Iluminado por uma colocação de Dom Angélico Sândalo Bernardino, gosto de comparar nossa existência a três partos. O primeiro parto é quando nascemos do útero materno. Nenhuma criança quer nascer. Mas ao nono mês não tem jeito, ela precisa nascer. Partir do útero da mãe, onde se sente segura, aconchegada e amada, especialmente quando planejada e desejada.
Eu nunca acreditei em cegonha. Mas acreditei em frasqueira de parteira. No bairro Liberdade, na cidade de Novo Hamburgo (RS), onde cresci, havia uma parteira, a Dona Avelina. Ela levava consigo uma frasqueira. E de onde saída com sua frasqueira, nascia uma criança. Minha dedução: Dona Avelina levava as crianças às mães em sua frasqueira.
Quando nasceu minha prima, lembro-me como se fosse ontem, a Dona Avelina deixou sua frasqueira sobre uma coluna na entrada da casa de minha avó e a chamou para o nascimento da criança. Até me aproximei, coloquei meu ouvido sobre a frasqueira para tentar ouvir algum balbuciar do bebê. Ainda não havia ultrassom e não se sabia o sexo da criança que estava por nascer. Num quarto escuro, junto à parturiente, somente as avós com a parteira participavam do parto.
Os demais esperavam na sala da casa. A criança nem chorava. Mas a parteira lhe dava um tapinha na bunda, para constatar que nascera viva. Quando então a criança começava a chorar, todos na sala comemoravam a nova vida que acabara de nascer. E eu tinha convicção de que minha prima fora levada na frasqueira da parteira. Já hoje as crianças nascem chorando de susto da forte iluminação e dos obstetras e enfermeiras com máscaras nas sofisticadas maternidades.
Nosso segundo parto é quando nascemos do útero da Igreja, a Pia ou Bacia Batismal. Neste primeiro Sacramento da Iniciação Cristã, somos adotados como filhos de Deus, irmãos de Jesus Cristo e nos tornamos seres divinizados, isto é, candidatos à santidade. Sim, porque santo é todo aquele que morrendo vê Deus como Ele é.
O terceiro e definitivo parto será quando nosso nome ecoar na eternidade e partirmos do útero da terra (vida terrena) à eternidade. É um parto dolorido aos que ficam e entregam a quem de direito, pessoas que amam, o próprio Criador. Este parto chamado de morte dói demais, mas é imprescindível para irmos diante de Deus que nos amou primeiro e nos quer em seu colo, acariciados por Nossa Senhora.
Só o tempo ameniza a dor dos que devolvem a Deus seus entes queridos, que na gestação do útero da terra se lhes foram emprestados por algum tempo: para alguns mais e para outros menos! O importante é estarmos preparados para que o terceiro e definitivo parto seja o mais natural possível. E o que nos prepara para aquele derradeiro momento é amor que amamos!