasil 3”, de 1995, com seu rap. Ganhou as rádios do Rio.
Nascido Márcio André Nepomuceno Garcia, em 1977, o jovem teve seu primeiro contato com música por intermédio do pai e do avô sambistas. Desse início e do gosto por cantores como Trinere e Tony Garcia veio sua forma de cantar: melodiosa, de vogais estendidas e solta nas divisões marcadas do funk. Sua caneta romântica também daria o tom em seu sucesso seguinte, “Princesa”, dedicada a seu par da época, a também MC Cacau.
A faixa colocou Marcinho no lugar de elo entre o freestyle e o Miami bass, músicas do caldo primordial do funk, e o futuro possível do gênero no pop –o chamado funk melody– no fim dos anos 90. Fã de artistas precursores do funk como MC Galo e Danda & Tafarel, Marcinho passou a liderar a segunda geração de MCs cariocas. Os únicos com quem dividia os holofotes e a lírica adocicada eram Claudinho & Buchecha.
Assim como o duo, Marcinho era figura cativa dos programas da Xuxa, importante antena do funk carioca entre os anos 90 e 2000. De ídolo a amiga, a apresentadora virou musa para o MC na letra de “Glamurosa”, de 2001. Ela, a rainha do funk, a atriz Regina Casé, a poderosa, e a empresária funkeira Verônica Costa, a glamurosa, se misturam na ode do artista às mulheres dos bailes.
A ideia da canção surgiu quando Marcinho já havia desistido do funk. No início dos anos 2000, a ascensão dos bailes de corredor e o sucesso do funk de letras mais sensuais resultaram num choque do poder público em torno do gênero, incluindo a instauração de uma CPI estadual do funk. O artista trabalhava na administração de um hospital quando ligou para DJ Marlboro com sua aposta para voltar aos palcos, “Glamurosa”.
Não só à letra de fácil assimilação, a música deve muito do seu sucesso à produção atribuída aos DJs Marlboros e Batutinha. A linha de baixo que acompanha a batida e os truques de clímax a cada estrofe — acordes de teclado e os chamados “build-ups” suaves — fazem do refrão um trecho irresistível de cantar e dançar.
O sucesso botou Marcinho em palcos do Brasil e do mundo. A faixa fez parte de diversas compilações da época e entrou em dois álbuns do MC, “Tudo é Festa e Falando às Estrelas”. Até hoje, “Glamurosa” é golpe certo: a música voltou recentemente à TV como trilha da novela “Vai na Fé”.
Com o passar da década de 2000, Marcinho perdeu espaço no funk. Em 2006 ele sofreu um acidente de carro e uma tentativa de assalto. Esses episódios marcariam sua vida para sempre, tornando sua saúde frágil e reduzindo suas economias –no ápice de “Rap do Solitário” o MC chegava a ganhar R$ 50 mil por mês apenas com shows, algo como meio milhão de reais com os valores ajustados para 2023.
Marcinho se transformou em figura errática no funk nos últimos anos. Os recentes problemas cardíacos, as complicações de saúde trazidas pela diabetes e a insuficiência renal o tiraram de palcos e estúdios. Ainda assim, o MC conseguiu gravar novas músicas, como é o caso de “Salve Favela”, com o ator Babu Santana, e “Quero Te Levar”, com a rapper Lourena. As faixas não alcançaram o mesmo brilho de outros sucessos do MC dos anos 90 e 2000, como “Garota Nota 100”, “Arrasa Nem” e “Catucar”.
É “Glamurosa”, contudo, que sempre trará a lembrança de MC Marcinho no funk e na música brasileira –aqui, como um dos nomes no rol de cancioneiros do amor. Nessa música, tão marcante quanto a mensagem romântica do Príncipe do Funk é sua profecia de passado e futuro: “O funk do meu Rio se espalhou pelo Brasil”. MC Marcinho morreu aos 45 anos e deixa esposa e quatro filhos.
FELIPE MAIA