Caso Luana Barbosa completa cinco anos de impunidade

Mulher negra e lésbica, Luana morreu após sofrer ataques violentos durante abordagem policial em abril de 2016; caso segue em tramitação na justiça

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Caso foi para Júri Popular em Fevereiro de 2020, porém ainda não existe data para o julgamento Foto: Coletiva Luana Barbosa / Facebook

“Eles falaram: põe a mão para trás e já me deram um soco, já me deram um chute”, foi assim que Luana Barbosa dos Reis, 34, mulher negra e lésbica, relatou uma abordagem policial da qual foi vítima, em Ribeirão Preto. Cinco dias depois, ela morreu em decorrência dos ferimentos. O caso comoveu todo o Brasil e rendeu até mesmo um pronunciamento da Organização das Nações Unidas (ONU), porém, cinco anos se passaram e o julgamento segue parado na justiça. 

No dia 8 de abril de 2016, Luana Barbosa levou seu filho de 14 anos a um curso de informática. Ambos estavam em uma moto, quando ela decidiu parar o veículo para conversar com um amigo em um bar, que ficava a 300 metros de sua casa, no Jardim Paiva. Foi neste momento que três policiais militares a abordaram, mas a jovem negou a tentativa e exigiu uma policial feminina. 

Testemunhas que presenciaram a ocorrência relataram que Luana deu um soco em um dos policiais, passando a ser alvo de socos e pontapés na sequência, bem ali, na frente de seu filho. A mulher foi agredida mesmo já estando algemada, os policiais só cessaram os ataques dez minutos depois quando a levaram para o Plantão Policial para registrar o caso. 

Somente depois de ir à delegacia a vítima recebeu atendimento médico. Luana Barbosa faleceu cinco dias depois em decorrência de lesões causadas por um traumatismo craniano. Segundo a família, o Ministério Público, os advogados que dão assistência ao MP e um laudo do Instituto Médico Legal, a morte foi causada pelo espancamento.

Comoção 

Rapidamente a história de Luana ficou conhecida por todo o Brasil. Mulher negra e lésbica, seu caso se tornou um retrato do preconceito e da violência policial. Em São Paulo, surgiu a Coletiva Luana Barbosa, que se reuniu com a família da vítima para pressionar o poder público em busca de justiça. Em Ribeirão Preto, nasceu o movimento Nenhuma Luana a Menos, que promoveu manifestações nas ruas para pedir o fim do preconceito e da perseguição às mulheres negras e lésbicas, além da impunidade à violência policial. 

Negra e lésbica, Luana foi vítima de violência policial, segundo a denúncia do Ministério Público

O caso tomou tal proporção que a ONU também se pronunciou, pedindo por investigações imparciais. “São inaceitáveis quaisquer alegações para justificar as violências que vitimaram fatalmente Luana, as quais evidenciam a conivência e/ou a impunidade com agressores quer sejam agentes públicos ou indivíduos particulares. A responsabilização é condição primeira para a justiça e para a reparação às vítimas das violências de gênero, para a proteção de familiares em busca de direitos e para a construção de uma sociedade plural e equitativa”, disse o documento. 

Na justiça 

Inicialmente o caso Luana Barbosa foi investigado pela Justiça Militar e arquivado no início de 2017. Graças à pressão popular e às proporções tomadas, em maio de 2018 o Ministério Público denunciou a abordagem realizada pelos policiais André Donizete Camilo, Douglas Luiz de Paula e Fábio Donizete Pultz ao Tribunal de Justiça. 

Nos depoimentos, os réus alegaram que Luana desferiu um soco em um dos policiais, sendo necessário o uso da força para contê-la. Disseram ainda que ela foi algemada pelos pés e mãos, pois se debatia contra os vidros da viatura, correndo o risco de se machucar. Os policiais também afirmaram que a vítima não estava ferida quando chegou ao Plantão Policial. Devido às diferentes narrativas sobre o caso, ocorreram sete audiências entre julho de 2018 e agosto de 2019.  

Em fevereiro de 2020, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu que os três policiais acusados deveriam ir a júri popular. De acordo com a sentença da juíza Marta Rodrigues Maffeis, que responde pela 1ª Vara do Júri, “o móvel do crime teria sido torpe, tal seja, vingança, por ter a vítima desferido soco e pontapé nos policiais durante a abordagem”, diz a sentença, “igualmente, o meio cruel restaria caracterizado, pois os acusados teriam espancado a vítima, causando-lhe intenso, prolongado e desnecessário sofrimento físico e mental”. 

“Finalmente, existem indicações de que a vítima teria sido subjugada por três homens armados, estando estes, portanto, em superioridade numérica e de armas, recurso este que impossibilitou sua defesa”, informou a juíza. Os três policiais respondem por homicídio qualificado, motivo torpe, emprego de meio cruel e recurso que impossibilitou a defesa da vítima. 

Após a sentença, a defesa dos acusados entrou com recurso pedindo a anulação do julgamento. A Justiça ainda não se pronunciou sobre o recurso e os policiais aguardam em liberdade.