Quem mora ou já viveu em um condomínio sabe: ao menos uma vez por ano será convocada reunião da assembleia de condôminos para discutir e aprovar (ou não) orçamento de despesas, contribuições, prestação de contas e outros assuntos. É lei, está no Código Civil!
Mas, e em tempos de isolamento social por conta do novo coronavírus, qual a saída?
“As reuniões e assembleias que antes eram feitas antes com a presença de todo mundo, em dia e horário preestabelecidos, têm sido agora realizadas em alguns condomínios de forma digital, por aplicativos, programas de videoconferência ou mesmo WhatsApp. Cada um escolhe a sua maneira”, explica Wendell Jones Fioravante Salomão, escrevente do 4º Tabelião de Notas de Ribeirão Preto.
“Principalmente em tempos de pandemia, a realização de assembleias virtuais em condomínios se torna uma importante aliada na luta contra o COVID-19 e atende às orientações da Organização Mundial de Saúde. Hoje existem algumas administradoras de condomínios que possuem ferramentas online que possibilitam a realização de assembleias virtuais, atendendo a todas as recomendações para a sua validade”, diz o advogado Gil Wender Moreira.
Um deles é o Grupo Inah, responsável pela gestão de mais de 230 condomínios, que utilizou a experiência em administração e criou seu próprio aplicativo. Nele os moradores podem acessar a pauta e acompanhar cada tópico, com seus respectivos documentos, como balanços financeiros e demonstrativos, antes de realizar a votação. “Cada pessoa recebe um código de usuário e senha, que ficam registrados. Devidamente logados no sistema podem analisar os assuntos e votarem se concordam ou não”, conta Weber Braga, diretor do Grupo Inah.
Devidamente certificados os usuários e a votação, as informações são levadas a um tabelião de notas para registro e publicidade do ato, garantindo sua eficácia. “É feita uma ata notarial com tudo o que houve na reunião virtual. Como os tabeliães têm fé pública há a garantia de que nada vai ser alterado e houve a expressão da verdade naquele momento, registrando a vontade dos moradores”, esclarece Salomão.
Essa ata notarial, continua o escrevente, pode ser utilizada nos atos civis quando convencionado entre as partes que haverá aceitação por todos ali presentes da execução dela imediatamente, por exemplo, num condomínio: “Dependendo do condomínio, as regras que ali foram decididas já podem ser aplicadas no próximo mês ou até mesmo a partir do dia seguinte. Com a definição na reunião, ata notarial, registro e fé publica do tabelião já é possível a execução; diferente de como era antes, quando deveria ser registrada antes em um Cartório de Registro de Título e Documentos e só depois ia a execução”.
Desde a adoção do isolamento social, no final de março, o Grupo Inah realizou três assembleia virtuais e tem outras duas já convocadas e agendadas até o final de abril. “Todas ocorreram muito bem, com sucesso. Tivemos alta adesão e poucas pessoas que não conseguiram fazer log no aplicativo. Para elas enviamos o link para que pudessem fazer a votação por email e conseguimos cumprir”, diz Weber.
Respaldo jurídico
No Brasil, não existe legislação específica que autorize a realização de assembleia virtual. Mas tal cenário deve ser alterado nos próximos meses. “Está em tramitação o Projeto de Lei nº 548/2019, que altera o Código Civil para permitir a realização de assembleia de condomínio por meio eletrônico ou outra forma de coleta individualizada do voto dos condôminos ausentes à reunião presencial, quando a lei exigir quorum especial para a deliberação da matéria”, informa o advogado Samuel Pópoli.
Outro projeto em tramitação na Câmara dos Deputados é o PL 1.179/2020, que visa atenuar as consequências advindas da COVID-19 e dispõe sobre regras aplicáveis aos Condomínios Edilícios. “Em seu artigo 16, o texto prevê que a assembleia condominial e sua respectiva votação poderão ocorrer por meios virtuais, caso em que a manifestação de vontade de cada condômino por esse meio será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial”, explica o advogado Alexandre Borges Leite, pós-graduando em Direito Comercial com tese sobre a realização de assembleias gerais virtuais de credores em Recuperações Judiciais, para quem o sistema também poderá ser adotado para viabilizar assembleias e reuniões em sociedades comerciais.
Embora a liberação tenha acontecido em caráter emergencial, até o dia 30/10/2020, a expectativa é que o ambiente virtual seja uma realidade mesmo após o fim da pandemia. “A gente espera que seja duradouro”, torce Weber.
“Tenho convicção de que deve se transformar em tendência, pois esse formato vai totalmente de encontro com o mundo globalizado de hoje”, afirma o diretor do Grupo Inah, ressaltando que o formato além de colocar fim às tradicionais e intermináveis discussões nas assembleias, permite aos moradores acompanhar e votar de onde estiverem.
“A realização da assembleia virtual, além de assegurar o cumprimento das medidas de distanciamento social vigentes no país representa um avanço e dinamismo na tomada de decisões, que deve se tornar permanente, mesmo após o controle da pandemia”, completa Pópoli.