Datena lista condições para candidatura e compara: ‘Se Biden pode desistir, por que eu não posso?’

Datena nasceu em Ribeirão Preto e não descartou fazer como o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que no final de semana desistiu de concorrer à reeleição; o apresentador já desistiu em quatro ocasiões

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O pré-candidato José Luiz Datena (PSDB) disse à Folha que precisa de respaldo do partido para confirmar sua candidatura à Prefeitura de São Paulo, prevista para ser oficializada em convenção neste sábado (27), e não descartou fazer como o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que no final de semana desistiu de concorrer à reeleição.

“Se o Biden pode desistir a qualquer momento, por que eu não posso? Desde o começo, falei: se me sacanearam, eu desisto mesmo”, disse o apresentador.

A entrevista com Datena encerra a série com pré-candidatos iniciada pela Folha em setembro do ano passado. O apresentador foi o último dos principais concorrentes a ter a pré-candidatura anunciada por seu partido, em junho, e agendou a entrevista para esta segunda-feira (22).

Antes dele, foram ouvidos Guilherme Boulos (PSOL), Ricardo Nunes (MDB), Tabata Amaral (PSB), Kim Kataguiri (União Brasil), Marina Helena (Novo) e Pablo Marçal (PRTB).

Datena tem 67 anos e nasceu em Ribeirão Preto. Apresentador conhecido por programas policiais como o Brasil Urgente (Band), também foi jornalista esportivo e radialista. Foi filiado ao PT de 1992 a 2015 e passou por outros partidos até chegar ao PSDB, 11ª sigla de seu currículo, à qual se filiou em abril. Já ensaiou ser candidato a diferentes cargos e desistiu em quatro eleições.

Entrevista

PERGUNTA – Como foi ir ao Mercadão na semana passada? É a primeira vez que o sr. sai às ruas em uma campanha.

JOSÉ LUIZ DATENA – Foi muito gostoso, foi legal. Sou um [pré-]candidato, mas sou apresentador, então sou um cara conhecido. Eu avisei o pessoal: vai dar complicação. E foi uma complicação terrível, tinha gente pra caramba, eu não conseguia sair de lá.

Tem que ter essa preocupação. Não quero, sem falsa modéstia, criar problema, aglomeração, empurra-empurra. Quero evitar um pouco. Não evitar o povo, mas evitar problema para o povo.

P – Muita gente desconfia que o sr. não vai seguir com a candidatura.

JLD – Até eu desconfio. Se continuar essa sacanagem de que o partido está conversando com outras pessoas para colocar dentro do partido sem me avisar, eu não vou ser candidato. Se o Biden pode desistir a qualquer momento, por que eu não posso? Desde o começo, falei: se me sacanearam, eu desisto mesmo.

P – O sr. falou que as pessoas que estavam “sacaneando” tinham sido tiradas.

JLD – Nem tanto. Quem foi atrás de cargo, emenda, dinheiro, esses já foram, mas deixaram alguns ali dentro para atrapalhar minha candidatura, inclusive a convenção. Tenho confiança na executiva nacional, no Marconi [Perillo], no Aécio [Neves], apesar de termos tido discussões lá atrás, e no José Aníbal. Mas os principais tiros que levei foram de dentro do partido.

P – Quais tiros?

JLD – Por exemplo, foi um cara falar sobre trânsito na rádio CBN me representando e disse “o Datena está errado” [em se opor a mais radares]. Por que eu sou contra radar? Isso não é [feito] com o objetivo de educar o povo e reduzir acidentes. Se o partido quiser que eu seja candidato, ele que demonstre. Você viu a convenção do Lula?

P – Do Boulos, não?

JLD – Era a convenção do Lula, depois da Marta [Suplicy], depois do Boulos. A do Ricardo Nunes vai ser do [Jair] Bolsonaro, depois do Tarcísio [de Freitas], depois dele. O Ricardo Nunes parece uma marionete do Bolsonaro e do Tarcísio. O Boulos, a mesma coisa. Não é possível essa polarização continuar. Eu gostaria de ter uma convenção igual à deles. Vai ser tudo por aclamação. Não foi lá? O maior festão.

P – Gostaria de ser aclamado também?

Eu tenho que ser aclamado pelo voto do povo. Está tudo certo morrer com um tiro no peito vindo do PCC ou de JLD – quem quer que seja, porque não vou usar colete à prova de balas. Mas morrer com um tiro nas costas dentro do partido? Não precisa me aclamar, mas também não precisa atirar pelas costas.

P – O que seria esse tiro?

JLD – É só ver. Boa parte do partido debandou para o Ricardo Nunes. Dinheiro e cargo. Há alguns dias trocaram a federação [PSDB-Cidadania] inteira de São Paulo. Eu fiquei sabendo depois. Mesmo assim, continuaram essas críticas idiotas, que só podem vir do intestino do partido.

P – Qual é a sua vontade de ser confirmado na convenção, de 0 a 10?

JLD – Minha vontade é 10. Se sábado eu sentir que os caras vão me encher o saco na convenção, eu não vou. Acabou.

Essas convenções [dos partidos] vão ser por aclamação e com gente pesada. Se a nossa for porrada para todo lado, no que vai me ajudar?

P – O sr. poderia desistir depois da convenção?

JLD – Acho que a convenção vai homologar meu nome. Já é um princípio básico, inequívoco, de que, realmente, quem está comigo está comigo. E quem não está vai se ferrar porque não vai estar comigo. Deixando transparecer essas trocas repentinas, você demonstra uma fraqueza dentro da sua própria estratégia.

P – Em quem confia no PSDB para ser seu vice?

JLD – Tem bons nomes, tem o José Aníbal, o Zuzinha [Mario Covas Neto], mas eu estou deixando a escolha do vice para o partido, desde que eu concorde.

P – O que o sr., enquanto tucano, está fazendo para o partido renascer?

JLD – Eu não sou Deus para fazer o PSDB renascer. Mas não é na base da vaidade que destruiu o partido que esse partido vai voltar a ser o que era.

A virtude do homem é fazer o que o Biden fez, quando desistiu de ser candidato: é saber que numa eleição o povo é sempre o mais importante.

P – O sr. vai fazer a mesma coisa que Biden?

JLD – Se o cara que é o presidente da maior nação econômico-militar do mundo acha que o povo é mais importante do que ele, por que eu não posso achar? Se eu não me sentir capacitado a ajudar o povo?

A partir do momento que eu não me sinta respaldado totalmente pelo partido, que haja palhaçada nessa convenção, que tenha manifestações…

Num partido dividido do jeito que está o PSDB hoje, e não me sustentando como candidato, não me sinto capaz de resolver nem os problemas do PSDB, quanto mais do eleitorado.

P – O que o sr. espera?

JLD – Espero que até sábado o PSDB resolva os seus problemas, que a gente parta para uma convenção de consenso e que as pessoas que estão no PSDB tenham certeza de que o vírus que destruiu o partido foi o da individualidade e o da vaidade.

P – Quando o sr. se filiou ao PSDB [em abril], o partido já estava dividido e boa parte já apoiava o prefeito.

JLD – Sim. Você já foi para o Alasca? Lá tem lago gelado, aí você vê se o gelo tem suficiente espessura para atravessá-lo. Eu sabia que o gelo do lago congelado do PSDB era fino, mas não tanto. Isso descobri depois de estar lá dentro.

P – O sr. foca muito em segurança…

JLD – A meta é segurança, mas eu não quero ser eleito prefeito como xerife da cidade. Não é porque eu apresento há 26 anos um programa de polícia que sou xerife.

P – Como vai tirar o crime da administração pública?

JLD – Minha meta principal é realmente a segurança pública. Tem que investir também em todo tipo de segurança, segurança alimentar, dar mais saúde, mais educação.

A GCM [Guarda Civil Metropolitana] vai ser supervalorizada, equipada com armas da melhor qualidade. Mas não tem jeito de falar em segurança sem contar com a ajuda do governo do estado e da Justiça. Não pode um traficante pé de chinelo ser pego num dia e no outro dia estar traficando de novo porque foi solto em audiência de custódia.

P – É algo que não está na alçada do prefeito, concorda?

JLD – É por isso que digo que não dá para governar São Paulo sozinho. Tenho um bom tráfego com gente da polícia, o governador, o [promotor Lincoln] Gakiya, que é um cara que combate o tráfico, delegados.

P – Não é errado ter como principal bandeira algo que não depende só do sr.?

JLD – Não, porque é uma bandeira. É a principal, mas eu defendo todas as outras. O partido está conversando com pessoas notáveis para montar um plano de governo. Eu não tenho capacidade nenhuma de fazer um plano de governo voltado à educação, à saúde… Eu não sou super-homem e não tenho poderes para resolver todos os problemas da cidade, mas tem gente que tem.

P – Que outras propostas o sr. apresentará?

JLD – Por exemplo, tenho uma sugestão para fiscais da prefeitura usarem câmera de corpo. Muitos deles são vigaristas, picaretas.

P – A GCM também tem que usar câmeras?

JLD – Acho que todo mundo tem que usar, demonstra transparência.

P – Foi um erro o sr. dizer na sabatina Folha/UOL que vai acabar com a tarifa zero aos domingos?

PLD – Não, foi mal-entendido, eu falei que a tarifa zero é uma mentira desgraçada desse prefeito. Eu posso até dar tarifa zero, mas desde que os caras [empresários do setor] cobrem um preço justo durante a semana. É melhor o cara pagar justamente todo dia do que um cara, numa medida totalmente eleitoreira, [criar a gratuidade aos domingos].

Não é que eu sou contra a tarifa zero. Em governo meu, ninguém vai sentar a bunda em ônibus do PCC, porque não vai ter PCC, a não ser que o PCC me mate.

P – Interessava a Tabata que o sr. fosse para o PSDB, mas para ser vice dela. A decisão de ser candidato foi sua.

JLD – Se ela correu esse risco, me trocar por um minuto [de propaganda na TV e no rádio], ela correria o risco de o PSDB fazer uma pesquisa própria e ver que eu tinha potencial.

P – Foi o sr. que escolheu isso, não?

JLD – Claro que fui eu que escolhi. Ela disse que eu sou suficientemente grandinho para tomar decisões. Ou ela me chamou de gordo, e eu tenho horror a preconceito, porque sou gordinho com muito prazer, ou ela me chamou de velho, e eu tenho honra em ser idoso. Eu disse a ela várias vezes que não queria ir. Ela facilitou minha decisão. Me trocaram por 40 segundos, e eu não sou relógio. Não é arriscado você pegar um ativo importante da sua campanha e botar em outro lugar?

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JOELMIR TAVARES E CAROLINA LINHARES / Folhapress