John Harp, o milagre de João da Gaita (ribeirão-pretano lança álbum gravado com mestres do blues da Califórnia)

Nas décadas de 1930 e 1940, blueseiros abandonavam o campo para rodar as cidades americanas levando o blues como forma de vida. Uma das lendas desse período é a história de que um homem, Alan Lomax , cruzava o sul dos EUA no começo do século 20 gravando músicas regionais para a Biblioteca do Congresso Americano. Em busca de Robert Johnson, Lomax encontrou um homem que o informou que Johnson já havia falecido, mas que também poderia gravar. O nome dele era McKinley Morganfield, mas todos os chamavam de Muddy Waters. Conectados, esses nomes mudaram a história da música popular espalhando o blues e os primeiros rudimentos do que viria a ser o rock’n roll. Muitas décadas depois, os efeitos dessa época e da jornada destes e de muitos outros artistas ainda são sentidos. Ainda há quem siga a trilha miraculosa do blues deixando as raízes para encontrar seu som nas cidades americanas. Um destes é João da Gaita, que assim como boa parte de seus predecessores não atende mais pelo nome que tinha. Depois do milagre, traduzido em “Miracle”, o single do álbum de oito faixas, ele agora é John Harp, um blueseiro brasileiro que gravou com grandes nomes do blues na Califórnia. “Junto com a minha produtora e pessoas próximas decidimos que seria melhor usar esse nome, mesmo aqui no Brasil”, ele explica, num papo comigo para esta coluna.

Single

Antes de sua jornada gringa, cheguei a trabalhar na produção de alguns shows dele e posso dizer que João da Gaita é daqueles que se entrega no palco. Não há surpresa se ele fizer pole dance com o pedestal do microfone ou provocar a plateia durante o show dizendo que sua filha pequena canta mais alto. Assim como no palco, João da Gaita se entregou ao blues na vida. Começou a tocar aos 13 depois de ganhar uma gaita de um amigo e tocou até ser pai, em 2005. Voltou em 2012 e fez quase 300 shows no ano para recuperar o tempo parado. De 2012 a 2014 fez aproximadamente 800 shows e teve referências aqui no Brasil de blueseiros que foram para os EUA como nos casos de Igor Prado e Ivan Márcio. “Eu olhava aquilo e pensava: por que não?”, contou ele. Então ele foi para Orange County, na Califórnia. “A cena do blues lá é bem forte, os músicos são valorizados e vários músicos de blues acabaram migrando para lá. Minhas influências estavam lá e eu queria estar perto desses caras”, ele explica.

Foto: Divulgação

Foi assim que João conseguiu gravar com grandes músicos e lançar seu álbum de estreia com uma ficha técnica de alto nível. Acompanhado por Kid Andersen, Robby Yamilov e Alexander Pettersen, nosso conterrâneo passa por 8 músicas num álbum equilibrado, que não soa como o álbum de um gaitista. Mais do que isso, é um álbum de blues. Tem solos de guitarra, piano e uma cozinha que soa clássica apesar de moderna. Algumas levadas poderiam ter sido gravadas pela banda de Muddy Waters nos tempos áureos de Chess Records, mas quem canta e leva suas frases de gaita é John Harp nas letras que escreveu, em inglês, num período logo após ter suas raízes ainda mais longe com o falecimento de sua mãe, aqui no Brasil. “Passei 11 meses morando numa floresta, longe da cidade, compondo, depois da morte da minha mãe. Depois fui gravar. Eu já tinha algumas ideias para os arranjos, mas lá no Greaseland Studios, do Kid Andersen, em San Jose na Califórnia, o próprio Kid quis mudar algumas coisas e trabalhamos juntos. Gravei com os melhores músicos do mundo na atualidade, com um dos maiores produtores de blues”, ele narra.

John Harp está agora sediado na Bahia e deve começar os shows de divulgação do álbum em junho. Sobre o milagre do single, do blues e da sua transformação que culminou no lançamento, ele explica: “O milagre que eu falo é o que existe dentro de todo mundo. Tem uma música do Renan Inquérito que diz que sonho de preguiçoso dorme no travesseiro. Esse sonho é o milagre e todo mundo tem um milagre dentro de si. Uma busca, algo que almeja. Eu falo desse sonho e que nada é impossível desde que você não deixe seus sonhos morrerem”. Sobre a capa e a visível ausência de um dente, John explica que a mudança não foi proposital. “Fui ligar um gerador, a corda arrebentou e eu bati a boca e quebrei o dente. Daí já coloquei um de ouro, né.”

O álbum está disponível nas principais plataformas de streaming.

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