Ser analista político é, talvez, um dos mais ingratos ofícios das Ciências Humanas. Não se trata de emitir opiniões a esmo sobre o poder público, mas sim tecer análises bem fundamentadas, complexas e, acima de tudo, norteadas pela hercúlea busca da objetividade, ou seja, pelo rigor científico, abdicando, muitas vezes, de suas crenças, valores pessoais e mesadas descaradamente propostas e pagas por políticos.
Obviamente, consiste em uma prática que, inevitavelmente, despertará discordâncias e, contemporaneamente, hostilidades, sabotagens e ameaças. Trata-se de um preço que poucos estão dispostos a pagar, o qual é contornado pela parcialidade ou pela adoção de análises genéricas, maleáveis, à moda do global Caio Ribeiro.
Optei pelo sono tranquilo e a liberdade de crítica. O colunista que lhes escreve não recebe mesada e não tem medo de cara feia -algumas feias de doer. Toda essa encheção de linguiça, amigo leitor, tem como propósito alicerçar a nauseante constatação de que a política municipal assemelha-se a um zoológico existencial. Acompanhá-la diariamente é como presenciar um experimento antropológico conduzido por neurosifilíticos e esquizofrênicos. Muitas vezes, humor, ironia e sarcasmo aliviam o amargo gosto do exercício. Este é um texto repleto desses elementos.
Dia 28 de novembro de 2019 foi eleita a mesa diretora da Câmara de Vereadores, a qual será responsável pelo ano de 2020. Lincoln Fernandes, atual presidente, foi reeleito por uma esmagadora maioria votante. O mesmo presidente posto de joelhos pelo alto escalão dos servidores municipais, transformando Câmara em uma ala da Gaviões da Fiel.
O mesmo sujeito que, em evento na OAB, alegou que a transparência dos gastos legislativos deve ser feita por cada gabinete. Fabiano Guimarães, adversário e vítima de uma violenta puxada de tapete, já mostrava resignação. A maior dificuldade da sessão, todavia, foi acompanhá-la até o fim. Envaidecidos e já em ritmo eleitoral, alguns legisladores não pouparam saliva, microfone e a plateia. Discorreram sobre os méritos que acreditam ter, sobre os deméritos de legislaturas anteriores e afirmaram convictamente, mais para o brilho dos holofotes que para os presentes, ser essa uma das melhores composições da história da cidade.
A tortura inquisitorial foi maior com o trainee de tucano Rodrigo Simões. Enquanto os ponteiros do relógio movimentavam-se vagarosamente, Simões – famoso por suas gafes e bizarrices (veja imagem abaixo) brindou o público com a bajuladora e inspirada narrativa da vida de Lincoln Fernandes (embora a sensação temporal fosse de eternidade, não de vida): o sofrido e humilde menino da Vila Virgínia em suas heróicas batalhas até a presidência da casa.
Com o descer das cortinas, Rodrigo Simões, de olhos marejados, pediu aos seus colegas a reeleição do atual presidente. Vale ressaltar que Rodrigo Simões, em outro de seus brilhantes lampejos, homenageou o condenado/cassado Otoniel Lima. Ausência também lamentada também pelo reeleito. Houve ali um forte sentimento de cumplicidade.
O presidente reeleito, por sua vez, discursou longamente e, mais leve e menos ofegante que no último pleito, conseguiu dar a volta olímpica no plenário. Aplaudido, claro. Bajulado. E, obviamente, de ego inflado.
São dois outros destaques dignos de nota: Luciano Mega (PDT), o qual sustentou a palavra dada ao colega Fabiano três anos antes e Boni (Rede), que expressou sua indignação com o andar da carruagem legislativa apontando Paulinho Pereira (Cidadania), seu vizinho de plenário, como indicado a presidente, além de finalizar a sessão com um áspero discurso de indignação e promessas de ainda mais rigor na fiscalização de seus colegas.
Finalmente, amigo e paciente leitor, a Câmara de Vereadores em 2020 não desperta, neste que vos escreve, muito otimismo. Há ali bons nomes, com excelentes intenções, embora carentes de boas orientações. Um sopro de esperança seria uma boa renovação nestas eleições municipais. Vários bons nomes têm se apresentado para o legislativo, alguns outros tantos, pavorosos.
No executivo, Duarte Nogueira é o mais que provável reeleito. Sua administração, responsável, nos três primeiros anos, por contornar a calamidade herdada, hoje consegue implementar melhorias no município, embora há latente necessidade de renovação de alguns quadros. Nesse contexto, há a palpável ausência de adversários relevantes. O Partido Novo da cidade, que poderia minar parte do tradicional eleitorado tucano, resolveu apequenar-se e, quem sabe, eleger um vereador, minando, em obscuros processos, filiados com potencial para o executivo. A onda laranja virou suco engarrafado.
E a esquerda? O PSOL limita-se à sua ciranda existencial, em uma retórica ressonante apenas nas rodinhas esfumaçadas do Leblon e seus similares Brasil afora. E o PT? Ah, o PT presenteou Ribeirão Preto com uma piada pronta: a candidatura do professor Atum -nome fictício, pois este prefere processar ao argumentar. Sua principal promessa de campanha? Ser enlatado! O PT reiventa-se não na política, mas no Stand-Up!
2020 promete. Cadê meu Rivotril?