Antônio Papa | Morre, aos 100 anos, o homem apaixonado pela vida

Primeiro membro de uma família de imigrantes italianos a nascer em Ribeirão Preto, seu Papa faleceu em decorrência de uma infecção pulmonar, neste domingo (1º)

0
Seu Antonio deixou dois filhos, seis netos e quatro bisnetos Foto: Arquivo Pessoal

“Eu quero pedir para Deus me dar mais um ano de vida. Se ele me der mais um ano, eu vou ser muito agradecido a ele”. Todo ano, esse era o pedido de aniversário do senhor Antônio Papa, que faleceu aos 100 anos de idade, neste domingo (1º), em Ribeirão Preto, após uma infecção urinária atingir os pulmões. Apaixonado pela vida, ele deixou dois filhos, seis netos e quatro bisnetos. 

Sêo Papa foi o único filho de uma família de imigrantes italianos a nascer no Brasil, em 1921. Ribeirão-pretano, ele se casou e viveu por mais de 60 anos anos ao lado da mesma mulher, de quem só se despediu após a morte os separar, conta o filho do casal Antônio José Papa, 75. 

“Os dois se conheceram no bairro Campos Elíseos, meus dois avós eram fazendeiros, mexiam com plantações. Moravam a uma distância de dez quarteirões, no máximo, um do outro. Eles ficaram mais de 60 anos casados, minha mãe morreu com 93 anos. O que os separou foi a morte”, disse. 

Com carinho, o filho lembra a união e o companheirismo exemplar dos pais. “O amor deles não foi por beleza ou admiração. Foi um amor abençoado. Um respeito. Uma dia, minha mãe falou ‘se algum dia você não foi feliz comigo, na parte feminina, eu te dou liberdade para você ver se isso é verdade ou mentira; se eu errei, você me aponta esse erro que eu quero corrigir’. Eu nunca vi uma mulher falar isso para um homem”. 

Carreira 

Sêo Papa trabalhou por mais de 30 anos na antiga choperia Pinguim. Antes disso, morou por um tempo em Santos e também em São Paulo, cidade onde conheceu Getúlio Vargas. “Como ele era garçom, o Getúlio foi lá e eles se cumprimentaram. Então, ele tinha orgulho de falar ‘olha, o Getúlio Vargas me deu a mão e a gente se cumprimentou’”, conta o filho.

Vargas não foi a única personalidade política que Papa conheceu. Além de trabalhar no Pinguim, também foi garçom na Cantina 605 e no restaurante do Bosque, onde conheceu o ex-ministro da fazenda Antonio Palocci. “Ele conheceu o Palocci menino, pegou ele no colo. Ele trabalhou para o avô do Palocci. Então, os meninos iam lá brincar no bosque onde abriu o restaurante” disse José Papa.

Família 

José Papa conta que, devido ao trabalho, o pai não pôde estar muito presente em sua vida, mas que deixou lições valiosas. “As poucas coisas que o meu pai falou foram de muita valia para mim. Hoje, eu estou vivo por causa dos ensinamentos dele. Me ensinou a ser honesto e que dinheiro é fruto de serviço, não vem de outro lugar. E que uma parte do dinheiro é para sustento e você segurar um pouquinho para equilíbrio é a melhor coisa que pode fazer para sua vida”. 

Pai, avô e bisavô, Papa será lembrado com carinho pelos familiares. “Um dia fomos jogar bola, outro dia fomos nadar e ele nem sempre tinha disponibilidade, estava cansado, tinha que descansar e trabalhar no outro dia. E os finais de semana eram os dias em que ele mais trabalhava. Mas foi um bom pai, ficou a família montada até o falecimento”, afirmou o filho.

Para os netos, a lembrança era ainda mais doce. “Cuidadoso e muito carinhoso, fez para todos mais do que podia. O que vou sentir  mais  falta é do cuidado que ele tinha com  todos, rezava o terço todos os dias, pedia proteção”, lembra a neta Gisele Papa, 49. 

Além do amor e do cuidado, os familiares se recordam do amor que Papa tinha por viver. “Todo ano a família se reunia, fazia um bolo ou um salgado e a gente perguntava o que ele queria de aniversário e ele sempre falava ‘Eu quero pedir para Deus me dar mais um ano de vida. Se ele me der mais um ano de vida eu vou ser muito agradecido a ele’”, conta a neta Soraia Soares Papa Pace, 53.

Despedida 

Antonio Papa ao lado do filho Antonio José Papa – Foto: Arquivo pessoal

Sêo Papa foi internado no Hospital São Francisco, após sofrer uma infecção urinária que evoluiu e atingiu os pulmões. Ele faleceu na madrugada deste domingo (1º). Para o filho, José Papa, é uma perda muito grande, mas diz que com o apoio dos céus, tem conseguido enfrentar a despedida.

“Dói, mas quando eu dei por fé, ele já havia sido enterrado e eu não vi nada. Eu vi a mão de Deus. Eu estou bem. Eu acredito que Deus, na hora em que você precisar, ele te conforta”. 

“É dura a perda, mas um dia todos vamos passar por isso. Ele viveu a vida, foi um bom exemplo. Limitado, como todos nós somos, seres humanos limitados. Vai doer, eu vou lembrar. Mas ele passou desta vida e eu também vou. Eu estou com 75 anos e sinto que nós vamos morrendo aos poucos e vai indo”, disse José Papa.

Para o filho, o mais importante é passar por essa vida e deixar uma marca de bondade no mundo, como o pai deixou. “Nós temos que saber deixar esse mundo. Não deixar dívidas. Hoje briga com a pessoa e eu não perdoei ela. Não deixe dívidas não. Não deixe de fazer um ato bom. Viva o melhor que puder dessa vida. Ela é maravilhosa, mas eu tenho que escolher ser feliz, escolher pregar o melhor e perdoar”, finaliza.