Ela é apenas uma vagabunda

chiaroscuro: percebemos que o corpo, o rosto e o vestido estão no visível, e a tela, a paleta de pintura e a personalidade da mulher ficam na sombra. Nesta self do século XVII, é assim que se retrata Artemisia Gentileschi, uma das principais expressões do Barroco italiano, filha artística de Caravaggio.

Com 19 anos, Artemisia foi estuprada por seu professor de desenho, Agostino Tassi, artista de prestígio em Roma. Tassi ignorou o talento e pôs o olho no corpo da mulher. Foi acusado e condenado ao exílio, mas não precisou cumprir a pena por alegar que, na ocasião, a menina já não era virgem.

Um dos quadros mais famosos de Artemisia foi Susana e os anciãos,  que retrata a passagem bíblica em que uma jovem é condenada à morte por cometer adultério. Os acusadores, dois velhos e respeitados juízes, haviam tentado seduzir a moça, motivados pela nudez em que a viram entrar no banho. Recusados, e precavidos, apelaram para a moralidade inventando o adultério.

O caso de Susana teve final feliz. Daniel conseguiu provar a calúnia, separando os acusadores e ouvindo assim versões diferentes. Artemisia não teve a mesma sorte. Agostino Tassi continuou livre e muito  prestigiado pelos homens de bem, recebendo deles generosas encomendas de pintura.

Esses dois episódios estão separados por milênios. Mas as condutas que funcionam bem para fazer o mal se repetem, se repetem e se repetem. Até hoje. E justamente porque funcionam. A acusação moral é a mais inteligente forma de se conseguir apoio popular e inverter um jogo que nos seja desfavorável.

É triste, mas ainda temos muito o que evoluir.

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