Afastamento do trabalho por transtornos mentais cresce 68% no Brasil; especialistas de Ribeirão Preto comentam

Desde março de 2024, a Lei nº 14.831, que incentiva as empresas a adotarem critérios de promoção da saúde mental e do bem-estar de seus colaboradores está em vigor

Foto: Freepik

Os quase meio milhão de afastamentos do trabalho por saúde mental no Brasil, no ano passado, representam um aumento de 68% em relação a 2023, segundo dados do Ministério da Previdência Social. Ao todo, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) recebeu 3,5 milhões de pedidos de licença médica, e mais de 10% deles foram por transtornos mentais. Segundo a psicóloga e professora, Marina Greghi Sticca, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, após a pandemia da covid-19 houve um aumento na incidência de transtornos mentais na população brasileira em geral.

Além disso, outro motivo para o crescimento são “as mudanças no mundo do trabalho, impulsionadas pelos avanços tecnológicos, competitividade global, as crises econômicas, têm impactado a forma como o trabalho é organizado e as relações profissionais, e com isso tem aumentado as exigências no trabalho, gerando um sentimento de insegurança e incerteza entre os trabalhadores”, afirma a psicóloga.

Marina também aponta que, apesar do tema estar sendo mais discutido no ambiente organizacional, ainda existem muitos estigmas que  fazem com que os trabalhadores tenham receio em procurar ajuda por medo de consequências que eles podem ter no futuro, como demissão após o retorno, retaliações ou dificuldades para promoções futuras. “É essencial que as empresas desenvolvam programas voltados para prevenção, promoção e reabilitação, garantindo melhores condições de trabalho.”

Desde março de 2024, a Lei nº 14.831, que incentiva as empresas a adotarem critérios de promoção da saúde mental e do bem-estar de seus colaboradores está em vigor. Mesmo sendo uma medida positiva, o aumento dos afastamentos aponta para um problema estrutural do mercado de trabalho, segundo a professora Luciana Romano Morilas, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP.

“É a pressão por aumento de produtividade sem a devida remuneração ou adequação ao tempo necessário para a realização das tarefas que têm gerado esses problemas de saúde mental cada vez mais frequentes, que geram afastamentos com consequente prejuízo para as empresas.”

Segundo Luciana, para a empresa a ausência de um funcionário “aumenta os custos com a substituição, com o treinamento de mão de obra para realizar aquelas tarefas e com gastos de planos de saúde e programas de bem-estar”.

Além disso, Luciana diz que as empresas e as lideranças devem mudar a mentalidade de gestão, principalmente em relação ao controle e à pressão por produtividade. “A pandemia nos trouxe dados evidentes que o trabalhador produz mais estando em home office, e ainda possui vantagens significativas para a saúde mental e para a melhoria no trânsito nas cidades. Porém, muitas empresas estão determinando o retorno do trabalho 100% presencial sob o argumento de que precisam saber o que os trabalhadores estão fazendo, esse tipo de controle é desnecessário e potencializa as possibilidades de problemas como o assédio”, afirma a especialista.

Riscos Psicossociais

A partir de maio de 2025, o Ministério do Trabalho e Emprego determinou que as empresas brasileiras terão que incluir a avaliação de riscos psicossociais, como estresse, assédio e carga mental excessiva, na gestão de segurança e saúde no trabalho. Marina explica que, ao identificar esses riscos, é necessário elaborar e propor planos de ação que vão incluir medidas preventivas e corretivas que envolvem a reorganização do trabalho. “Entre essas medidas, podem estar a diminuição da sobrecarga de trabalho, a participação no processo de tomada de decisões e as mudanças na forma como as relações interpessoais estão organizadas e estabelecidas nas organizações.”

A psicóloga acrescenta que os profissionais também podem adotar estratégias individuais para amenizar os impactos do trabalho na saúde mental. “O desenvolvimento de métodos de autocuidado, melhorar a qualidade de alimentação, do sono, praticar atividades físicas regulares, a utilização de estratégias de restauro como micropausas, desconexão do trabalho e técnicas de relaxamento, que incluem, meditação, mindfulness e técnicas de respiração, tem mostrado resultados positivos, mas devem ser adotados de forma combinada com mudanças na organização do trabalho, visando eliminar ou reduzir os riscos psicossociais existentes no trabalho”, afirma Marina.

**Por Jornal da USP 

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